Guerra no Leste Europeu

Putin exige recuo militar da Ucrânia para cessar combates

Presidente russo promete aceitar plano de Trump e suspender ataques, mas condiciona trégua à entrega dos territórios reivindicados por Moscou. Especialistas veem falta de compromisso do Kremlin com um acordo

Moradores observam incêndio em prédio residencial, depois de ataque aéreo russo em Zaporizhzhia (sudeste), na terça-feira  -  (crédito: Darya Nazarova/AFP)
Moradores observam incêndio em prédio residencial, depois de ataque aéreo russo em Zaporizhzhia (sudeste), na terça-feira - (crédito: Darya Nazarova/AFP)

O presidente da Rússia, Vladimir Putin, sinalizou positivamente em relação ao plano de paz proposto pelo colega americano Donald Trump, mas condicionou o fim da guerra a um recuo das tropas da Ucrânia de regiões anexadas por Moscou. "Se as forças ucranianas se retirarem dos territórios que controlam, então cessaremos as operações de combate", declarou o líder do Kremlin, durante visita ao Quirguistão. "Se não o fizerem, então vamos alcançar com meios militares." O documento apresentado pela Casa Branca traz 28 pontos, entre eles, a cessão territorial de Donetsk e Luhansk (na região do Donbass, leste) e da Península da Crimeia para a Rússia. 

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Putin insistiu que a ofensiva russa "é praticamente impossível de deter, então há pouco a fazer diante disso". Atualmente, o Exército de Moscou controla um quinto do território da Ucrânia. Na próxima semana, Steve Witkoff, enviado especial de Trump, viajará à capital russa para tentar destravar o plano de paz em negociações com as autoridades do governo Putin. O chefe do Kremlin repetiu que o texto de Washington "pode servir de base para futuros acordos". Putin colocou em xeque a legitimidade de seu homólogo ucraniano, Volodymyr Zelensky, e considerou ser "quase impossível" a assinatura de um pacto neste momento. 

A guerra entre Rússia e Ucrânia provocou a morte de dezenas de milhares de pessoas e forçou milhões a deixarem suas casas, no pior conflito na Europa desde a Segunda Guerra Mundial. Pelo menos 20 mil crianças ucranianas teriam sido levadas pelo Exército russo.

De acordo com a cientista política ucraniana Kateryna Shtepa — especialista em Leste da Europa pelo Instituto Britânico de Assuntos Globais (em Kiev) —, Moscou exige que a Ucrânia devolva todos os territórios ocupados depois da invasão de 24 de fevereiro de 2002 e reconhece a Crimeia e o Donbass como regiões russas, as quais estavam ocupadas desde 2014. "O governo de Volodymyr Zelensky rejeita categoricamente qualquer concessão territorial", disse ao Correio. "Em essência, as negociações congelaram novamente. Nenhum dos lados está disposto a ceder um milímetro, enquanto a situação na linha de frente se deteriora a cada dia que passa."

Vladimir Putin, presidente da Rússia, fala à imprensa durante visita a Bishkent, no Quirguistão
Vladimir Putin, presidente da Rússia, fala à imprensa durante visita a Bishkent, no Quirguistão (foto: Alexey Nikolsky/AFP)

Professor de política comparada da Universidade Kyiv-Mohyla (em Kiev), Olexiy Haran lembrou que o Kremlin exige que as forças ucranianas se retirem de territórios não ocupados pela Rússia. "É algo realmente maluco. O que a Rússia diz é: 'Por favor, saia desse território, pois ele é meu'. Não me lembro de casos recentes em que um Estado alega ser dono de parte do território de outro Estado. Não há precedentes nas relações internacionais", afirmou à reportagem. "Isso significa que, nesse momento, a Rússia não está interessada em negociações reais", acrescentou, em alinhamento com Shtepa.

Haran descarta que Moscou deseje um cessar-fogo. "O que deveria vir primeiro: o cessar-fogo ou o acordo? O ponto número um deveria ser a trégua. Não acredito que a abordagem proposta pelos EUA seja a correta", advertiu. "Nós teremos alguma garantia de que, depois de concessões de nossa parte, a Rússia deterá a guerra? Isso não é algo sério." 

Segundo Kateryna Shtepa, a Rússia move-se pela ambição imperial e pela determinação de preservar a dominância. "Por sua vez, a Ucrânia é impulsionada pelo desejo ardente de recuperar suas terras, fazer justiça aos caídos e garantir uma paz duradoura", avaliou. Ela pensa ser "altamente improvável" que a Ucrânia aceite voluntariamente os termos da Rússia. "Resta apenas esperarmos por uma diplomacia americana construtiva e uma nova estrutura para a paz", concluiu. 

Turquia

Nesta quinta-feira (27/11), ao iniciar a sua primeira visita apostólica ao exterior, na Turquia, o papa Leão XIV instou o presidente Recep Tayyip Erdogan a desempenhar um papel "estabilizador" em um contexto mundial "fortemente conflituoso". "Senhor presidente, que a Turquia seja um fator de estabilidade e aproximação entre os povos, a serviço de uma paz justa e duradoura", declarou o pontífice, que elogiou o país como "uma ponte Oriente e Ocidente, entre Ásia e Europa e uma encruzilhada de culturas e religiões". A Turquia tem desempenhado papel importante nas negociações entre autoridades da Ucrânia e da Rússia. 

DUAS PERGUNTAS PARA...

OLEKSANDRA MATVIICHUK, presidente da ONG Centro para as Liberdades Civis (em Kiev) e ganhadora do Prêmio Nobel da Paz em 2022
OLEKSANDRA MATVIICHUK, presidente da ONG Centro para as Liberdades Civis (em Kiev) e ganhadora do Prêmio Nobel da Paz em 2022 (foto: Divulgação)

OLEKSANDRA MATVIICHUK, presidente da ONG Centro para as Liberdades Civis (em Kiev) e ganhadora do Prêmio Nobel da Paz em 2022

Qual é condição para a Ucrânia aceitar um plano de paz, na sua opinião?

Qualquer plano de paz deve responder à questão se é capaz de pôr fim à guerra. A Rússia lançou uma invasão em larga escala não para ocupar parte do território ucraniano. Ela o fez para ocupar toda a Ucrânia e ir além. Putin busca restaurar o Império Russo. Ele ainda não desistiu dessa meta. Então, o plano deve incluir garantias reais de segurança que a versão anterior do texto não continha. Então, o plano tem que ser melhorado. 

Trump disse que um acordo está muito perto. Como vê isso?

Não vejo que estamos ficando mais próximos da paz. Porque, na Ucrânia, não olhamos para palavras, mas para ações. Putin mentiu que não foi seus soldados que capturaram a Crimeia em 2014. Putin mentiu que não planejava uma guerra em larga escala em 2022. Agora, mente que deseja a paz. Ao mesmo tempo, centenas de drones e mísseis russos destróem cidades pacíficas na Ucrânia todos os dias. Essa é a realidade. Por isso, o Tribunal Penal Internacional chamou essas ações de crimes contra a humanidade e abriu um caso criminal contra autoridades russas. (RC)

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    Vladimir Putin, presidente da Rússia, fala à imprensa durante visita a Bishkent, no Quirguistão Foto: Alexey Nikolsky/AFP
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postado em 28/11/2025 05:50
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