
Depois de um jejum eleitoral que vem desde junho de 2017, quando ocorreu o último Processo de Eleição Direta dentro do partido, os petistas foram às urnas, ontem, escolher seu futuro presidente, divididos sobre o melhor caminho para garantir a reeleição de Lula, em 2026. O resultado ainda não foi anunciado devido à judicialização do pleito do diretório de Minas Gerais.
Os setores mais à esquerda da legenda afirmam que o retorno às bases e aos movimentos sociais, temperado com o discurso de justiça social e tributária, serão suficientes para garantir uma vitória no ano que vem. Uma outra parcela é convencida de que, sem uma ampla aliança que engloba os partidos de Centro, as chances de sucesso são remotas. E é com esse pano de fundo que o futuro presidente do partido terá que lidar até o ano que vem.
Ciente das dificuldades que terá pela frente, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva jogou todo o seu prestígio político interno para garantir o favoritismo de Edinho Silva, ex-prefeito de Araraquara, que, conforme asseguram muitos petistas, só não teve seu nome anunciado ontem ainda como futuro presidente do Partido dos Trabalhadores por causa do adiamento da eleição em MG, por decisão judicial. Se o candidato puder prescindir dos votos de Minas para a vitória, haverá um anúncio nesta segunda-feira para que o eleito tenha condições de começar a organizar os próximos passos.
O primeiro deles irá unir o próprio PT. A disputa interna continua ferrenha e o caso de Minas Gerais é visto internamente como um exemplo disso. O adiamento da eleição por lá foi fruto da impossibilidade de o partido refazer as cédulas, a fim de cumprir a decisão judicial que, por liminar, garantiu a candidatura da deputada Dandara Tonantzin a presidente regional. A candidatura tinha sido impugnada pela sigla, por estar "inadimplente com contribuições partidárias".
Na Justiça, um deputado justificou que o problema foi da instituição bancária. Não houve tempo hábil para colocar o nome dela na cédula, a legenda decidiu adiar a eleição mineira. Dandara, do grupo Resistência Socialista, tem o apoio inclusive, de petistas ilustres, como o deputado Reginaldo Lopes, que gravou um vídeo falando que a apoiaria. O grupo que apoia a parlamentar acusou a tesoureira nacional do PT, Gleide, de agir para que a deputada não se candidatasse. A nova data será definida nesta terça-feira.
Se dentro do PT há problemas, fora do partido é pior. No MDB, por exemplo, uma ala formada pelos senadores Renan Calheiros e Jader Barbalho, Veneziano Vital, tenta puxar o partido para o projeto Lula 4. Mas, os emedebistas gaúchos preferem apostar numa alternativa ao centro. Em São Paulo, o MDB está cada vez mais próximo do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos). O PSD, de Gilberto Kassab, também é hoje próximo de Tarcísio. O governador, aliás, é do partido de Hugo Motta (Republicanos-PB).
PT no DF
Se no PT nacional o futuro presidente terá que reaglutinar as forças de esquerda e de centro, no diretório do Distrito Federal, metade do caminho está feito. Até o fechamento desta edição, o resultado oficial ainda não havia sido anunciado, mas a aposta de muitos petistas era a eleição Guilherme Sigmaringa Seixas, filho do ex-deputado Sigmaringa Seixas, ainda no primeiro turno.
Ele teve sua candidatura fruto de uma engenharia política que uniu as várias alas partidárias a fim de buscar uma renovação geracional. Ontem foi um dia movimentado na sede do PT-DF, no Conic. Com as eleições, que decidirão uma nova liderança do partido na capital e no país, o prédio foi movimentado durante o domingo inteiro com figuras que compõem o grupo há décadas.
Apenas no Plano Piloto, foram mais de 3,8 mil filiados aptos à votação, entre outros que vieram de outros estados para a eleição, como o ex-distrital Chico Floresta, que hoje mora em Salvador. "É importante estar presente neste momento decisivo para o partido. Acredito que estaremos unidos para o ano que vem", afirmou o ex-parlamentar.
A votação não é obrigatória, mesmo assim alguns filiados fazem questão de nunca perder uma sequer, como o funcionário público Francisco Machado, de 70 anos. "Eu sempre gosto de dizer, democracia não é só votar, é direito ao trabalho, direito a isso, direito ao salário. Não pode haver democracia em um país como o nosso, com tanta gente passando fome, então tem que superar isso", disse Francisco. "Eu acho que o PT tem batalhado, inclusive, para eliminar a miséria do país, para abrir, inclusive, mais espaço de trabalho. Eu acho que eles são passos concretos da democracia também", completou.
Muitos concorrentes mais jovens também marcaram presença nas zonas eleitorais, como o empreendedor Cleber de Sousa Ramos, 45, que também celebrou a participação. "Não é a primeira vez que venho, mas desta vez tudo está mais organizado. Temos a oportunidade de dialogar com os candidatos, ouvir as propostas e participar ativamente. Isso é maravilhoso", enfatizou.
