CINEMA

Anna Muylaert e Lô Politi revelam machismo no documentário 'Alvorada'

Traços de machismo na política nacional e acúmulo de golpes decifram a turbulenta queda da ex-presidente Dilma

Ricardo Daehn
postado em 28/05/2021 06:00 / atualizado em 28/05/2021 08:25
 (crédito: Vitrine Filmes/Divulgação)
(crédito: Vitrine Filmes/Divulgação)

Dirigido pelas cineastas Anna Muylaert e Lô Politi, o documentário Alvorada, em cartaz nos cinemas, derivou da vontade de apresentar o Palácio da Alvorada como um espaço de poder e de revelar parte de um momento turbulento para a então presidente Dilma Rousseff, às vésperas do impeachment.

“Estávamos atrás de uma personagem que não pretendia ser personagem. A Dilma do filme acrescentou uma camada de coragem à que conhecia antes da produção. No filme, mostramos o ocaso de uma era. O documentário se chama Alvorada, e tem a ironia de trazer o registro do crepúsculo. Não vejo o filme como favorável a partido. Optamos, sim, por colocar a câmera no Palácio da Alvorada e não no do Jaburu (residência do então ex-presidente Michel Temer)”, observa Anna Mauylaert, ao tratar do longa-metragem exibido no festival É Tudo Verdade de 2021.

A equipe do filme montou acampamento por 75 dias, cercando o delicado momento de 2016. Pretenderam filmar o palácio como organismo. Para além de penetrar uma simbólica intromissão, avançar numa diáfana cortina branca (a única forma de se preservar dentro do palácio), buscaram transitar na austera locação, sem muita reserva; mas, óbvio, que por momentos, se viram vetados de participar de reuniões mais inflamadas.

Ambas as diretoras não escondem a angústia inicial de que nada acontecesse, dado que a arquitetura privilegia o vazio. “Quando você vai para o subsolo, você vê um formigueiro de gente atuante. E no andar de cima, é a residência mesmo, o apartamento do presidente. Sabíamos que, de certa maneira, encontraríamos a poesia do espaço vazio”, conta Lô.

Atenta ao isolamento de Dilma, no momento das filmagens de Alvorada, Anna Muylaert reforça o fato de se tratar de uma mulher. “Quem vai com ela, quando ela lê a carta para o Brasil (esclarecendo a derrocada), são quatro homens de gravata. Entre ascensões políticas, ela é a única mulher. Entendo que o golpe teve fortes fatores machistas e misóginos. Embora estivesse saindo, paradoxalmente, acho que Dilma cresceu como pessoa. E ela recebeu muito apoio feminino. As mulheres se identificaram muito com ela” destaca.

» Duas perguntas // Lô Politi, cineasta

Qual a surpresa da Dilma do filme?
Dirigi Dilma para coisas que ela precisava fazer para a tevê. Daí, se estabeleceu uma relação não muito próxima, mas de confiança. Como tínhamos um acesso a ela, com a questão do afastamento, consultamos se ela deixaria documentar aquele momento. Algo que estava sendo extremamente documentado de todos os outros lados. Havia incógnitas de quem era essa mulher e o que estava passando naquele momento.

Ela começou muito tranquila. Ela não tinha nenhum controle sobre a gente. Com o tempo, ela foi se incomodando de ter uma câmera dentro da residência. A gente foi entrando em outros espaços do palácio, sem que ela soubesse onde estávamos. Ela nunca mandava a gente embora.

Quais os projetos mais imediatos?
Estou com um filme praticamente pronto, rodado antes da pandemia, se chama Sol. Tô morrendo de dó, se tiver que lançar direto no streaming. É um filme com apuro técnico, artístico que serve muito para o cinema. É uma história de pai e filho. Vou fazer, ainda, o filme da Gal Costa dos anos de 1970.

O projeto é uma codireção com a Dandara Ferreira e a Sophie Charlotte será a Gal. A gente tá esperando a vacina: não dá pra filmar os anos 70 com toda aquela aglomeração, agora. Vamos ter a Gal do Fatal (1975), aquela Gal que a gente gosta!

 

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