
Após episódios de vandalismo em hospitais e unidades públicas de saúde no Distrito Federal, a pasta responsável pela área está elaborando o Plano Distrital de Segurança Hospitalar. A ideia da Secretaria de Saúde do DF (SES) é reforçar o aparato de segurança para servidores e pacientes. Ao Correio, o secretário adjunto de Integração da pasta, Valmir Lemos de Oliveira, informou que, no momento, a secretaria está colhendo dados para subsidiar o trabalho.
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"A proposta é criar um plano de segurança para toda a rede hospitalar. Temos que tratar de controle de acesso, câmeras de segurança, vigilância. É um trabalho complexo que envolve diversas áreas", explicou Valmir. "A ideia não é somente fazer instalações físicas, é pensar em segurança hospitalar como um sistema que tem uma área de prevenção, de repressão, de dimensionamento de riscos", completou.
O secretário adjunto explicou que, para elaboração do plano, diferentes especificidades de cada unidade de saúde estão sendo consideradas. "Unidades que atuam somente com vacinação requerem um atenção diferente daquelas que atuam com cirurgias, por exemplo. As estruturas que estão sob administração do Instituto de Gestão Estratégica de Saúde do DF (Iges) também serão consideradas e, se necessário, faremos ajustes definidos pela presidência do instituto", enfatizou. "As soluções não podem ser isoladas, têm que ser pensadas, discutidas e precisam estar previstas em algum lugar", completou.
A Secretaria de Segurança Pública (SSP-DF) está participando da elaboração do plano. "O projeto em desenvolvimento vai garantir a segurança e a integridade das unidades do sistema público de saúde, seus servidores, usuários e equipamentos. Atualmente em fase de instalação, o projeto realizará o monitoramento de unidades de saúde em tempo real, permitindo ações de pronta resposta em caso de necessidade, por meio do imediato acionamento do Centro de Operações da Polícia Militar (COPOM)", disse a pasta, em nota.
Causas
Psicóloga e especialista em orientação psicanalista, Alessandra Araújo Vieira explicou que, no calor de uma situação de estresse extremo, como a demora em um atendimento de saúde urgente, o cérebro humano entra em um modo de "luta ou fuga". "Esse estado é orquestrado, principalmente, pelo sistema límbico, que é responsável pelas emoções e libera um coquetel de hormônios como o cortisol, o famoso hormônio do estresse, e a adrenalina", detalhou.
Segundo Alessandra, em pessoas com menor capacidade de regulação emocional, ou que já possuem desequilíbrios em neurotransmissores, como a serotonina, que ajuda a regular o humor e a impulsividade, essa descarga pode levar a uma explosão de agressividade. "A sensação de impotência e a percepção de ameaça à saúde ou à vida podem sobrecarregar as áreas cerebrais responsáveis pelo controle de impulsos, resultando em comportamentos desproporcionais e violentos, um verdadeiro 'curto-circuito' emocional", ressaltou.
Consequências
Em 2025, houve pelo menos quatro episódios de vandalismo em hospitais e unidades públicas de saúde do Distrito Federal devido à demora no atendimento (veja memória). O Código Penal brasileiro prevê sanções para destruição, deterioração, subtração ou alteração de bens que pertencem ao patrimônio público, ou seja, ao Estado.
"As pessoas que danificam patrimônio podem ser enquadradas no artigo 163 do Código Penal, que prevê detenção de um a seis meses ou multa. Além da sanção penal, o autor pode ser obrigado a indenizar os cofres públicos pelos danos causados. Isso ocorre por meio de ação civil pública ou ação regressiva do Estado", esclareceu o advogado Diego Serafim, da Almeida Advogados. "Se o crime é cometido contra o patrimônio da União, Estado, Município ou empresa concessionária de serviços públicos, a reclusão pode ir de seis meses a três anos", completou.
