
Beatriz Souza tem a consciência de que a vida não parou depois de 2 de agosto de 2024, o dia em que entrou para o Olimpo com o título da categoria 78kg nos Jogos de Paris-2024. Pelo contrário, tornou-se mais intensa após desbancar a israelense Raz Hershko. A agenda, antes quase exclusiva aos treinos e às competições, passou a contemplar compromissos publicitários, entrevistas, viagens para além do esporte e por aí vai. A visibilidade sobre a judoca aumentou. Hoje, ostenta 2,7 milhões de seguidores no Instagram. O número é superior a 10 dos 20 clubes da Série A do Campeonato Brasileiro.
Em entrevista ao Correio, relembra a Olimpíada da França — que também a brindou com o bronze por equipes —, projeta Los Angeles-2028, mas pensa fora da caixa, ou melhor, dos tatames. Consciente ao dizer "Não somos atletas para a vida inteira", Bia, embaixadora do Time Neoenergia, agarra as oportunidades, prepara-se para o pós-carreira, comenta sobre ter chegado à metade da graduação de administração e outros tópicos.
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Quando pensa naquele momento agora, o que vem primeiro à sua cabeça?
É quando o cara anuncia que eu sou campeã olímpica e eu subo ali no pódio. É um dos momentos que mais ficará tatuado na minha mente. Ali, realmente vi que havia me tornado campeã olímpica. Dei aquela voltinha no pódio e vi que o ginásio estava simplesmente lotado. Eu não tinha percebido isso antes, nem antes da competição. Aquele momento foi muito mágico.
Você tem, hoje, 2,7 milhões de seguidores do Instagram. Isso é mais do que 10 dos 20 clubes da Série A e igual ao Fluminense. Como tem curtido essa vida de influencer?
É uma vida diferente, confesso. Não é algo que eu estava acostumada, mas agora estou levando de uma forma bem mais tranquila. Estou sendo uma blogueira em construção. Ainda assim, é um mundo novo para mim. Mas é algo que eu estou curtindo bastante.
Você passou a ser rosto de marcas e campanhas. Como escolhe em quais entrar? Alguma delas tem um significado especial para você?
Nossa, são muitos eventos muito bons. Mas uma das ações que eu nunca tinha participado foi viver o carnaval. Nós, atletas, não vivemos nem sabemos o que é carnaval. Neste ano, a Neoenergia me deu como um grande presente viver o carnaval em Salvador. Foi surreal para mim, uma grande experiência. Aliás, muito obrigada à Neoenergia por essa experiência, me marcou muito.
Qual foi o lugar mais diferente onde alguém te reconheceu ou pediu uma foto?
Hoje, em todo lugar, espero tirar foto em algum canto, nem que seja pelo menos uma pessoa, mas sempre dando uma passadinha no shopping, ou andando na rua, indo na padaria, em qualquer lugar sou reconhecida.
Estamos nos Jogos da Juventude. Qual é a primeira lembrança desse evento que vem à sua cabeça?
São memórias muito boas, pois participei de todas as edições que pude. São grandes memórias, porque convivemos com outras modalidades, temos a experiência de trocar com outros atletas também, conhecemos outras histórias, fazemos muitas amizades, às vezes, amizades para a vida inteira. Aqui, damos um start também em sonhos olímpicos. Aqui, temos grandes referências. Na minha época, quando eu vejo que foi o meu primeiro, a embaixadora que foi a Sara Menezes (hoje treinadora de Bia). Ela tinha acabado de ganhar a medalha olímpica dela (ouro dos 48kg em Londres-2012). A Sara faz parte da minha vida muito mais em vários momentos que a gente nem esperava.
Tem alguma história com Brasília? Você já veio para homenagem no Dia do Soldado, encontro com o presidente Lula no Planalto e está aqui para outra ação. Nessas vindas, teve tempo para turistar? Algo que gostou?
No início da carreira, não, mas tivemos algumas competições aqui, se não me engano, dois ou três nacionais aqui, além de Troféu Brasil e Grand Prix por equipes. Acho que tenho boas histórias com Brasília, além de virmos para cá com mais frequência do que esperado, mas é um lugar muito bom. O turismo é só dentro do carro, de um compromisso para o outro, olhando pela janelinha, é o básico.
O que conhece da nova geração de Brasília? Tivemos Ketleyn Quadros. Hoje, temos Guilherme Schimidt, Bianca Reis, Nicole Marques…
Brasília tem uma água diferente aqui, tem grandes atletas, tem uma nova geração vindo também. Acho que a gente espera manter a tradição com grandes resultados. A Kequinha (Ketleyn Quadros), eu a amo, foi uma das embaixadoras também em uma das épocas que vim para os Jogos da Juventude, compartilhei a Seleção Brasileira com ela, é uma das pessoas que sempre estará dentro do meu coração, muito especial para mim. Ela deu início a esses grandes resultados para Brasília. Veio o Schimidt também, participando da Olimpíada, nos ajudando a conquistar o bronze olímpico por equipes em Paris. Os novos nomes vêm para engrandecer cada vez mais não só o nome do judô, mas de Brasília também.
