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Brasil retoma protagonismo nas metas ambientais globais

O país deve se empenhar cada vez mais em fazer o dever de casa porque tem a responsabilidade de cuidar da maior biodiversidade e da maior floresta tropical do planeta

Os grandes mamíferos da floresta estão entre os principais atingidos -  (crédito: Daniel Rocha/UC Davis/Divulgação )
Os grandes mamíferos da floresta estão entre os principais atingidos - (crédito: Daniel Rocha/UC Davis/Divulgação )

Advertências da comunidade científica nunca faltaram, e as evidências estão cada vez mais claras, especialmente depois da tragédia climática no Rio Grande do Sul. Se as palavras do xamã Davi Kopenawa Yanomami poderiam parecer uma metáfora indígena, a queda do céu se concretizou e deixou como recado a previsão de mais eventos extremos, que já se repetem em todos os continentes. Porém, mesmo diante de recuos na política ambiental nos últimos anos, o Brasil retomou seu lugar de protagonista nas ações mundiais de proteção ambiental. E neste ano entrega mais uma tarefa com resultados extraordinários.

Em todos os biomas brasileiros, o Projeto Pró-Espécies — Todos contra a extinção alavancou iniciativas para reduzir ameaças a pelo menos 290 espécies categorizadas como criticamente em perigo, das quais 193 não contavam com nenhum instrumento de conservação. E foi além da previsão inicial de trabalhar em 9 milhões de hectares em 12 estados brasileiros, saltando, após detalhamento dos territórios, para 62 milhões de hectares. 

O Pró-Espécies nasceu em 2014 instituído pelo Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), intimamente entrosado numa rede de poderes públicos regionais, sub-regionais e comunidades locais cujo engajamento é essencial para o sucesso obtido. Os números são grandiosos em relação aos seres vivos em risco de extinção. Foram investidos R$ 62,5 milhões pelo Fundo Global para o Meio Ambiente (GEF) para a proteção de peixes amazônicos e marinhos, eglas (da família dos crustáceos) da Mata Atlântica, invertebrados terrestres e aquáticos, répteis, aves, mamíferos e muitas plantas. 

Na abrangência do projeto, foram feitas avaliações do estado de conservação de quase 15 mil espécies de fauna pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), com 128 oficinas realizadas, envolvendo 206 instituições e 1.046 cientistas. Também foram feitas mais de 4 mil avaliações do estado de conservação da flora pelo Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro (JBRJ). O JBRJ esteve ainda em 13 unidades de conservação, percorreu 25 mil quilômetros, em 10 estados. Na base de dados, foi utilizado o Conserva Flora, painel que disponibiliza informações sobre mais de 40 mil espécies e dados sobre 7,5 mil espécies da flora que foram avaliadas quanto ao estado de conservação. 

A iniciativa se antecipa a perdas alarmantes da biodiversidade no planeta, que, em 30 anos, pode chegar a 1 milhão de espécies da fauna e da flora. A estimativa é de estudos do Intergovernamental Biodiversity Science-Policy Plataform and Ecosystem Service (IPBES), da Organização das Nações Unidas (ONU), que reúne dados de 162 países sobre as ameaças à vida na Terra. Pior em relação ao Brasil, pois, tendo a maior biodiversidade do mundo, corre mais riscos. O país abriga cerca de 20% da fauna e da flora catalogada no mundo, com algo em torno de 150 mil espécies de seres vivos em biomas que vão do semidesértico de regiões da Caatinga à densa e úmida Floresta Amazônica, passando pelo Cerrado e Pampa, Pantanal e Mata Atlântica. 

O projeto salva vidas silvestres, redescobre e descreve novas espécies em habitats como regiões de campanha e serra no Rio Grande do Sul, veredas e campos gerais em Minas Gerais e Tocantins, cinturão verde de São Paulo, espinhaço (cordilheira) mineiro e o chamado Caminho das Tropas, entre o Paraná e São Paulo, roteiro que impactou a economia e foi fluxo migratório da região devido à produção aurífera no período colonial. Foram 225 expedições de campo no âmbito dos planos territoriais e pelo menos 10 novas espécies foram descritas ou redescobertas. Tudo foi possível graças ao envolvimento de mais de 500 instituições nas ações do Pró-Espécies. 

Entre as metas globais instituídas pela ONU com alcance nos resultados do Pró-Espécies, estão iniciativas para a conservação dos mares, restauração de ecossistemas, manejo sustentável de florestas e combate à desertificação. As metas nacionais incluem também o controle de espécies exóticas invasoras e o desenvolvimento sustentável da aquicultura e pesca. Têm ainda redução para impactos sobre a diversidade em obras de hidrelétricas, exploração de petróleo, gás natural e mineração. Presta também apoio a estados nas ações do Cadastro Ambiental Rural (CAR).

A vigilância do poder público e a ação da sociedade são os mecanismos mais eficazes para o cumprimento das metas globais e nacionais. E o Brasil deve se empenhar cada vez mais em fazer o dever de casa porque tem a responsabilidade de cuidar da maior biodiversidade e da maior floresta tropical do planeta. Não é tarefa fácil. Mas, no Dia Internacional da Biodiversidade, olhando os números do Pró-Espécies, não restam dúvidas de que temos muito o que comemorar. 

*Rita de Cássia Mesquita, Secretária Nacional de Biodiversidade, Florestas e Direitos Animais do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima

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postado em 22/05/2024 06:00
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