Advogado criminalista, Amaury Santos de Andrade lembrou ainda que, pelo fato de o bem público pertencer à coletividade, o dano afeta não apenas o Estado. "O cidadão é o verdadeiro destinatário dos serviços e estruturas públicas. O prejuízo desse tipo de vandalismo afeta também a sociedade e revela uma conduta antissocial que precisa ser firmemente responsabilizada. A responsabilização criminal não exclui, ainda, a possibilidade de responsabilização civil, ou seja, o autor do dano poderá ser compelido a indenizar os prejuízos causados ao erário", salientou.
Caminhos
Doutora em administração e especialista em gestão de saúde, Chrystina Barros destacou que uma parte dos gargalos que motivam alguns atos de vandalismo podem ser resolvidos com inteligência artificial. "A IA pode favorecer o atendimento remoto, busca ativa de pessoas para que elas não precisem ficar retornando à unidade para acompanhar sinais e sintomas, etc. Existem ferramentas que podem ser aplicadas. A pandemia foi disruptiva para isso. Antes dela, a telemedicina não tinha regulamentação. Foi justamente a limitação da pandemia que trouxe essa ferramenta como uma solução real", relembrou.
A especialista salientou que não se pode abrir mão de contratar profissionais de saúde. "Infelizmente, vemos que faltam profissionais e que há sobrecarga dos que estão trabalhando, o que impede, muitas vezes, o atendimento digno. É preciso uma revisão de protocolos, de fluxos, de comunicação entre unidades, sistema de referência contra a referência, e também no uso da telemedicina e inteligência artificial", sugeriu.
Diretor e fundador do Hospital Ceuta, Silvio de Moraes Júnior destacou que a situação de tensão devido a longas esperas também é comum em hospitais particulares. "Tanto os grandes hospitais quanto as emergências particulares enfrentam o desafio de lidar com uma demanda superior à sua capacidade, levando pacientes e familiares à sensação de abandono e impotência diante de quadros de urgência", disse. "A resposta dos hospitais passa por reforço na segurança, investimento em triagem e treinamento de equipes para o acolhimento humanizado. No entanto, essas ações aliviam, mas não atacam o cerne da questão, que é a sobrecarga do sistema. É preciso ir além de soluções paliativas", alertou.
O médico falou sobre uma alternativa que já se mostra eficaz em diversos países e começa a ganhar espaço no Brasil. "É o modelo dos chamados hospitais dia. Essas unidades são estruturadas para atendimento de baixa e média complexidade, oferecendo procedimentos que não exigem internação prolongada. Ao descentralizar o atendimento e desafogar prontos-socorros e grandes hospitais, os hospitais dia permitem que casos simples sejam resolvidos com mais rapidez, conforto e eficiência", descreveu.
Memória
27/4 - Um homem foi preso após quebrar portas de vidro da UPA de Ceilândia. O vandalismo foi registrado em vídeo por pacientes que aguardavam atendimento e mostra o detido jogando um objeto contra a estrutura, que foi ao chão. O acusado teria se irritado com uma suposta falta de atendimento médico.
23/5 - Com pedaços de madeira, duas mulheres quebraram uma porta do Hospital Regional de Santa Maria (HRSM). O motivo teria sido a demora no atendimento para o filho de uma delas. No mesmo dia, outras pessoas chegaram a chutar portas, quebrar objetos e ameaçar vigilantes.
28/5 - Em um ataque de fúria, um homem destruiu equipamentos da UBS 1, na Asa Sul. Ele teria sido atendido anteriormente por um programa itinerante do GDF, onde os médicos vão às ruas fazer consultas. Ao chegar à unidade de saúde, o profissional não estava no local. A ausência teria revoltado o paciente, que quebrou um computador e lançou objetos contra o vidro de uma sala.
6/7 - Um policial militar de folga agrediu dois seguranças no Hospital de Base após chegar ao hospital com a mãe inconsciente e precisando de atendimento. Ele teria se irritado com a burocracia do hospital na hora de dar entrada, gritado com servidoras e dito que "daria um tiro em todos".
Cidades DF
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