Congresso

CPI do MST: depoente se dirige à câmera em conversa "com o Brasil"

Elivaldo da Silva Costa presta depoimento à comissão que investiga supostos crimes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) nesta terça-feira (8/8)

Mayara Souto
postado em 08/08/2023 16:50 / atualizado em 08/08/2023 21:42
Elivaldo da Silva Costa, presidente do Projeto de Assentamento Rosa do Prado -  (crédito: TV Câmara/Reprodução)
Elivaldo da Silva Costa, presidente do Projeto de Assentamento Rosa do Prado - (crédito: TV Câmara/Reprodução)

A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que apura os atos do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) ouve na tarde desta terça-feira (8/8) três ex-participantes de acampamentos do movimento. O primeiro depoente é Elivaldo da Silva Costa, presidente do Projeto de Assentamento Rosa do Prado e ex-membro do movimento social. Com exibição de vídeo, discurso direcionado ao público e conversa ‘com o Brasil’, depoimento teve ares de apresentação artística.

Elivaldo, também conhecido como Liva do Rosa, ex-candidato a deputado estadual da Bahia pelo Partido Progressista (PP), iniciou o depoimento falando que o MST tem “metodologia para captar pessoas na zona urbana” e que há uma “falsa promessa de eles vão dar a terra”. Ele teria sido “convencido” a participar do MST há mais de 10 anos. 

O relator da CPI, Ricardo Salles (PL-SP), perguntou ao depoente qual seria então o perfil dessas pessoas e o Liva respondeu que “não importa, não tem critério”, e que se tratava de uma “doutrinação”.

Ao descrever lutas por terra, Elivaldo falou todo o tempo em “invasões”. De acordo com ele, os assentados seriam “utilizados como instrumento para pressão”, recebiam motivos diferentes do que seria o real propósito, e eram forçados a participar dos embates. No entanto, deixou escapar que, quando participava do movimento, eles teriam “ocupado a Câmara” — “ocupação” é o termo utilizado pelas lideranças do MST para nomear as lutas por terra.

"Brasil todo"

Durante o tempo todo em que falava, Elivaldo dirigia-se ao público, em alguns momentos, inclusive, a quem acompanhava a comissão pela internet, chamando pelo “Brasil todo”. Com direito a dois vídeos, o homem parecia muito confortável e articulava como um artista em seu próprio show. Em alguns momentos, no entanto, ele demonstrava raiva com as risadas dos parlamentares sobre algumas colocações.

Entre os momentos que deixaram o depoente descontente esteve a reação dos parlamentares à fala de que o “MST é o maior latifundiário desse país”. De acordo com ele, o próprio movimento impediria a regularização das terras. Após isso, Elivaldo exibiu um documento que comprovaria a posse do lote em que mora, emitido pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). O deputado Nilto Tatto (PT-SP) chegou a pedir para pausar o depoimento alegando que o que ele mostrava era falso.

Ainda nesta tarde prestarão depoimento a ex-participante do Acampamento São João, Vanuza dos Santos de Souza, e o ex-participante do Acampamento Egídio Bruneto, Benevaldo da Silva Gomes.

MST se pronuncia sobre ações atribuídas ao movimento na CPI

Após o término da CPI, o MST emitiu uma nota rebatendo todas acusações feitas ao movimento durante a sessão desta terça-feira. Leia abaixo trechos:

"Em pauta, uma série de acusações infundadas que, além de evidenciarem o ataque sistemático à luta pela terra naquela Comissão, também trazem à tona a articulação do bolsonarismo em áreas rurais.

A principal figura usada para atacar a luta pela terra foi Elivaldo da Silva Costa, conhecido como Liva do Rosa do Prado. Liva é militante bolsonarista e foi candidato a deputado estadual nas últimas eleições apoiando o ex-presidente Bolsonaro. Morando no assentamento Rosa do Prado, conquistado a partir da luta do MST, Liva é parte de um grupo que, desde 2020, utiliza de métodos violentos para ameaçar e aterrorizar famílias da região.

Tal grupo, durante a gestão Bolsonaro, valia-se da promessa de titulação dos lotes nos assentamentos para cooptar famílias e tensionar a relação delas com o MST. No entanto, em todo o estado da Bahia, a gestão Bolsonaro entregou somente 400 títulos definitivos.

Ao longo da tarde, diversos ataques ao MST e à luta pela terra foram proferidos: ameaças de morte, extorsão, lesão corporal, etc. No entanto, em nenhum deles foi apresentado algum tipo de comprovação dos fatos e das autorias. Nenhum boletim de ocorrência, inquérito ou processo criminal foi entregue à Comissão.

Contra os militantes do MST atacados, não corre nenhum inquérito ou processo criminal. Inclusive, estes já ingressaram com denúncia junto à Polícia Civil da Bahia pelos crimes de calúnia e difamação praticados durante a sessão. Os ataques de invasão à domicílio apresentados na sessão desta terça-feira foram denunciados à época pelo próprio Movimento Sem Terra, o qual exigiu investigação e elucidação dos crimes praticados.

O MST reafirma seu compromisso na luta de quase 40 anos pela terra e pela Reforma Agrária. É a luta realizada pelas famílias Sem Terra em todo país, que garantiram o assentamento de mais de 450 mil famílias em 24 estados.

A organização do MST na Bahia permitiu o assentamento de 13 mil famílias, em 168 assentamentos, presentes em 121 municípios. Estas conquistas sintetizadas em números permitem hoje a organização de 15 cadeias produtivas principais, entre elas, arroz, café, frutas, cacau, leite e mandioca. Na pandemia, as famílias Sem Terra do estado doaram 342 toneladas de alimentos e mais de mil litros de leite à população baiana mais carente.
[...]

O MST lamenta o baixo nível e a falta de legitimidade desta CPI, que é usada por setores do agronegócio e da extrema direita para atacar a legitimidade da luta pela terra e a moral das famílias Sem Terra. Usar a Comissão como palco para agitar sua base social e deslegitimar a luta pela terra, na tentativa de encontrar um caminho para a criminalização da Reforma Agrária é um desserviço à sociedade brasileira".

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