TENSÃO NO ORIENTE MÉDIO

Versões divergem sobre danos a usinas iranianas após ataques dos EUA

Enquanto Donald Trump reafirma ter aniquilado a capacidade nuclear iraniana, chefe da AIEA estima que, em breve, a produção poderá ser retomada. Teerã externa "sérias dúvidas" a respeito da manutenção do cessar-fogo por parte de Israel

 (FILES) Director General of the International Atomic Energy Agency (IAEA) Rafael Grossi attends an extraordinary IAEA?s Board of Governors meeting at the agency's headquarters in Vienna, Austria on June 23, 2025. UN nuclear watchdog chief Rafael Grossi says Iran likely will be able to begin to produce enriched uranium
(FILES) Director General of the International Atomic Energy Agency (IAEA) Rafael Grossi attends an extraordinary IAEA?s Board of Governors meeting at the agency's headquarters in Vienna, Austria on June 23, 2025. UN nuclear watchdog chief Rafael Grossi says Iran likely will be able to begin to produce enriched uranium "in a matter of months," despite damage to several nuclear facilities from US and Israeli attacks, CBS News said Saturday. (Photo by Joe Klamar / AFP) - (crédito: AFP)

Nove dias após os ataques norte-americanos a instalações nucleares iranianas, a real extensão dos danos é uma incógnita. Se, de um lado, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, insiste ter aniquilado a capacidade de enriquecimento de urânio da República Islâmica, de outro, aumentam sinais do contrário. 

Num prognóstico que se choca frontalmente com a avaliação de Trump, o chefe da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), Rafael Grossi, estima que Teerã poderá retomar sua produção em "questão de meses". Proibido de entrar em território iraniano, o diplomata argentino reconheceu, em entrevista à CBS News, que o bombardeio dos EUA a três instalações nucleares iranianas causou danos graves, mas "não totais".

"As instalações que eles têm estão lá. Eu diria que, em questão de meses, ou até menos, algumas centrífugas podem voltar a enriquecer urânio", disse o chefe da AIEA, na entrevista divulgada na noite de sábado. Ele assinalou, ainda, que o Irã tem urânio enriquecido a 60% em estoque, o que poderia ser usado para fazer até 9 bombas nucleares se for processado até 90%.

"Não sabemos onde esse material pode estar", admitiu Grossi à CBS. "Uma parte pode ter sido destruída nos ataques, mas outra parte pode ter sido transferida. Portanto, em algum momento, tem que haver um esclarecimento", acrescentou.

Informações obtidas pelo The Washington Post também indicam que o baque pode não ter sido tão avassalador. Segundo o jornal norte-americano, comunicações iranianas interceptadas relativizaram o impacto dos ataques.  A Casa Branca rejeitou a reportagem. "O programa de armas nucleares deles acabou", asseverou a secretária de imprensa da Casa Branca, Karoline Leavitt, segundo o Post.

O próprio Donald Trump, em entrevista à Fox News, voltou a exaltar, ontem, o sucesso da operação, frisando que todas as plantas nucleares foram destruídas. O presidente acusou a CNN e o The New York Times de mentir por afirmarem que o dano teria sido menor.

Em meio às várias versões, a República Islâmica não dá detalhes da situação. O ministro das Relações Exteriores do Irã, Abbas Aragchi, disse que os estragos foram "significativos," mas pormenores são desconhecidos. Na semana passada, legisladores iranianos aprovaram a suspensão da cooperação com a AIEA, e Teerã rejeitou o pedido de Grossi para visitar as instalações, especialmente Fordo, a principal usina de enriquecimento.

Numa conversa por telefone, ontem, com o presidente do Irã, Masoud Pezeshkian, o líder francês, Emmanuel Macron, cobrou o "retorno à mesa de negociações para tratar das questões balísticas e nucleares". "É essencial manter o marco do Tratado de Não Proliferação Nuclear e retomar rapidamente os trabalhos da AIEA no Irã para garantir total transparência", afirmou.

Trégua frágil

Após 12 dias de guerra, Israel e Irã entram, hoje, no sétimo dia de uma trégua considerada frágil pelos envolvidos. "Não provocamos a guerra, mas respondemos ao agressor com todas as nossas forças", disse o chefe do Estado-Maior das forças armadas iranianas, Abdolrahim Musavi, referindo-se a Israel.

"Temos sérias dúvidas sobre o respeito de seus compromissos, inclusive o cessar-fogo, e estamos prontos para uma resposta contundente", acrescentou, em ligação telefônica com o ministro da Defesa saudita, o príncipe Khaled bin Salman, segundo a televisão iraniana.

Em carta dirigida ao secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, o governo iraniano pediu que a ONU reconheça que Israel e Estados Unidos foram os responsáveis pelo conflito. Segundo o Ministério da Saúde iraniano, pelo menos 627 pessoas morreram e aproximadamente 4.900 ficaram feridas no conflito. Os ataques em represália deixaram 28 mortos, de acordo com as autoridades israelenses.

 

Audiências judiciais suspensas

Um dia após o ultimato do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, a Justiça de Israel decidiu, ontem, alterar a tramitação do processo em que o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu é acusado de corrupção. O Tribunal de Jerusalém acolheu, parcialmente, o pedido da defesa do premiê e cancelou as audiências do julgamento programadas para ocorrer entre hoje e quarta-feira. 

O advogado Amit Hadad, representante de Netanyahu, solicitou na quinta-feira o adiamento de suas audiências devido aos "acontecimentos na região e no mundo", após a guerra com o Irã e o conflito em curso na Faixa de Gaza. Alegou no pedido que o premiê é "obrigado a dedicar todo o seu tempo e sua energia para a gestão de assuntos nacionais, diplomáticos e de segurança de extrema importância".

No sábado, Donald Trump declarou que não admitiria a continuidade do julgamento do líder israelense, que lhe agradeceu algumas horas depois. "Os Estados Unidos gastam bilhões de dólares por ano, muito mais do que qualquer outra nação, para proteger e apoiar Israel. Não vamos tolerar isso", declarou o chefe da Casa Branca, em sua plataforma Truth Social.

 "Netanyahu está agora no processo de negociar um acordo com o Hamas, que incluirá trazer os reféns de volta. Como é possível que o primeiro-ministro de Israel seja forçado a ficar em um tribunal o dia todo?", questionou o republicano. "Obrigado de novo", respondeu o premiê na rede social X. "Juntos, faremos o Oriente Médio grande novamente", acrescentou.

Em um dos processos, o premiê e sua esposa, Sara, são acusados de aceitar mais de US$ 260 mil (R$ 1,4 milhão, na cotação atual) em bens de luxo como charutos, joias e champanhe de milionários em troca de favores políticos. Em outras duas ações, ele é denunciado por tentar negociar uma cobertura mais favorável com dois meios de comunicação israelenses. 

 Gaza

Ontem, o premiê afirmou que a guerra contra o Irã criou "oportunidades" para libertar os reféns mantidos em cativeiro há 21 meses pelos extremistas do Hamas na Faixa de Gaza, onde testemunhas e a Defesa civil reportaram mais de 30 mortos no fim de semana.

A declarações de Benjamin Netanyahu aumentaram as expectativas de uma trégua no enclave palestino, depois que o presidente norte-americano, Donald Trump, expressou, na sexta-feira, a confiança de que um cessar-fogo seja acordado nos próximos dias. 

CB
postado em 30/06/2025 06:01
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