Meio ambiente

PL do Licenciamento: Lula enfrenta pressão para decidir se sanciona ou veta

Presidente tem até 8 de agosto para sancionar ou vetar o projeto de lei que muda regras ambientais. Enquanto especialistas denunciam grave retrocesso, setores econômicos afirmam necessidade de modernizar legislação

Ministra disse que técnicos trabalham em alternativas que serão levadas ao presidente Lula para evitar o avanço do desastre ambiental -  (crédito:  ESTADÃO CONTEÚDO)
Ministra disse que técnicos trabalham em alternativas que serão levadas ao presidente Lula para evitar o avanço do desastre ambiental - (crédito: ESTADÃO CONTEÚDO)

Aprovado pela Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei 2159/2021, que estabelece o marco geral do licenciamento ambiental, repousa sobre a mesa do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que vai decidir sobre o que manter e o que vetar na proposta — que ficou conhecida como PL da Devastação. O prazo para sanção termina em 8 de agosto.

As opiniões se dividem até mesmo dentro do governo, com forte movimentação tanto pela manutenção quanto pelo veto. Ontem, a ministra do Meio Ambiente e Mudanças Climáticas, Marina Silva, voltou a defender vetos. "Estamos caminhando para fazer mudanças estruturais. Porque, da forma como ele foi aprovado, não cria nenhum benefício, nem para o licenciamento ambiental, nem para dar celeridade aos processos que tramitam dentro dos órgãos de licenciamento estaduais, federais ou municipais", declarou a chefe da pasta a Empresa Brasil de Comunicação (EBC).

"As equipes técnicas dos ministérios do Meio Ambiente e Mudança do Clima, da Casa Civil e da Secretaria de Relações Institucionais estão trabalhando e vamos levar para o presidente Lula, sugestões de encaminhamento que ajudem a reparar essa demolição da legislação brasileiro", comentou a ministra.

Entre os que apoiam a sanção, estão o ministro dos Transportes, Renan Filho, e o de Minas e Energia, Alexandre Silveira, que trabalhou para incluir os setores de petróleo e mineração no licenciamento facilitado.

O presidente do Instituto Pensar Energia, Marcos Cintra, afirmou ao Correio que a medida representa um avanço na racionalização de procedimentos e na superação de entraves burocráticos, sem comprometer o rigor ambiental.

Segundo Cintra, a legislação em vigor até então era "fragmentada, juridicamente frágil e administrativamente instável", o que impedia a execução de projetos estratégicos e aumentava a judicialização. Ele defende que o novo texto, aprovado na forma do substitutivo ao PL 2159/21, introduz critérios proporcionais ao risco e oferece maior segurança jurídica. "Ao organizar, aumenta-se a eficácia do controle, libera-se a capacidade técnica dos órgãos ambientais e fortalece-se a proteção onde ela é mais necessária", avaliou.

O setor de mineração, representado pelo Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), também se posicionou favoravelmente à proposta. Em nota oficial, o órgão desmentiu que a nova lei altere normas relativas à segurança de barragens, alvo de críticas de ambientalistas. "As barragens são disciplinadas por outra legislação, a Política Nacional de Segurança de Barragens, e por resoluções da Agência Nacional de Mineração", esclareceu a entidade.

O presidente do Ibram, Raul Jungmann, reforçou que a reinclusão da mineração no texto final não afeta o rigor dos critérios de segurança. "Fiquem certos de que essa reinserção é intensamente importante para o Brasil, na medida em que significa bilhões de investimentos, empregos e impostos, mas com a disciplina da segurança das barragens permanecendo inalterada", disse. Ele destacou que a nova lei permitirá à mineração contribuir com a produção de minerais críticos para a transição energética.

Para o Instituto Pensar Energia, um eventual veto presidencial ao texto traria perdas bilionárias. Cintra calcula que o Brasil deixaria de captar até R$ 70 bilhões em investimentos no setor de petróleo e gás até 2030. "O atual modelo penaliza quem busca cumprir a lei e favorece a informalidade", afirmou.

