Obituário

DF se despede de Guilherme Reis, criador do Cena Contemporânea e ícone do teatro

Ator, produtor, diretor e gestor cultural, Guilherme Reis morreu ontem, aos 70 anos, em decorrência de uma pneumonia. Ex-secretário de Cultura, ele foi também um dos faróis da cena do teatro em Brasília

19/01/2016. Crédito: Helio Montferre/Esp. CB/D.A Press. Brasil. Brasília - DF. Entrevista com o Secretário de Cultura do Distrito Federal, Guilherme Reis. -  (crédito: Helio Montferre/Esp. CB/D.A Press)
19/01/2016. Crédito: Helio Montferre/Esp. CB/D.A Press. Brasil. Brasília - DF. Entrevista com o Secretário de Cultura do Distrito Federal, Guilherme Reis. - (crédito: Helio Montferre/Esp. CB/D.A Press)

Um dos nomes mais importantes do teatro contemporâneo de Brasília, o ator, diretor, produtor e ex-secretário de Cultura Guilherme Reis morreu ontem, aos 70 anos, após alguns anos lutando contra um enfisema pulmonar. O corpo será velado hoje, das 12h30 às 15h, na Sala Martins-Pena do Teatro Nacional Claudio Santoro. Reis deixa dois filhos, Marina e Gabriel, netos e a companheira, a atriz Carmem Moretzsohn. 

Nascido em novembro de 1954, em Goiânia, Luis Guilherme Almeida Reis se mudou para Brasília em 1960 e iniciou a carreira de ator no teatro, aos 18 anos. Esteve em peças como Os Saltimbancos, O Noviço, A vida é sonho, O Exercício, Pequenos Burgueses, Um grito parado no ar e Caça aos ratos. Em entrevista ao Correio, Guilherme contou que descobriu os palcos na escola: "A magia daquela salinha escura e o ritual do teatro me pegaram de cara."

Fisgado, o jovem acabou por construir carreira cuja trajetória faria parte da história do teatro brasiliense. Reis trabalhou ao lado de diretores, como Antônio Abujamra, Zeno Wilde, B. de Paiva e Hugo Rodas. Com esse último, desenvolveu uma espécie de irmandade. "Somos irmãos, ele foi uma importante escola", dizia. 

O primeiro trabalho como diretor veio oito anos após a estreia, em 1980, com a peça A Revolução dos Bichos, uma adaptação do clássico de George Orwell. Nos anos seguintes, ele dirigiu ainda Chapeuzinho Amarelo (1981), Pedro e o Lobo (1983), A hora do pesadelinho (1991), Reta do fim do fim (Prêmio Villanueva de Melhor Espetáculo Estrangeiro de 1997 em Cuba), Movimentos do desejo (1998) e Réveillon (1999). Entre 2005 e 2008, dirigiu e produziu uma trilogia a partir de textos dos autores argentinos Santiago Serrano e Patrícia Suárez, com o Grupo Cena.

Reis também teve uma passagem pelo cinema. Em 1992, participou de O sonho não acabou, dirigido por Sérgio Rezende. Ele fazia parte de um elenco formado por Miguel Falabella, Lúcia Veríssimo e Daniel Dantas. Atuou ainda em A república dos anjos (1991), O cego que gritava luz (1996), O tronco (1999) e Sagrado segredo (2009). Em 2016, dirigiu o musical Dentro da caixinha.

Nas últimas três décadas, teve atuação importantíssima na área de produção cultural. Em 1995, ele criou o Cena Contemporânea, festival que se consolidou como um dos mais importantes na área de dramaturgia do DF. À frente do evento como diretor e curador até a edição mais recente, encerrada em 7 de setembro, trouxe a Brasília algumas das produções mais importantes do cenário nacional e da América Latina. "Nos primeiros trabalhos, percebi que não havia produtor, alguém teria que assumir essa posição", explicou ao Correio durante entrevista em 2009. Antes do Cena, realizou duas edições do Festival Latino-americano de Cultura, na Universidade de Brasília (UnB) e o Temporada Nacional, projeto da Faculdade Dulcina, que trazia à cidade um grande nome do teatro por mês, como Fernanda Montenegro e Antunes Filho.

Reis acreditou no sucesso do festival desde o início. "Imaginava (que se tornaria um evento internacional) sim, porque a gente tem a pretensão de achar o que faz importante. Há um espaço bacana para o festival se ampliar, não no sentido de crescimento físico, mas no de atingir outras plateias, quebrar o preconceito da classe A, que paga R$ 600 para assistir ao Cirque du Soleil. Com esse valor, você assistiria a 80 espetáculos do Cena", contou ao Correio.

