
Após tentar se suicidar em um lago, uma maestrina é trazida ao palco pelo segurança do teatro e incumbida de recriar, sozinha, um concerto cujos instrumentos são bacias com água, microfonadas. A ideia é que consiga misturar uma proposta sonora com um pouco de música clássica. Mas é a morte da mãe que está por trás de todo o drama da personagem de Verdar, peça dirigida pela chilena Paula Aros Gho e encenada pela atriz Mariana Loyola no Cena Contemporânea, hoje e amanhã. "Conceitualmente, a narrativa traz a temática da relação entre mãe e filha, filha e mãe", avisa Paula.
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São muitas as camadas narrativas de Verdar. Escrita pelo dramaturgo Nicolás Lange em 2022 para o festival Escena Austral, a peça foi pensada para ser apresentada em Frutillar, cidade no extremo sul do Chile, em um teatro à beira do lago Llanquihue, que tem, ao fundo, o vulcão Osorno. Eram, ainda, tempos de pandemia, e o isolamento estava entre as inquietações que rondavam Paula e Nicolás. "Estávamos em uma situação entre confinamento e algumas saídas. Então, voltar a fazer teatro ao vivo e falar a partir do sul era muito significativo, sobre o que significa viver em lugares mais afastados. O dramaturgo é de Puerto Montt, que fica muito perto de Frutillar, a capital dessa zona, e eu, justamente naquele momento, também estava morando no sul", conta Paula.
Enquanto tenta reconstituir o concerto diante do público, a protagonista de Verdar vai contando uma história. O texto poético dá o tom da narrativa, que fala sobre a morte, a relação entre mãe e filha e, também, o suicídio, um tema delicado que não é o centro da dramaturgia, mas está lá. "Eu acredito que o teatro é sempre um espaço para imaginar", diz Paula. "É sempre um espaço para o encontro com a beleza, com a poesia, com a contemplação, com a palavra, com a dramaturgia. Para mim, qualquer tema, mesmo um tão difícil como o suicídio, deve sempre ser trabalhado a partir dessa sensibilidade e dessa beleza."
Inspiração feminina
Também como parte da programação do Cena Contemporânea, a peça Pai Nosso tem sessões hoje e amanhã no Espaço Cultural Renato Russo. No palco, Luzia é uma vendedora ambulante de produtos de limpeza expulsa de seu ponto de trabalho na Rodoviária do Plano Piloto após abordagem truculenta da polícia. A personagem é vivida pela atriz Geise Prazeres nessa peça, assinada pelo Coletivo ARAR — Afeto. Resistência e Arte. "O espetáculo nasceu de uma indignação mesmo após uma ação truculenta da polícia em meados de 2023, na Rodoviária do Plano Piloto", conta Geise. Cenas do episódio viralizaram nas redes e o coletivo retirou os áudios do vídeo para utilizar no espetáculo, que tem dramaturgia de Vinicius Ávlis. "O Vini escreve sobre as mulheres da família dele, que são fazedoras de sabão. As tias, a avó, as mulheres ao redor dele. Mas são as mulheres da minha família também", avisa Geise.
A peça é sobre uma mulher que acaba de perder a mãe, mas já perdeu pai, avô e avó. Ela vive com a filha e anda pelo DF vendendo produtos de limpeza que ela mesma produz. "Sempre com uma leveza, uma resiliência na adversidade e que, para mim, atriz, é irritante, porque parece que está ignorando o contexto de vida, mas não: é porque é isso que ela tem para hoje", explica a atriz, que também se inspirou nas mulheres da própria família e na observação do cotidiano em São Sebastião, onde mora, para criar Luzia. "Somos os dois, Vini e eu, jovens moradores de satélites. Moramos em São Sebastião, em um bairro muito abandonado pelo estado. Então a gente estreia desse lugar de fala do jovem periférico, o que ele vê, o que ele reclama, tudo isso está na dramaturgia. São nossas vivências."
Pai nosso
Com Geise Prazeres e Coletivo ARAR - Afeto, Resistência e Arte. Hoje e amanhã, às 19h, na Sala Multiuso (Espaço Cultural Renato Russo 508 Sul)
Verdar
Direção: Paula Aros Gho. Com Mariana Loyola. Hoje e amanhã, às 20h, na Caixa Cultural
Diversão e Arte
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