Artes cênicas

'O admirável sertão de Zé Ramalho': Musical homenageia o artista no Teatro Nacional

Espetáculo chega à capital para homenagear a vida e a obra do artista paraibano

Em uma mistura de música, poesia e teatro, o musical O admirável sertão de Zé Ramalho toma conta do palco do Teatro Nacional com uma homenagem ao artista e à sua obra. Com dramaturgia  de Pedro Kosovski, direção de Marco André Nunes e idealização de Eduardo Barata, o espetáculo é dividido em cinco módulos com cinco atores diferentes. O elenco conta com Ceiça Moreno, Cesar Werneck, Diego Zangado, Duda Barata, Eli Ferreira, Marcello Melo, Muato, Nizaj e Tiago Herz. 

No primeiro módulo, a infância de Zé Ramalho no Brejo do Cruz, na Paraíba, é interpretada por Duda Barata. Em seguida, a ida do artista para Campina Grande o conecta com a música,  especialmente a Jovem Guarda, e a peça mostra o momento no qual Zé forma sua primeira banda, com atuação de Moato, diretor musical do espetáculo. Após o contato com a música, Tiago Herz interpreta Zé Ramalho em João Pessoa, onde se envolve com a esposa de um importante político e precisa fugir.

Após a fuga, Zé se encontra no Rio de Janeiro para tentar a vida como artista. É um momento no qual vai passar por diversas dificuldades para se manter. O jovem angolano Nizaj retrata o personagem nessa parte do espetáculo. O último módulo aborda a fase consagrada do artista, interpretada por Marcelo Melo. "O espetáculo é plural, diverso, e os Zés podem ser qualquer um: menino, menina, jovem, velho. Cada um com seu sonho no seu próprio sertão, que pode ser territorial, criativo ou emocional. Se tiver vontade e vocação artística, você pode virar um Zé Ramalho", comenta o idealizador, Eduardo Barata. 

O espetáculo estará em cartaz na Sala Martins Pena do Teatro Nacional até domingo. O idealizador e produtor artístico Eduardo Barata compartilha com o Correio as inspirações para a produção, o que cada módulo aborda e a importância de trazer a peça para a capital. 

Entrevista com Eduardo Barata, idealizador e produtor artístico 

Como surgiu a ideia de realizar o musical e o que te inspirou inicialmente?

Em 2019, havia uma série de musicais biográficos em cartaz em São Paulo. Tinha Cássia Eller, Tim Maia, Cazuza. E todos já mortos e contados de uma maneira muito didática. Não estou criticando, mas era uma maneira assim: quando nasceu, quem era o pai, quem era a mãe, o primeiro amor, os filhos, e assim por diante. E aquilo já estava até virando um modelo de fazer sucesso fácil. Eu queria ir para um desafio artístico. Queria pensar em outra coisa, aquilo para mim não batia mais. E o Zé Ramalho é um artista que, tanto pela letra das canções quanto pela música, sempre falou comigo. Ele tem uma brasilidade profunda, mesmo quando tem aquela guitarra toda, trazendo o Nordeste universal, universalizando o cancioneiro brasileiro. Queria fazer um espetáculo que partisse da obra de um artista vivo que eu admirasse e que representasse, para mim, o Brasil profundo, não só o Sudeste. Um Brasil universal, nordestino, que é o Brasil da minha família, do Norte. Eu sou carioca, mas minha família é do Norte. Sempre tive muita fantasia com o Nordeste, meu avô era nordestino e eu sempre trazia um pouco do Nordeste comigo. Até virar um homem de teatro, eu via o Nordeste como um lugar quase mítico, meio Disney. As pessoas têm vontade de conhecer a Disney e eu tinha vontade de conhecer Belém. E foi com essa intenção que eu criei o projeto a partir da obra de um artista vivo que, para mim, merecia todas as homenagens.

Como foi o processo de criação e as dificuldades que você enfrentou até a estreia?

Criei o espetáculo em 2019, em Brasília, quando minha esposa ainda estava viva. Naquele ano, Bolsonaro foi eleito, e eu me posicionei publicamente quando ele começou a perseguir artistas. Eu já tinha o projeto captado no fim de 2019, mas o dinheiro ficou preso, não liberaram. Depois, em 2020, veio a pandemia. Então, eu tinha o dinheiro, mas não podia montar o espetáculo. Em 2022, minha esposa faleceu de câncer. Ela era uma artista que amava Brasília, referência na capital federal. Era francesa por origem, mas criada aqui, e tinha grande paixão por essa cidade. Ela ganhou várias medalhas de Brasília. A primeira novela que fez na Globo foi aos 17 anos, há 35 anos, e nunca deixou de amar essa cidade. Por isso, voltar agora a Brasília, para o Teatro Nacional, na Sala Martins Pena, é muito simbólico para mim. Faz anos que não me apresento aqui. A última vez foi na Sala Villa-Lobos, com Débora Bloch, e o teatro fechou logo depois. Dedico essa temporada em Brasília à minha esposa. Esse projeto nasceu com ela, e agora está na terra que ela tanto amou.

E o que representa essa volta a Brasília, neste momento?

É muito forte, muito emocionante. Estamos voltando em plena democracia, com liberdade de expressão, para um teatro no qual me apresentei muito. Tenho quase 40 anos de teatro. Resolvi fazer uma homenagem ao povo, à democracia, ao Zé Ramalho e à própria Brasília. Fizemos uma sessão gratuita na quarta-feira. Graças à Lei Rouanet, tão amaldiçoada no governo passado, conseguimos empregar milhões de pessoas. A economia da cultura contribui para o PIB mais do que a indústria automobilística. Tenho orgulho de ter o patrocínio da Petrobras, uma empresa brasileira, patrocinando o espetáculo. Sem patrocínio, seria impossível. Mesmo assim, faço com alegria: para festejar o Zé Ramalho, a Françoise Forton, minha esposa, Brasília, o Teatro Nacional, a democracia e a liberdade de expressão. Estou muito feliz, emocionado, com sensação de vitória, muita saudade, mas também gratidão. Quero proporcionar, dentro do meu limite como homem de teatro, um espetáculo de qualidade que propague a cultura e a arte do Brasil, do Nordeste e toda a potência do nosso setor criativo.

O Admirável Sertão de Zé Ramalho

Hoje, amanhã e sábado, às 20h, e domingo, às 18h, no Teatro Nacional Cláudio Santoro. Ingressos a partir de R$ 25 na bilheteria local ou no site oficial da peça.

 


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