EDUCAÇÃO

Escolas investem em meditação para auxiliar no controle das emoções

Escolas e professores do Distrito Federal trabalham com o programa Plena Atenção na Escola (PAE), método prático que promove meditação e outras atividades para aumentar o bem-estar da comunidade escolar

Thaís Moura
postado em 15/05/2022 06:00
 (crédito: Fotos: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)
(crédito: Fotos: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)

À primeira vista, a Escola Classe da 415 Norte não difere das outras 686 unidades de ensino público do Distrito Federal, com os alunos agitados e cheios de energia. Entretanto, quando as professoras tocam o sino e anunciam que é o "momento de plena atenção", todos sabem que é hora de se acalmar, respirar e se concentrar por, pelo menos, 10 minutos. "Que eu possa estar saudável, seguro, feliz e em paz", repetem os estudantes do ensino fundamental 1, de olhos fechados e coluna ereta, enquanto são guiados pela professora Lígia Fernanda Fruet, ou pela coordenadora da escola, Ana Márcia Correia.

  • As educadoras Ana Márcia e Lígia Fernanda relatam os benefícios para as crianças Thaís Moura/CB/D.A. Press
  • 10/05/2022 Crédito: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press. Brasil. Brasilia - DF - Escola Classe 415 Norte. Alunos em Momento de Plena Atenção antes de começar a aula. Marcelo Ferreira/CB/D.A Press
  • Luana Cabral, 9 anos, se sente mais tranquila Marcelo Ferreira/CB/D.A Press

O momento acontece diariamente antes das aulas, com as 14 turmas que compõem o turno matutino e vespertino. Além da prática, algumas professoras também promovem, semanalmente, aulas para que os pequenos conheçam os fundamentos, objetivos e benefícios da prática da meditação no ambiente escolar. Nas aulas, eles aprendem sobre compaixão, autoconhecimento, empatia, gratidão, perdão, e até sobre o funcionamento do cérebro humano. A ideia, com isso, é melhorar o rendimento, a concentração, o bem estar físico e mental, e as relações interpessoais da comunidade escolar.

Toda essa rotina faz parte do método conhecido como "Plena Atenção na Escola" (PAE). A Escola Classe da 415 Norte trabalha com o programa desde 2018, e, no DF, cerca de 55 colégios da rede pública têm professores treinados para aplicar o PAE. Quem trouxe e divulgou o método na capital federal foi a Sociedade Vipassana de Meditação (SVM), em 2016. Hoje, a entidade disponibiliza um curso de formação de condutores a todos educadores interessados em adotar a prática em sala de aula.

A diretora da Sociedade Vipassana, Ana Cláudia Messias, atual coordenadora do programa PAE, é uma das responsáveis pela estruturação e divulgação do método, que é baseado em evidências científicas e em experiências adotadas, com sucesso, no sistema educacional de outros países. "Nós sempre tivemos um curso de meditação iniciante para adultos, e, no final desse curso, as pessoas nos procuravam para saber como poderiam levar essa experiência às crianças, e alguns educadores do curso demonstraram interesse em implementar a técnica nas escolas. Então, por causa da demanda, começamos a estudar como fazer isso, e chegamos ao Plena Atenção, que também é conhecido como mindfulness", explica Ana Cláudia.

Desse modo, a Sociedade Vipassana elaborou um manual próprio que orienta educadores na condução do método PAE. Os interessados contratam o curso e passam por um treinamento de quatro meses, no total. Hoje, são 16 aulas on-line, uma vez por semana. "Já pensávamos em adaptar o curso, antes presencial, para o modelo remoto, antes da pandemia. Porque as aulas eram no Plano Piloto, e não conseguimos chegar em escolas mais distantes. Muitos professores não podiam sair de tão longe e vir para cá, então migramos para o on-line", contou a diretora da Sociedade.

De acordo com Ana Cláudia, a SVM teve uma parceria informal com a Secretaria de Educação, em meados de 2018, para auxiliar na divulgação e expansão do programa. A assessoria da pasta, no entanto, informou ao Correio que não localizou essa conexão. "Tínhamos feito um acordo na época, mas não chegamos a formalizar. A pasta ajudou fornecendo o material pedagógico para o manual que produzimos, dando apoio, liberando professores para fazer o treinamento, e isso funcionou por cerca de um ano e meio. Mas quando a gestão da secretaria de Educação mudou, em 2019, a parceria acabou, por causa da descontinuidade administrativa", explicou a diretora da Sociedade Vipassana.

Ana Cláudia acredita que, diante dos recentes casos de violência em escolas da capital, a expansão do PAE poderia, a longo prazo, ajudar a mudar esse cenário. Em abril, ela discutiu o assunto com a gerência de Práticas Integrativas da Secretaria de Saúde, e na ocasião, o gestor da área se comprometeu a levar o programa novamente à Secretaria de Educação. Ao Correio, a assessoria da Saúde confirmou a reunião e reforçou que tem interesse em desenvolver a parceria. "Tratativas têm sido feitas no sentido de unir os dois interesses em prol da população", informou a pasta, em nota.

Prática traz mudanças

Os resultados obtidos com o método têm animado professores, pais e alunos da Escola Classe da 415 Norte. A estudante Luana Cabral, 9 anos, está no quarto ano do Ensino Fundamental 1 e diz que se sente mais tranquila e concentrada após a prática. "Sem estar calmo, a gente não consegue aprender muita coisa, não dá pra memorizar bem as matérias. E a professora já disse que, se a gente não relaxar para fazer as coisas, não vai fazer direito. Porque na maioria das coisas que acontecem na vida, a gente precisa respirar, acalmar e relaxar", conta.

A coordenadora da escola, Ana Márcia Correia, conhecia o método PAE, e quando soube da possibilidade de obter o material e o curso próprio da Sociedade Vipassana, em 2018, divulgou a iniciativa aos demais professores. "A escola é um espaço natural de agitação. As crianças têm muita energia no corpo delas, mas não conseguem dar conta de tudo. E a condução dessa prática diária leva eles a perceberem que, quando estão conscientes de si mesmos, independente da situação, é possível reagir de forma diferente, sem brigar, sem se irritar, e sem sofrer tanto", explica a coordenadora da Escola Classe.

A prática do Plena Atenção também traz benefícios para os docentes da unidade. A professora Lígia Fernanda Fruet relata que, graças a aplicação do PAE, desistiu de pedir afastamento do trabalho. Entretanto, ela confessa que antes de estudar o método, não achou que daria certo. "Eu achava que era só modinha, mas acabei me rendendo e hoje não fico sem o Plena Atenção. Agora, essa prática faz parte das minhas aulas e da minha vida. Antes, eu tinha uma turma difícil de trabalhar e estava sobrecarregada, até porque o professor é cobrado a todo momento, por toda a sociedade", desabafa.

Apesar da mudança positiva no ambiente escolar, o programa PAE começou tímido, com apenas duas professoras, em 2016, na escola Queima Lençol, localizada na zona rural de Sobradinho. Janaíla de Souza foi uma das educadoras pioneiras no curso de condutores da Sociedade Vipassana. "Desde então, nunca mais parei de usar o PAE. Há 4 anos, mudei para a Escola Classe 16, em Sobradinho, e também levei o projeto para lá. E eu tenho relatos incríveis desde o início. Tinha uma aluna, por exemplo, que ensinou a própria mãe a parar e respirar desse jeito, porque a mãe era muito nervosa, e depois disso, mudou a vida dela em casa. É um método que vai além da sala de aula", diz.

 

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