O Baby competiu em Jogos Olímpicos até os 37 anos. Você chegará em Los Angeles com 30. Planeja ir mais além, Brisbane-2032 com 34, por exemplo?
Acho que a gente pode esperar. Vamos esperar chegar a Los Angeles, vamos ver um ciclo de cada vez. A princípio, o foco total agora é Los Angeles 2028, estamos na construção da vaga para essa Olimpíada, depois a gente decide sobre 2032, mas vamos com calma.
Hoje, fala-se muito no pós-carreira do atleta. Você já pensa no que fazer depois?
Com certeza, temos de aproveitar as oportunidades. Não sei ao certo qual realmente será a profissão que seguirei quando me aposentar do judô, mas temos de nos preparar ao máximo. Desde novo, temos de pensar em estudos, em adquirir conhecimento, um diploma, um curso diferente. O COB oferece muitos cursos para quem está fazendo essa transição. A vida de atleta é muito curta, temos de aproveitar, fazer um bom investimento, guardar dinheiro, saber onde colocá-lo para não passar tanto sufoco no pós-carreira. Não somos atletas para a vida inteira.
Por falar em estudos, você está cursando administração…
Sou EAD (Educação à Distância), mas prometo que, um dia, me formo (risos). Mas é algo muito complicado. Às vezes, estamos em uma fase muito forte de treino, não conseguimos estudar, com uma competição atrás da outra, passamos o maior tempo fora do país, com muitas viagens. Levamos muito tempo para nos formar, mais do que o normal. São quatro semestres, mas está parecendo uma vida inteira. Cheguei à metade pelo menos, mas não sei quando acabo.
O que falar sobre a valorização da sua imagem?
Venho como uma grande representatividade, não só pelo fato de ser uma mulher negra, uma mulher gorda, mas acho que de sonhos. Temos de sonhar grande. Sou uma atleta de uma cidade pequena, vim de uma associação e, hoje, sou campeã olímpica. Isso requer em acreditar em sonhos, acreditar no processo, entregar-se ao máximo no processo. Nada nunca foi fácil, e acho nunca será. Todos os grandes sonhos requerem grandes sacrifícios. É uma bandeira de sonhos que gosto de carregar, independentemente da cor da pele, do tamanho, do porte físico, temos de acreditar em sonhos. Essa é a bandeira que eu gosto de carregar.
Quem é a sua referência no esporte?
Tenho muitas referências. O que não me falta são referências no esporte, ainda mais no judô. Temos grandes pioneiras, como Soraia André e Rosicleia Campos. Temos nossas medalhistas olímpicas. Não consigo dizer só um nome, mas também tenho minha família como referência.
Como tem sido seu descanso fora do esporte tem assistido ou lido algum livro?
Leio muitos livros, mas sempre que eu puder dormir, aproveito para descansar. O descanso também é treino. Temos de aproveitar e tirar isso de uma melhor forma, nem que seja para distrair a mente, ir ao cinema, andar no shopping, passear com os cachorros, ter um momento divertido com a família. Acho que toda forma de descanso é bem-vinda.
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Assiste a outros esportes no seu momento de descanso?
Às vezes. Gosto quando a galera do Brasil está competindo, fico de olho. Estou sempre torcendo de alguma forma. Sempre passo um pouquinho por todos os esportes.
Assistiu ao ouro do Caio Bonfim na marcha atlética do Mundial?
Ele simplesmente foi sensacional. O Caio é um atleta maravilhoso, ele vem construindo uma grande história cada vez mais. É um grande atleta, só mostra a superação que tem a cada competição e acho que essa medalha foi muito mais do que merecido e muito mais do que conquistada. Caio, parabéns, você foi sensacional, e o mundo é seu!.
Se pudesse trocar de vida por um dia com qualquer atleta do mundo e de qualquer esporte, com quem seria e por quê?
Nossa, que difícil! Tem as meninas do vôlei. Já pensei em ginástica, mas acho que… não sei, às vezes, penso na Rebeca (Andrade) também, mas não sei se sairia tão inteira (risos). Tem muitas modalidades que daria para sonhar. Na cabeça, sou capaz de fazer tudo.
Um recado para os fãs de Brasília.
Agradeço a vocês por toda a torcida, por terem me acompanhado na Olimpíada, por estarem me acompanhando no pós-Olimpíada também, por torcerem por mim em busca de Los Angeles. Desde já, eu sou muito grata por cada um de vocês, por todas as energias positivas que vocês me mandaram. Em troca, eu quero mandar um grande beijo especial para vocês, um grande abraço. Vocês sempre estarão dentro do meu coração. Obrigada.
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