Música

Evinha desafia o tempo e conquista nova geração de fãs

Cantora que fez sucesso nos anos 1970 no rastro da Jovem Guarda volta aos holofotes e conquista geração Z

 Evinha
 -  (crédito: Material cedido ao Correio)
Evinha - (crédito: Material cedido ao Correio)

Aos 74 anos, a cantora Evinha vive, em 2025, um novo momento na carreira. Após mais de meio século de trajetória na música, a artista viu as músicas ganharem fôlego nas redes sociais e conquistarem um público que sequer era nascido quando ela estourou nos anos 1970. O impulso veio de uma parceria com o rapper BK, que usou um trecho de duas canções dela no disco lançado este ano. Somente a faixa Cacos de vidro, que utiliza um sample de Esperar pra ver, lançada por Evinha em 1971, já alcançou mais de 74 mil ouvintes no Spotify. 

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Na internet, as músicas da cantora se tornaram trilha sonora de edições de cortes filmes, séries e animações feitas por fãs, conhecidos como "edits". Um vídeo de 2019, por exemplo, que usa Esperar pra ver em cenas da animação Lupin III, ultrapassou a marca de 1 milhão de visualizações. 

A redescoberta fez com que o álbum Cartão postal fosse relançado no Brasil, Espanha e Alemanha no início do ano. Evinha também foi uma das atrações do Festival Rock The Moutain, no Rio de Janeiro, em outubro. "Eu me sinto como uma pessoa que começa uma carreira", comentou a artista em entrevista ao Correio. 

Na verdade, a carreira de Evinha começou ainda no início dos anos 1960, enquanto cantava no grupo Trio Esperança, junto dos irmãos. O conjunto gravou sucessos como Festa do Bolinha e Filme triste. No final da década, a cantora inicia a carreira solo vencendo o IV Festival Internacional da Canção Popular com Cantiga por Luciana.

Já nos anos 1980, Evinha se muda para a França, onde mora até hoje com o marido, o maestro francês Gérard Gambus. Foi o esposo, inclusive, que produziu a reunião do Trio Esperança, levando Evinha e as irmãs Regina e Mariza a se apresentarem ao redor do mundo nos últimos anos. O retorno do trio rendeu o espetáculo Goldherança, que percorreu o Brasil, em 2007, contando a história da família. 

A cantora volta regularmente ao país natal para apresentações, que agora estão repletas de rostos novos. "Fiz um show em São Paulo, em 2022, e fiquei muito surpresa com os jovens que estavam presentes. Na hora dos autógrafos , eles vinham com o LP antigo dizendo: 'Eu adoro a sua música'", lembra. O processo de redescoberta também foi interno. "Eu nem lembrava mais do que Só quero ver. Já tem tanto tempo, gravei vários discos e depois eu redescobri essa música que eu adoro", aponta.

Reencontro de gerações

Evinha define a parceria com BK como "reencontro de gerações", apesar de considerar a proposta "surrealista". "Eu recebi o convite com muita surpresa e satisfação", afirmou. O resultado está em duas músicas do disco Diamantes, lágrimas e rostos para esquecer": Cacos de vidro, que conta com um trecho de Esperar para ver, e Só quero ver. 

A artista não conhecia o rapper, mas se encantou com a proposta de revisitar o próprio catálogo. "Ele [BK] foi uma pessoa incrivelmente respeitosa. Respeitou tudo que tinha na música, na letra e, por isso, as pessoas entenderam esse respeito", conta. A colaboração com o rapper rendeu, inclusive, a primeira indicação da cantora ao Grammy Latino na categoria Melhor Interpretação Urbana em Língua Portuguesa por Só quero ver.

Além disso, BK convidou a veterana para cantar em alguns shows dele. "Ele me convidou para participar do show de estreia da turnê do álbum e vamos fazer mais uma data agora em 2025 em Belém", afirma.

Antes dele, o rapper inglês Songer, também convocou Evinha para um feat na faixa de mesmo nome da cantora, utilizando um sample de Encontro, também do disco Cartão postal. A música foi lançada em 2024. 

Quando a tela revive a canção

O caso de Evinha não é isolado. O audiovisual e as redes sociais têm sido pontes poderosas entre artistas veteranos e novos ouvintes. Em 2025, o cantor Ney Matogrosso despertou o interesse da geração Z com o lançamento da cinebiografia Homem com H, que conta a história do artista, e levou mais de 600 mil espectadores às salas de cinema. O filme Ainda estou aqui (2024), dirigido por Walter Salles, também trouxe ao público jovem clássicos da música brasileira como a faixa É preciso dar um jeito, de Erasmo Carlos, lançada em 1971. Atualmente, a música tema do filme ocupa o topo das mais escutadas do Tremendão, morto em 2022, e entrou na playlist Top Viral do Spotify Brasil. 

Rita Lee é outra artista que tem a simpatia dos jovens, por meio de entrevistas e músicas que viralizaram na internet. Esse fenômeno pode ser explicado por diversos fatores que vão além da qualidade, conforme conta ao Correio Alexei Alves de Queiroz, professor do Departamento de Música da Universidade de Brasília (MUS/UnB). "De repente, viraliza um vídeo, alguém famoso encontra um disco encalhado em alguma loja, faz um remix e aquilo começa a vingar. Dentro de um novo contexto, essa música ganha um novo significado", explica. 

A redescoberta de artistas não está atrelada somente às novas tecnologias, mas pode ser impulsionada no ambiente digital. "O conceito de nostalgia vende", explica a professora e pesquisadora Adriana Amaral, coordenadora do laboratório de pesquisa Cultura Pop, Comunicação e Tecnologias, da Universidade Federal Fluminense (Cultpop/UFF). "Por ser uma espécie de tendência nos últimos tempos na cultura pop, essa redescoberta é facilitada por essas ferramentas." 

A cantora Kate Bush recebeu cerca de US$ 2,3 milhões - aproximadamente R$ 12 milhões - em receita de streaming após a música Running up that hill entrar na trilha sonora da quarta temporada de Stranger things, conforme a revista Rolling Stone. Já o projeto Rumours, da banda Fleetwood Mac, se tornou o álbum de rock mais vendido de 2024, depois que o grupo viralizou no TikTok com músicas e fofocas de bastidores. A banda Bôa voltou a fazer shows após 20 anos por conta do sucesso da música Duvet nas plataformas digitais.

*Estagiária sob a supervisão de Severino Francisco

 


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postado em 03/12/2025 04:35
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