PRISÃO PREVENTIVA

O que é prisão domiciliar humanitária e quando ela pode ser concedida

A prisão domiciliar humanitária é uma medida excepcional que permite que um preso cumpra a pena ou a custódia em casa quando apresenta condições graves de saúde

Após ser preso no sábado (22/11), a defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro pediu que a prisão preventiva seja convertida em prisão domiciliar humanitária, alegando agravamento do estado de saúde e impossibilidade de permanência na carceragem da Polícia Federal. O tema gerou dúvidas e acendeu um debate que envolve saúde, direitos humanos e limites legais impostos pela Lei de Execução Penal (LEP) e pelo Código de Processo Penal (CPP).

A prisão domiciliar humanitária é uma medida excepcional que permite que um preso (provisório ou condenado) cumpra a pena ou a custódia em casa quando apresenta condições graves de saúde que não podem ser tratadas adequadamente dentro do sistema prisional.

Ela é prevista de forma expressa no art. 318, II, do Código de Processo Penal (para presos preventivos) e é aplicada de forma mais restrita para condenados em regime fechado, com base em jurisprudência, e não em regra geral da lei.

A lógica é a de que, se o Estado assume a custódia da pessoa presa, ele também assume o dever de garantir tratamento de saúde adequado. Quando isso se mostra inviável, seja por risco de morte, incapacidade de deslocamento, tratamentos contínuos e complexos ou deterioração grave de condições clínicas, os tribunais concedem a domiciliar por razões humanitárias.

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A medida costuma ser concedida em três cenários principais: doenças graves incuráveis ou que exigem tratamento contínuo fora do sistema prisional; quadros psiquiátricos agudos, como surtos psicóticos com risco à integridade; ou condições físicas que impedem locomoção ou autocuidado, como pacientes acamados ou em cuidados paliativos

No caso de condenados em regime fechado, a exigência é ainda maior: é preciso demonstrar a impossibilidade real de atendimento dentro da unidade prisional.

Em entrevista ao Correio, o professor de Direito Constitucional Francisco Braga, afirmou que o pedido enfrenta barreiras desde a origem. “Tendo conhecimento prévio sobre as condições de saúde de Jair Bolsonaro, o Ministro Alexandre de Moraes, na própria decisão que decretou a prisão, já determinou que deve haver atendimento médico à disposição do ex-Presidente”.

Ou seja, o juiz já previu atendimento contínuo, o que reduz a justificativa para a domiciliar. Outro ponto crítico é que a prisão preventiva decorre justamente da violação das medidas cautelares, incluindo a prisão domiciliar imposta anteriormente.

“A atual prisão preventiva de Bolsonaro é uma consequência de ele ter violado as medidas cautelares anteriormente impostas, dentre elas, a prisão domiciliar. Por isso, é pouco provável que a prisão preventiva seja convertida em domiciliar como se nada tivesse ocorrido, a menos que um exame pericial demonstre que houve realmente um surto psicótico”, explica o professor.

Sendo assim, para obter o aval do relator a favor da prisão domiciliar humanitária, a defesa terá de comprovar uma mudança concreta no quadro clínico, por meio de perícia oficial. Sem isso, não há base legal para rever a decisão.

Bolsonaro já foi condenado criminalmente e, segundo Braga, iniciará o cumprimento da pena em regime fechado, o mais restritivo. Nesse estágio, a legislação é ainda mais rígida.

“Ele foi condenado a cumprir pena inicialmente em regime fechado, para o qual a Lei de Execução Penal não admite a substituição da prisão por prisão domiciliar. Somente em situações excepcionais, em que comprovada a impossibilidade de atendimento médico na unidade prisional, é que a jurisprudência tem admitido a prisão domiciliar quando o condenado cumpre pena em regime fechado”, diz Braga.

Mesmo após o fim da preventiva, a domiciliar não está descartada, mas terá de ser plenamente comprovada, e pode ser rediscutida diversas vezes ao longo da execução penal. A defesa insiste que o ex-presidente apresenta quadro clínico grave, mas a concessão depende de exame pericial oficial; avaliação da capacidade de atendimento da Polícia Federal; e análise do relator no Supremo Tribunal Federal.

Embora o pedido seja juridicamente possível, especialistas apontam que o histórico de descumprimento das medidas e a previsão prévia de atendimento médico tornam a conversão pouco provável neste momento, a não ser que uma perícia comprove agravamento significativo.

 

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