JUSTIÇA

Ex-patrões viram réus por submeter idosa a trabalho análogo à escravidão

Maria de Moura foi resgatada no ano passado após trabalhar sem salário por 72 anos para uma família do Rio de Janeiro

Idosa passou 72 anos trabalhando sem salário. Esse é o caso mais longo de trabalho análogo ao escravo -  (crédito: Kleber Sales/CB/D.A Press)
Idosa passou 72 anos trabalhando sem salário. Esse é o caso mais longo de trabalho análogo ao escravo - (crédito: Kleber Sales/CB/D.A Press)
postado em 11/03/2024 10:59 / atualizado em 11/03/2024 11:27

Os patrões de uma idosa de 87 anos viraram réus na Justiça sob acusação de trabalho análogo à escravidão após submeteram a empregada doméstica a trabalhar sem salário por 72 anos. Maria de Moura foi resgatada em março de 2022 no Rio de Janeiro. Segundo o Ministério Público do Trabalho, esse é o caso mais longo de trabalho análogo ao escravo da história do Brasil. As informações são do programa Fantástico, da TV Globo.

Durante a inspeção de auditores, a idosa foi encontrada dormindo no sofá, em um espaço improvisado. Ela não possuía telefone e os familiares só conseguiam contato com ela ligando para um dos empregadores, que atendia ao telefone raramente. Além disso, Maria tinha aposentadoria, mas o cartão e a senha estavam com o empregador.

A defesa dos ex-patrões Yonne Mattos Maia e André Luiz Mattos Maia Neumann negou as acusações e alegou que Maria de Moura era tratada como integrante da família. No entanto, segundo relatos dos auditores-fiscais do Trabalho da Superintendência Regional do Trabalho no Rio de Janeiro (SRTb/RJ) — que resgataram a mulher — essa situação não foi constatada durante a inspeção.

"Foi alegado que era 'como da família', mas a ela não foi permitido o estudo e nunca teve o direito de conduzir a própria vida, muito embora nenhuma doença ou fato similar lhe tire essa capacidade", afirmou Alexandre Lyra, um dos auditores responsáveis pelo caso.

A mulher foi morar com a família dos patrões do pai aos 12 anos, com a promessa de uma vida melhor. Mas desde então, a trabalhadora passou a ser submetida a jornadas degradantes. Atualmente, Maria de Moura mora com a família e recebe aposentadoria e um salário mínimo da família Mattos Maia por decisão liminar da Justiça.

O Código Penal, no artigo 149, define as condições que caracterizam o trabalho análogo à escravidão, que são: o trabalho em condições degradantes, o trabalho forçado, a jornada exaustiva e situações em que se configuram a escravidão por dívidas com a retenção da pessoa no lugar de trabalho.

Veja a nota do Ministério Público do Trabalho no Rio de Janeiro:

Na esfera trabalhista, a Ação Civil Pública proposta pelo Ministério Público do Trabalho no Rio de Janeiro (MPT-RJ) contra os réus em 2022 continua em andamento.

Recentemente houve audiência judicial, quando foram ouvidas testemunhas indicadas pelo MPT e pelos réus. No momento, o processo está com o Juiz para decidir sobre o pedido dos réus de depoimento da dona Maria de Moura.

O MPT é contra o depoimento porque o processo versa sobre direito indisponível da trabalhadora - indisponibilidade que decorre da sua condição de vulnerabilidade por ter ficado em situação de escravidão contemporânea.

Além disso, a Sra. Maria de Moura não tem condições de comparecer em juízo para prestar depoimento porque, segundo laudo médico que foi apresentado nos autos, ela já está com a saúde mental comprometida, com quadro de demência.

O MPT tem a expectativa de que o processo siga para sentença em breve, já que tem preferência na tramitação.

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