Em 2015, assumiu o cargo de secretário de Cultura do GDF, durante o governo de Rodrigo Rollemberg (PSB). À frente da Secretaria de Cultura, ajudou a dar forma à Lei Orgânica da Cultura, que estabeleceu o Sistema de Arte e Cultura do DF, composto por órgãos e entidades da Administração Pública e destinado à formulação, financiamento e gestão de políticas públicas de cultura no Distrito Federal, e definiu regras para o financiamento à cultura. Foi responsável também pelas reformas do Espaço Cultural Renato Russo e Centro de Dança de Brasília. "Era uma das pessoas mais queridas que conheci. Um amigo! Uma energia contagiante! Um artista! Um produtor! Um ser brilhante! Um secretário de Cultura que me enche de orgulho e gratidão, lembra Rodrigo Rollemberg. 

Ávido defensor da cultura, Reis considerava a abertura de espaços, como o CCBB, Caixa Cultural e unidades do Sesc um "avanço", mas que "mascara um problema estrutural de 30 anos: um total abandono do setor cultural, que ainda é visto como aquele bando de artistas enchendo o saco e querendo dinheiro o Estado." Para ele, era necessário olhar para o setor cultural como fonte de renda e emprego e compreender que os problemas estruturais causados pela "omissão do governo" seriam resolvidos apenas com políticas públicas.

"Se houver um censo sério em Brasília para ver o quanto emprega o setor de entretenimento e cultura, a gente levaria um susto com a quantidade de estabelecimentos, festas, prestadores de serviço. O outro lado da ação do governo, ou melhor, da omissão do governo é a falta de compreensão da cultura como um processo de inclusão social e cidadania. Não se pode simplesmente resolver o problema do Cine Brasília, do Teatro Nacional e da 508 Sul. Há que se ter uma política de Estado", ponderou. 

 


  • Mais que um ator, um artista que representa a luta pela cultura brasileira
    Mais que um ator, um artista que representa a luta pela cultura brasileira Foto: Guilherme Reis Humberto Araújo
  • Guilherme Reis e Carmem Moretzsohn no Cena Contemporânea de agosto
    Guilherme Reis e Carmem Moretzsohn no Cena Contemporânea de agosto Foto: Humberto Araujo
  • Com Carmem Moretzsohn na celebração do Cena Contemporânea em agosto
    Com Carmem Moretzsohn na celebração do Cena Contemporânea em agosto Foto: Roberto Sanson/Divulgação
  • 19/01/2016. Crédito: Helio Montferre/Esp. CB/D.A Press. Brasil. Brasília - DF. Entrevista com o Secretário de Cultura do Distrito Federal, Guilherme Reis.
    19/01/2016. Crédito: Helio Montferre/Esp. CB/D.A Press. Brasil. Brasília - DF. Entrevista com o Secretário de Cultura do Distrito Federal, Guilherme Reis. Foto: Helio Montferre/Esp. CB/D.A Press
  • 19/01/2016. Crédito: Helio Montferre/Esp. CB/D.A Press. Brasil. Brasília - DF. Entrevista com o Secretário de Cultura do Distrito Federal, Guilherme Reis.
    19/01/2016. Crédito: Helio Montferre/Esp. CB/D.A Press. Brasil. Brasília - DF. Entrevista com o Secretário de Cultura do Distrito Federal, Guilherme Reis. Foto: Helio Montferre/Esp. CB/D.A Press
  • 19/01/2016. Crédito: Helio Montferre/Esp. CB/D.A Press. Brasil. Brasília - DF. Entrevista com Guilherme Reis, secretário de Cultura do Distrito Federal.
    19/01/2016. Crédito: Helio Montferre/Esp. CB/D.A Press. Brasil. Brasília - DF. Entrevista com Guilherme Reis, secretário de Cultura do Distrito Federal. Foto: Helio Montferre/Esp. CB/D.A Press
  • 19/01/2016. Crédito: Helio Montferre/Esp. CB/D.A Press. Brasil. Brasília - DF. Entrevista com Guilherme Reis, secretário de Cultura do DF.
    19/01/2016. Crédito: Helio Montferre/Esp. CB/D.A Press. Brasil. Brasília - DF. Entrevista com Guilherme Reis, secretário de Cultura do DF. Foto: Helio Montferre/Esp. CB/D.A Press
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JC
postado em 25/09/2025 05:08
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