MEIO AMBIENTE

O fim da COP30 e a lição deixada pelo chanceler alemão

É evidente que Merz quebrou o protocolo diplomático ao ironizar a estada em Belém. Mas opiniões sobre cidades, como suas belezas, desconfortos ou limitações, fazem parte da experiência humana

Merz afirmou que todos ficaram
Merz afirmou que todos ficaram "contentes" por terem retornado à Alemanha: "Especialmente daquele lugar onde estávamos", disse em referência à Belém - (crédito: Odd Andersen/AFP)

A COP30, em Belém, devolveu ao Brasil um lugar central no debate climático global. Em meio a negociações complexas sobre o futuro dos combustíveis fósseis e o financiamento internacional, um episódio paralelo acabou ocupando parte desproporcional do debate público. Falo da declaração pouco diplomática do chanceler alemão Friedrich Merz sobre a experiência vivida na capital paraense.

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A reação imediata à declaração de Merz foi a esperada, com críticas políticas, voto de censura no Senado e manifestações de autoridades locais. Ainda assim, a opinião do alemão não deveria eclipsar o debate essencial e, sobretudo, revela mais sobre nossas fragilidades do que sobre a intenção de um político estrangeiro.

Belém tornou-se o palco de uma conferência decisiva para o planeta num momento em que o Brasil busca mostrar liderança climática. Nesse contexto, a cidade escolhida simbolicamente para sediar o encontro, no coração da Amazônia, deveria reforçar a importância estratégica da região. Em vez disso, parte das atenções desviou-se para um comentário que, ainda que deselegante, caberia a qualquer visitante em circunstâncias pessoais, não fosse a posição pública de quem o proferiu.

É evidente que Merz quebrou o protocolo diplomático ao ironizar a estada em Belém. Mas opiniões sobre cidades, como suas belezas, desconfortos ou limitações, fazem parte da experiência humana. Assim como nós manifestamos preferências por capitais brasileiras, europeias ou americanas, o chanceler expressou a dele, ainda que de forma infeliz. Se ele considera a Alemanha mais bonita que o Brasil, é um direito dele. E cabe a nós respeitar.

O ponto incômodo é que a crítica encontra amparo na realidade. Belém figura entre as capitais com maior índice de favelização do país, enfrenta deficiência crônica de infraestrutura, saneamento e segurança; e, durante a COP, viu emergir relatos de falhas logísticas que não condizem com um evento dessa escala. As diárias superfaturadas da rede hoteleira, por exemplo, afastaram delegações estrangeiras, assim como o alto custo das passagens aéreas.

Por sua vez, a resposta brasileira, entre a defesa bem-humorada de Lula e a reação indignada de autoridades locais, expõe também nossa dificuldade em lidar com críticas externas, especialmente quando tocam em feridas urbanas e sociais ainda abertas. Mais útil seria encarar o episódio como um convite a reflexões honestas. Se queremos que Belém represente a Amazônia em sua potência e diversidade, é preciso garantir que a capital esteja à altura do papel que lhe atribuímos.

O episódio Merz nos lembra que estar no centro do mundo implica aceitar escrutínio, inclusive sobre nossa capacidade de oferecer condições adequadas a quem nos visita e, sobretudo, a quem vive aqui. Fica a lição para os próximos eventos internacionais que o Brasil pretende sediar. Como enfatizava a minha vó Edith: "A casa precisa estar arrumada para receber visitas."

 

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postado em 21/11/2025 06:00
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