
Enquanto o mundo aguardava uma resposta militar "devastadora" a um ataque de mísseis do Irã contra a base de Al Udeid, a maior dos EUA no Oriente Médio (no Catar), o presidente Donald Trump começou a emitir sinais de apego à diplomacia. "Parabéns, mundo! É tempo de paz", escreveu em sua plataforma Truth Social, por volta das 17h desta segunda-feira (18h, em Brasília). Duas horas depois, anunciou que Irã e Israel concordaram com um "cessar-fogo total". "Parabéns a todos! Foi plenamente acordado entre Israel e Irã que haverá um cessar-fogo total (em aproximadamente seis horas, quando Israel e Irã tiverem se acalmado e concluído suas missões finais em andamento) por 12 horas, momento em que a guerra será considerada encerrada!", afirmou. "Oficialmente, o Irã iniciará o cessar-fogo e, na 12ª hora, Israel iniciará o cessar-fogo. Na 24ª hora, o fim oficial da guerra de 12 dias será saudado pelo mundo."
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Uma autoridade iraniana disse à agência de notícias Reuters que o país aceitou um acordo de trégua mediado pelo premiê do Catar, xeque Mohammed bin Abdulrahman Al-Thani. Às 21h30 (hora de Brasília), o chanceler iraniano, Abbas Araghchi, avisou que, "por ora, não há acordo". Ele acrescentou que, caso Israel detenha a "agressão ilegal", Teerã não tem intenção de prosseguir com os ataques. Até o fechamento desta edição, não havia resposta de Israel.
Pelo plano divulgado por Trump, o Irã interromperia os combates à 1h desta terça-feira (hora de Brasília). Às 13h seria a vez de Israel pausar as hostilidades. À 1h desta quarta-feira, o conflito seria oficialmente encerrado. "Durante cada cessar-fogo, o outro lado permanecerá pacífico e respeitoso. Partindo do princípio de que tudo funcionará como deveria, e funcionará, gostaria de parabenizar ambos os países, Israel e Irã, por terem a resistência, a coragem e a inteligência necessárias para pôr fim ao que deveria ser chamado de 'Guerra dos 12 dias'. Esta é uma guerra que poderia ter durado anos e destruído todo o Oriente Médio, mas não durou e nunca durará! Deus abençoe Israel, Deus abençoe o Irã, Deus abençoe o Oriente Médio, Deus abençoe os Estados Unidos da América e Deus abençoe o mundo!", concluiu Trump, em seu post na rede social.
"Resposta fraca"
Antes da publicação, o republicano minimizou o impacto do ataque à base de Al Udeid, que não teria deixado feridos — o Catar garantiu que interceptou todos os mísseis. "O Irã respondeu oficialmente à nossa destruição de suas instalações nucleares com uma resposta muito fraca, o que esperávamos. (...) Foram disparados 14 mísseis — 13 foram derrubados e 1, 'liberado', pois estava em uma direção não ameaçadora", comentou. O vice-presidente J.D. Vance sugeriu que o Irã viu-se forçado a ceder depois que os bombardeios às instalações nucleares, no sábado, inviabilizaram por completo o desenvolvimento da bomba atômica.
Menos de uma hora antes do anúncio do possível cessar-fogo, o aiatolá Ali Khamenei, guia supremo do Irã, pronunciou-se de forma ameaçadora aos EUA, em uma mensagem seguida de uma ilustração de uma base militar e a bandeira americana em chamas. "Não fizemos mal a ninguém. Não aceitaremos nenhum tipo de assédio de ninguém, sob nenhuma circunstância. Não nos submeteremos ao assédio de ninguém. Essa é a lógica da nação iraniana", reagiu.
Doutora em ciência política e professora de relações internacionais na ESPM, Denilde Holzhacker afirmou ao Correio que Trump deu todas as indicações de que buscaria uma trégua entre Irã e Israel. "Ele quis sair como grande mediador desse processo. O ataque dos EUA às instalações nucleares foi uma estratégia para abrir espaço à negociação. Precisamos aguardar se Israel aceitará e ver os termos do acordo. Se ele envolve o fim do programa nuclear iraniano ou uma mudança de regime interno. Seriam pontos importantes para saber se o acordo será cumprido ou se será mais uma estratégia para reduzir a tensão, mas manter a lógica de antagonismo e de conflito", explicou.
James Onnig, professor de geopolítica da FACAMP (Campinas) — ressaltou que o acordo foi anunciado poucas horas depois de o Irã ameaçar o fechamento do Estreito de Ormuz. "Ele surgiu na medida em que o ataque americano à instalação de Fordow criou uma expectativa pelo fim do conflito, e isso não ocorreu. O Irã respondeu ao bombardeio dos EUA, o que bloqueou qualquer ação de Israel", afirmou ao Correio. "Se os EUA afirmam que acertaram as instalações e o problema está resolvido, o apelo a um cessar-fogo somente prova que não está solucionado. O que eles queriam era a queda do regime iraniano, que não ocorrerá, por enquanto. Vejo de forma cética. É mais uma vitória política do Irã do que um triunfo militar de Israel."
Onnig lembrou que o governo teocrático não foi derrubado e colocou em xeque o paradeiro do urânio enriquecido iraniano. "Talvez esse acordo não dure. Parece-me que Israel teve que engolir seco isso, pois Trump quer mostrar que solucionou o problema."
Ofensiva avisada
O Irã avisou ao Catar de que atacaria a base de Al Udeid e deixou claro que o país árabe não era inimigo. As autoridades de Doha esvaziaram as instalações e impediram os mísseis de chegarem à base. "Advertimos ao tolo e estúpido presidente americano que, no caso de se repetir uma agressão (...), receberá respostas mais contundentes que ele lamentará", afirmou o chefe da Guarda Revolucionária Iraniana, Mohammad Pakpour, citado pela televisão estatal.
Ponto de projeção de força na região
A base militar Al Udeid foi criada há 29 anos, em meio ao deserto,próximo a Doha (capital do Catar). Ela funciona como o quartel-general avançado do Comando Central dos EUA, responsável pelas operações militares americanas em uma enorme faixa de território que se estende do Egito, no oeste, até o Cazaquistão, no leste. Atualmente, abriga cerca de 10 mil soldados. Com pistas longas e bem conservadas, permitea rápida decolagem de bombardeiros e caças, o que contribui com a rápida projeção de força dos Estados Unidos no Oriente Médio. Além dos EUA, o Catar investiu pesado na base e gastou mais de US$ 8 bilhões na modernização da infraestrutura. Al Udeid teve papel primordial nos ataques aéreos ao Iraque e ao Afeganistão, e em missões humanitárias, incluindo a retirada dos soldados americanos de Cabul, em 2021, depois da retomada do poder pela milícia islâmica Talibã.
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