Para o presidente do partido no Plano Piloto, José Wilson, essa eleição é ainda mais importante, acontecendo no ano que vem, que decidirá a presidência do país. "Podemos eleger uma direção que pode dar um novo rumo no partido, que pode trazer novas ideias, sem falar para o processo democrático", pontuou.
"O PT já tem experiência, participa de todas as eleições dele. De 89, ganhou cinco eleições, esteve no segundo turno das demais eleições, é, certo com Fernando Henrique que ganhou no primeiro turno, nós fomos para o segundo turno em todas as eleições. Então o PT tem uma organização nacional, tem uma representação e uma legitimidade nacional conferida pelo povo brasileiro. Para o ano que vem esse processo tende a se continuar com uma nova direção", refletiu.
Pleito sem resultado
O anúncio do nome que comandará o Partido dos Trabalhadores pelos próximos quatro anos sofreu atraso depois de uma decisão judicial que adiou a votação no diretório estadual de Minas Gerais. A Justiça do Distrito Federal determinou, no sábado, a inclusão da deputada federal Dandara Tonantzin (MG) na disputa. A parlamentar recorreu após ser impedida de concorrer pela sigla, que alegou falta de pagamento de contribuições partidárias dentro dos prazos.
Com a decisão, o PT anunciou o adiamento no dia da votação, pois, segundo a sigla, seria impossível inserir o nome dela nas cédulas já produzidas — a eleição é por meio do voto impresso. "O adiamento cumpre decisão judicial de garantir igualdade de condições aos candidatos, sem prejuízo da defesa do Diretório Nacional no processo em referência que demonstrará a plena regularidade de todas as decisões tomadas pelas instâncias internas do partido", disse a agremiação.
Segundo o presidente interino da sigla, o senador Humberto Costa (SP), a apuração dos votos nos demais estados deve ser concluída hoje. O parlamentar também marcou uma reunião do diretório nacional do partido para amanhã, com o objetivo de definir quando será a votação em Minas Gerais e discutir sobre a judicialização por parte de filiados contra decisões do partido. Ele não descartou a possibilidade de punição.
"Esse processo de judicialização de decisões partidárias é uma coisa, no meu ponto de vista, completamente inaceitável. No passado, sempre que isso aconteceu, o partido foi muito firme em relação a essas pessoas. Tivemos comissão de ética em alguns casos, resultado de comissão de ética. Mas não vou me antecipar, terça-feira essa discussão pode ser feita", disse Humberto Costa, que detalhou que o papel da Justiça interferir em questões internas de qualquer legenda. "O nosso partido tem primeiro a autonomia política e administrativa que é concedida pela legislação eleitoral. Segundo, na nossa visão, as decisões do partido devem ser tomadas no âmbito do partido e o que for decidido deve ser cumprido por todos. Além do mais, a decisão que foi tomada pelo diretório nacional foi por uma larga margem, então eu entendo que foi uma posição equivocada, errada", apontou o senador.
Saída de Gleisi
Apesar da indefinição, a última presidente eleita do PT, Gleisi Hoffmann, atual ministra da Secretaria de Relações Institucionais, disse ter orgulho da sigla e comemorou a mobilização da militância para votar no domingo. "Tenho muito orgulho desse partido, que presidi por oito anos junto com companheiros e companheiras combativos(as), enfrentando adversidades e também colhendo vitórias. O PT é um dos maiores partidos do Brasil e da América Latina. Um partido vivo, que debate seus rumos e fortalece a democracia brasileira", disse por meio das redes sociais.
Ao longo do dia, vários nomes de peso do PT votaram nas eleições. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi às urnas pela manhã, no Rio de Janeiro, onde participa da reunião da 17ª Cúpula do Brics. O ministro Fernando Haddad também votou na cidade. A ministra Gleisi Hoffmann votou no Paraná.
O ex-prefeito de Araraquara Edinho Silva, é o favorito na disputa. Ele é apoiado por Lula e representa a corrente Construindo um Novo Brasil (CNB). Seu principal oponente é o deputado Rui Falcão (SP), que antecedeu Gleisi Hoffmann no cargo, e presidiu o partido de 2011 a 2017. A disputa tem também o historiador Valter Pomar, que representa o setor mais ideológico da legenda, a corrente Articulação de Esquerda; e Romênio Pereira, que representa o Movimento PT — e é visto como um nome conciliador. (IM)
Saiba Mais
Denise Rothenburg
ColunistaJornalista, formada pela UnB. Trabalhou na Folha de S.Paulo e em O GLOBO. Há 25 anos integra a equipe do Correio Braziliense. É comentarista da TV Rede Vida
Política
Política
Política