
José Pastore — professor (aposentado) da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo, presidente do Conselho de Emprego e Relações do Trabalho da Fecomércio-SP e membro da Academia Paulista de Letras
Em artigo publicado, em 30/11/2025, no Estadão ("O problema fiscal não para de crescer"), José Roberto Mendonça de Barros se indignou, com razão, com a espantosa facilidade com que o Senado Federal aprovou um aumento de 25% para o orçamento do Poder Judiciário e o montante de R$ 10 bilhões para as aposentadorias especiais dos agentes comunitários da saúde. Além disso, o Poder Executivo se prepara para avalizar um empréstimo de R$ 20 bilhões para os Correios. Ou seja, numa só semana, os Três Poderes aumentaram o endividamento público, sem nenhum constrangimento.
Isso se repete a cada semana. Motivados pelo populismo e de olho na sua reeleição, os políticos não resistem a tentação de aprovar benesses que atendem os seus eleitores, mas, desequilibram as contas públicas.
- Leia também: Olhos abertos para os riscos do rage bait
O populismo é uma doença presente em muitos países. A sua regularidade é impressionante. Durante as campanhas eleitorais, os candidatos prometem o que não podem entregar. Uma vez eleitos, verificam não haver recursos para honrar o que prometeram. Incontinenti, partem para programas assistenciais - muitos deles meritórios — que arrombam as contas públicas e inibem investimentos para tocar um crescimento econômico sustentável.
Tome o caso atual. Em 2019, o governo brasileiro investiu cerca de R$ 90 bilhões para os principais programas assistenciais (Bolsa Família, BPC, Auxílio Gás, Minha Casa Minha Vida, Brasil Quilombola e outros). Neste ano, esses recursos saltaram para mais de R$ 285 bilhões. Milhões de eleitores e seus familiares vivem deles, total ou parcialmente. Em 13 estados, há mais beneficiários desses programas do que assalariados.
Com isso, entra governo, sai governo, e a dívida pública só aumenta, propelida por essas ajudas e pela pornográfica taxa de juros que reflete, em grande parte, o agravamento da própria situação fiscal.
- Leia também: Popular e sofisticada
A preocupação central dos governantes, com raras exceções, é a de agradar os eleitores e garantir a sua própria reeleição. Por isso, vejo com muita esperança a possibilidade de acabarmos com a regra da reeleição para os cargos executivos.
Já escrevi sobre isso neste mesmo espaço ("É preciso acabar com a reeleição", Correio Braziliense, 28/04/2025). Volto ao tema porque na semana passada a Comissão de Constituição e Justiça do Senado Federal aprovou a Emenda 12/2022 que põe fim a essa perniciosa regra para os ocupantes de cargos do Poder Executivo — presidente da República, governadores e prefeitos. A proposta preserva os direitos dos dirigentes atuais, mas acaba com a reeleição a partir de 2031.
Vejo essa medida como das mais urgentes para, pelo menos, diminuir drasticamente a captura dos recursos públicos pela esperteza de políticos que não se importam com os prejuízos que causam ao país ao aprovar gastos com base no seu oportunismo eleitoral.
Não me iludo com o poder dessa mudança. O fim da farra fiscal não virá como um passe de mágica. Mas o fim da reeleição reduzirá drasticamente o ímpeto de arrombar os cofres públicos para garantir novos mandatos.
A regra da reeleição foi introduzida pela Emenda Constitucional 16, de 1997. São quase 30 anos que foram marcados por distorções e irresponsabilidades no uso dos recursos públicos praticadas por governantes que, recém-eleitos, começam imediatamente a agir em favor da sua reeleição. Parece ser essa a única fórmula que conhecem para cuidar da sua popularidade.
Michel Temer costuma lembrar que, ao assumir a presidência foi, repetidas vezes, lembrado pelos que diziam: "Presidente, aproveite a sua impopularidade e faça as reformas que podem colocar o Brasil no rumo do crescimento sustentável". Foi assim que promoveu o teto de gastos, a reforma trabalhista, a disciplina para a administração das empresas estatais e a reforma do ensino médio. Tudo porque era impopular e não pretendia se candidatar a presidente.
Itamar Franco, igualmente, fez um governo austero ao promover importantes medidas de controle da inflação e das contas públicas, a começar pela aprovação do Plano Real.
Ou seja, nenhum dos dois foi eleito presidente. Eram vice-presidentes. E não pretenderam se reeleger no cargo que ocuparam.
Além da redução de políticas onerosas e populistas, o fim da reeleição introduzirá regras mais democráticas para as disputas eleitorais pois, como se sabe, o governante incumbente sempre leva vantagem sobre os seus opositores pelo fato de usar a máquina pública. Com frequência, os candidatos à reeleição são marcados pela imagem da intimidação — quando os eleitores temem perder as proteções no caso de derrota do governante.
Por isso tudo, estou vendo com bons olhos — e muito esperançoso - para que o Congresso Nacional aprove o fim da reeleição até o final de 2025. É impossível? Não. As duas casas deram mostras que, quando querem, podem aprovar uma Emenda Constitucional em poucos dias.
Saiba Mais
Vinícius Pinheiro — diretor do Escritório da Organização Internacional do Trabalho (OIT) para o Brasil

Opinião
Opinião
Opinião