Sobre o impacto internacional, ambos os setores avaliam que o novo marco aproxima o Brasil das práticas internacionais de governança ambiental. Cintra defende que a nova lei corrige o atual cenário de insegurança regulatória e fortalece a imagem do país frente às exigências de investidores atentos à agenda ESG. "A nova lei nos aproxima das melhores referências regulatórias do mundo: proporcionalidade no licenciamento, tipologia baseada em risco, responsabilização objetiva e fortalecimento da fiscalização", pontua.

Para o presidente do Ibram, a aprovação definitiva do projeto também representa uma sinalização positiva em ano de COP30. "A mineração projeta bilhões de investimentos que vão gerar empregos e impostos, especialmente na produção de minerais estratégicos para a transição energética. Essa é uma questão central para o Brasil e para o mundo", concluiu.

Projeto criticado

Ambientalistas enxergam o Projeto do Licenciamento Ambiental, prestes a ser sancionado pelo presidente Lula, como um dos maiores retrocessos na legislação ambiental dos últimos 40 anos. Por isso, diversas entidades estão unidas para pressionar o governo pelo veto, pelo menos, aos pontos mais críticos do substitutivo aprovado na Câmara.

Uma dessas campanhas é encabeçada pelo Nossas — organização de ativismo que desenvolve tecnologias cívicas e campanhas de mobilização para fortalecer a democracia e promover justiça social e ambiental no Brasil.

Desde 2023, a ONG vem mobilizando os cidadãos para disparar mensagens para parlamentares e, agora, para o presidente, com a esperança de sensibilizar para o tema. A plataforma pldadevastaçao.org disparou 247.000 mensagens desde que o PL chegou à Câmara e, agora, no Planalto.

"A campanha nasceu em 2023, um esforço conjunto de organizações do campo socioambiental dado à gravidade do texto. Então, lançamos a plataforma e atuamos em duas frentes: mobilização on-line e off-line e incidência política inicialmente no Senado", explica Lucas Lucas Louback, gestor de campanhas e incidência políticas do Nossas.

"E o nosso pedido é pelo veto total, porque o projeto é carregado de inconstitucionalidades", defende o ambientalista. Entre os pontos mais críticos apontados pelos especialistas, estão os artigos de 7 a 10 que, segundo ele, "basicamente dispensam a licença ambiental para atividades agropastoris". O artigo 4, para Louback, desmonta os órgãos federativos do meio ambiente.

"O PL da Devastação desmantela o principal mecanismo da política de proteção ambiental no país. Enquanto deputados e senadores atropelam a Constituição e a legislação ambiental para incrementar o lucro de grandes empresas, populações potencialmente atingidas, como indígenas e povos de comunidades tradicionais, estão levando o devido cala boca da futura lei", afirma Gabriela Nepomuceno, especialista em políticas públicas do Greenpeace Brasil.

Ela diz que o aspecto mais devastador da proposta "reside na ruptura da lógica do processo de licenciamento ambiental, cujas regras buscavam equilibrar o desenvolvimento econômico e o meio ambiente".

Segundo Gabriela, ao permitir que a maior parte dos empreendimentos e obras sejam beneficiados com o autolicenciamento, sem estudos de impacto socioambiental, o Congresso acaba por encorajar a ocupação predatória do espaço urbano e dos territórios.

Ela destaca o empenho de empresários e parlamentares ligados ao agronegócio — umas das atividades que mais emitem gases de efeito estufa. "Não se constrói futuro quebrando a legislação, ignorando a ciência e a prevenção, porque o resultado previsível disso é a perda de vidas, desastres e judicialização", aponta Gabriela Nepomuceno. (EL e AB)

* Estagiária sob a supervisão de Edla Lula

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postado em 26/07/2025 03:55
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