
A nona sinfonia rubro-negra na história do Campeonato Brasileiro teve um "Gran Finale" ontem, no Maracanã, com o último acorde de um dos músicos mais criticados pela torcida. A relação da plateia com Samuel Lino era desafinada, marcada por contratempos e até algumas vaias. Coube ao maestro Filipe Luís mantê-lo no compasso sem dar ouvido aos críticos. A reverência ao carregador de piano do ataque demorou 37 minutos na vitória por 1 x 0 contra o Ceará. Uma trama iniciada pelo volante Jorginho com assistência do meia Carrascal deixou o jogador de 25 anos em condição de chutar cruzado, abrir o placar e demolir o forte sistema defensivo arquitetado pelo técnico Léo Condé. O Vozão se protegia com nove jogadores e testava a paciência do conjunto carioca.
"A defesa dos caras estava muito protegida, difícil de entrar. Tentei, busquei e, depois de várias tentativas, consegui. Eu sou resiliente. Foi assim durante toda a minha carreira e não poderia ser diferente", afirmou Samuel Lino em entrevista ao SporTV após da partida antes da cerimônia de entrega do troféu. O jogador é um dos convocados por Carlo Ancelotti para a Seleção Brasileira desde que o italiano assumiu o cargo.
O gol de Samuel Lino consolida o ano decisivo dos reforços em três dos quatro títulos do Flamengo na temporada. Juninho Vieira consagrou o time campeão carioca contra o Fluminense. Ele marcou o segundo no triunfo por 2 x 1 na primeira partida. Houve empate por 0 x 0 na volta. No sábado passado, o zagueiro Danilo consumou o tetracampeonato na Copa Libertadores da América. A Supercopa do Brasil teve as assinaturas de Bruno Henrique e de Luiz Araújo contra o Botafogo no Mangueirão, em Belém.
Samuel Lino desembarcou no Flamengo por 22 milhões de euros. Homem de confiança de Filipe Luís, trabalhava no Atlético de Madrid com um dos gurus do técnico rubro-negro, Diego Simeone. Criticado por ser um ponta sem gana pela rede, um dos atributos da posição no futebol moderno, o destro acostumado a cair pela esquerda se enquadrou no modelo de jogo por três motivos: velocidade, drible e recomposição. Acostumado a contribuir até como lateral-esquerdo do no time espanhol, entregou proteção ao lado esquerdo.
"A gente, que vem da Europa, vem muito intenso, então foi um baque para mim. Eu falei: 'Por que estou passando por isso?'. Às vezes, você já passou por um momento assim, de não fazer gol, só que aqui no Brasil é muita informação, a mídia, o Flamengo é gigantesco, as pessoas caem matando, tem que fazer gol todo jogo", desabafou Lino na pior fase dele com a camisa rubro-negra. Colecionou gols anulados e perdeu até pênalti nas quartas de final da Libertadores contra o Estudiantes, em La Plata.
O gol de ontem anotado por Samuel Lino foi o quarto dele com a camisa do Flamengo. Os anteriores foram contra o São Paulo e dois diante do Vitória. Ajudou, também, com cinco assistências e se firmou no time aos trancos e barrancos sob a proteção de Filipe Luis. "Precisamos de alguém que entre naquelas defesas muito fechadas, desequilibre e obrigue a ter, cada vez que tocar na bola, dois ou três jogadores em cima. Importante que entendam que os dribladores são os que mais perdem bola, é natural", argumentou o técnico.
Samuel Lino voltou ao Flamengo depois de sete anos. Fazia parte do elenco campeão da Copa São Paulo de Futebol Júnior em 2018 sob o comando de Maurício Souza na vitória por 1 x 0 contra o São Paulo, no Pacaembu. Jogou duas vezes na campanha no torneio.
O jogo do título teve o enredo do campeonato inteiro. Um time viciado em ter a bola nos pés, mas com imensa dificuldade de traduzir a posse em gol. O Ceará iniciou a partida fechado. Posicionava até 10 jogadores atrás da linha da bola especulando um erro de passe dos donos da casa. Não acontecia. O Flamengo chegou a ostentar 72% de retenção da bola. Rondava a área do Ceará, mas tinha imensa dificuldade para infiltrar. Jorginho arriscou uma finalização de fora da área com perigo. Varela colocou a bola no centro da área na pequena área alvinegra, mas o time carecia de um centroavante especialista como o lesionado Pedro.
A solução era unir paciência, experiência e inteligência. Jorginho, uma espécie de camisa 10 posicionado como 5, regeu o lance do primeiro gol. Acionou o colombiano Carrascal e ele conectou a bola com Samuel Lino para desentalar o gol da garganta de 73.244 presentes no Maracanã à espera da taça e do fim da fila de cinco anos o principal título nacional.
Mesmo com as pernas pesadas, depois de uma final tensa contra o Palmeiras na Libertadores, em Lima, no Peru, seguida por festa sob o sol escaldante no Rio com a torcida para celebrar o tetra, o Flamengo conquistou o Brasileirão pela nova vez na 74ª partida na temporada. O ano não acabou. O time pode entrar em campo mais quatro vezes na temporada. Falta o jogo contra o Mirassol na última rodada e até três na Copa Intercontinental. O primeiro deles na quarta-feira contra o Cruz Azul, em Doha, no Catar. Se avançar, enfrentará o Pyramids do Egito. Caso avance novamente, disputará a final com o Paris Saint-Germain no 78º compromisso no ano na maratona.
O Flamengo bate a meta estabelecida pelo presidente Luis Eduardo Baptista, o Bap. No início da temporada, o presidente eleito no fim do ano passado estabeleceu o Brasileirão como prioridade à frente da Libertadores e da Copa do Brasil. Eliminado pelo Atlético-MG nas oitavas de final do mata-mata nacional, concentrou esforços nas reconquistas do Brasil e da América do Sul. Agora, como diz a torcida, quer o mundo de novo, graças a um técnico obcecado por troféus.
Em pouco mais de um ano no cargo, Filipe Luís coleciona a Copa do Brasil em 2024, além do Campeonato Carioca, da Supercopa Rei do Brasil, da Libertadores e o Campeonato Brasileiro na temporada de 2025. Sem contar a Taça Guanabara, o título simbólico da primeira fase do Estadual. O ex-lateral-esquerdo repete feitos de Paulo César Carpegiani e de Andrade, dois ídolos do clube carioca campeões do Brasileirão como jogador e técnico.
Jorginho resumiu a série de conquistas assim: "Isso é resultado de muita entrega. Conexão do grupo. Nós focamos em ver o companheiro crescer e foi assim do início ao fim nesta temporada", encerrou.

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