
O voto do ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ação penal da trama golpista, serviu para aprofundar a polarização política e social. Se, de um lado, agradou aos advogados dos réus e foi exaltado pelos bolsonaristas, no Congresso e nas redes sociais, de outro mereceu críticas nos bastidores do STF e levou os governistas a enfatizarem que tal divergência desmonta a narrativa da extrema-direita de que há uma "ditadura da toga" no país.
Para Celso Vilardi, que coordena a defesa de Jair Bolsonaro — absolvido pelo ministro de todas as acusações —, Fux "lavou a alma", pois, segundo ele, trata-se de uma vitória processual. "O voto acolheu, na íntegra, a tese da defesa. Foi absolutamente técnico e analisou as provas de maneira exaustiva", explicou.
O advogado destacou o reconhecimento, no voto, da dificuldade de acesso às provas. "Fiquei feliz porque o ministro tratou o acesso a documentos como fundamental, algo já pacificado pela jurisprudência do STF", observou, reiterando que Bolsonaro não participou da trama golpista. "Se prevalecer a tese da denúncia, seriam meros atos preparatórios, sem caráter de execução", sustentou.
Na visão de Paulo da Cunha Bueno, outro advogado de Bolsonaro, o voto de Fux "entra para a história". "Faz jus à reputação do ministro — um ministro de carreira, professor titular. É um voto comprometido, só e tão somente, com a boa técnica jurídica", afirmou, ao sair do STF, antes mesmo do término da leitura de Fux.
Os advogados do tenente-coronel Mauro Cid definiram a manifestação do ministro — que condenou o militar apenas por tentativa de abolição violenta do Estado de Direito — como "muito além das expectativas". Isso porque trabalhavam com a hipótese de que o ministro condenaria todos os réus, mas pediria penas mais baixas que as dos demais integrantes da Primeira Turma.
José Luís Oliveira, que representa o general Walter Braga Netto — condenado somente por tentativa de abolição violenta do Estado de Direito —, salientou que o voto de Fux chama a atenção para "uma questão fundamental, que é a incompetência do STF, ou da Primeira Turma, para julgar este processo. Isso macula o voto". O defensor advertiu, ainda, sobre o suposto cerceamento de defesa observado pelo ministro.
"Disse isso da tribuna: não tivemos acesso integral aos autos. Recebemos cópia em junho e, depois, em julho, o que torna impossível garantir plenamente o direito de defesa. Mas precisamos aguardar até o fim. Um voto isolado tem impacto reduzido, pode mexer na questão da pena, mas não define o quadro. Isso aqui não é uma prova de 100 metros, é uma maratona. Hoje está sol, amanhã pode chover", desconfia.
Já o advogado Matheus Milanez, que representa o general da reserva Augusto Heleno — absolvido por Fux de todas as acusações —, afirmou que a decisão fortalece a tese da incompetência do STF e do cerceamento de defesa. "Pela literalidade da Constituição, terminado o mandato (executivo ou legislativo), a competência desce para o primeiro grau. Vamos ver como os demais ministros se posicionam", avaliou, acrescentando que, se reconhecida menor participação na trama, Heleno teria direito a redução de pena.
Comemoração
Nas redes sociais, os bolsonaristas comemoraram o voto de Fux. O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) publicou que o ministro "nada mais está fazendo do que sendo juiz! Ao falar o óbvio, choca a assessoria de imprensa de Lula, que entende que os fins justificam os meios: se é contra Bolsonaro, vale tudo, inclusive torturar a lei e a Constituição. Fux honra a toga", publicou no X (antigo Twitter).
O deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) também repercutiu a decisão: "O Supremo Tribunal não é competente para julgar o caso. Não foi assegurado o direito à ampla defesa. Não há provas de que os vândalos tenham agido sob ordem ou orientação direta do ex-presidente", postou, igualmente, no X.
Quem também se manifestou foi o relator da CPMI do INSS, o deputado bolsonarista Alfredo Gaspar (União Brasil-AL), sobre a decisão de Fux em suspender a ação penal contra o deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ): "O ministro acolheu a minha tese, defendida em abril, quando atuei como relator do pedido de sustação da ação penal contra o deputado Delegado Ramagem", publicou o parlamentar, que é ex-promotor de Justiça.
Na Câmara dos Deputados, os bolsonaristas exultaram com Fux. A deputada Bia Kicis (PL-DF) classificou a posição do ministro como a de um "juiz imparcial". "O voto do ministro desmontou todo o teatrinho criado e protagonizado pelo Alexandre de Moraes e acompanhado pelo ministro (Flávio) Dino. Eles odeiam o Bolsonaro", festejou.
O deputado Cabo Gilberto (PL-PB) também exaltou a manifestação do magistrado. Segundo ele, a decisão reafirma os limites constitucionais do Supremo. "Fux foi muito sábio, honrou a toga. Não é porque beneficia o Bolsonaro, mas porque defende a Constituição e o devido processo legal", frisou.
Sem alterações
Entre os governistas, porém, prevaleceu o entendimento de que a divergência de Fux não altera a gravidade das acusações. A deputada Erika Kokay (PT-DF) disse que a tentativa de golpe de Estado precisa ser punida com rigor. A deputada Maria do Rosário (PT-RS) também reforçou a necessidade de responsabilização, mas ponderou que a divergência confirma a lisura do processo. "A discordância do ministro era previsível. Só comprova, inclusive para aqueles que estão atacando o Brasil, que o julgamento é livre, justo e houve direito de defesa", afirmou, citando o presidente norte-americano Donald Trump, que disse várias vezes que o processo da trama golpista é uma perseguição a Bolsonaro.
Para o deputado Rogério Correia (PT-MG), que acompanhou o julgamento no STF, a divergência de Fux confirma que o julgamento é justo. "A dissonância com o voto do relator mostra que houve pleno direito de defesa", observou, acrescentando que o voto divergente, por enquanto, não impacta o objetivo de condenar Bolsonaro por tentativa de golpe de Estado.
O deputado Ivan Valente (PSol-SP) classificou a manifestação de Fux de "cínica" e "contraditória". Na visão do líder do PT na Câmara, Lindbergh Farias (RJ), a longa manifestação do ministro é "decepcionante" e perigosa para a democracia.
"É um voto que não se sustenta diante das provas e que acaba alimentando a narrativa dos bolsonaristas de que não houve golpe. Ele desrespeita os colegas do Supremo e a própria democracia brasileira", salientou, acrescentando que a decisão do ministro apenas serve para dar fôlego à extrema-direita.
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Alícia Bernardes
Alícia Bernardes é graduanda de Jornalismo e Comércio Exterior pela UDF. Integrante da Women Inside Trade (WIT), iniciativa que promove a participação feminina no comércio internacional, já estagiou no Poder360, atuando na produção das newsletters do jorn
Wal Lima
Repórter de PolíticaJornalista com mais de 10 anos de experiência, com especialização em Marketing Político Digital. Além da experiência em redação e portais, já atuei como assessora de comunicação de parlamentares na Câmara dos Deputados. Tenho o jornalismo como uma missão
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