DIREITO DO CONSUMIDOR

Ligações de telemarketing podem ser consideradas abusivas e bloqueadas

Chamadas insistentes com ofertas de produtos e serviços podem incomodar diariamente a vida de milhares de pessoas. Especialista afirma que a prática pode ser considerada invasiva e, quando isso acontece, existem mecanismos para interromper o ciclo de assédio

CB Press -  (crédito: Caio Gomez)
CB Press - (crédito: Caio Gomez)

Bruna Teixeira*

As chamadas telefônicas de telemarketing incomodam milhares de pessoas diariamente no Brasil. O que muitos não sabem é que, quando as ligações insistentes começam a irritar o consumidor, existem atitudes que podem ser tomadas para evitar esse tipo de abordagem, como explica a advogada especialista em direito do consumidor Carla Simas.

"É possível registrar o número em listas de bloqueio, consultar o CNPJ do originador e formalizar reclamação na Anatel e no Procon local. Além de reclamações administrativas, o consumidor pode acionar o Judiciário para cessar a prática e buscar indenização por dano moral quando houver abuso comprovado, especialmente em caso de cobrança, com base no Código de Defesa do Consumidor (CDC)", esclarece.

A especialista explica que o CDC não especifica os casos de abuso nas chamadas, mas artigos do código oferecem uma base suficiente para caracterizar o assédio, como as regras de publicidade e identificação de mensagem publicitária, práticas para prevalecer-se da fraqueza do consumidor e limites à cobrança de dívidas, neste caso frequentemente invocados contra ligações insistentes.

"O Ministério da Justiça e Procons orientam que a repetição excessiva viola a intimidade do consumidor e caracteriza abuso. Há ainda leis estaduais que limitam horários", afirmou. "Em vendas, o 'assédio de consumo' passou a ser expressamente vedado pela Lei que trata do superendividamento, que incluiu proibições a assediar ou pressionar consumidores vulneráveis", conclui Carla.

Eduardo Aquino, 26, relata que, frequentemente, se sente incomodado pelas ligações. "Fico muito impaciente com essas chamadas, porque ficam ligando várias vezes, usando vários números diferentes. Eu tento bloquear o máximo possível, mas nem isso adianta", desabafa.

O jovem ainda expõe a insatisfação com a falta de controle das companhias telefônicas para evitar o aborrecimento dos clientes. "Os responsáveis precisam tomar medidas cabíveis para evitar essas ações, e as linhas telefônicas precisam ser fiscalizadas para impor limites a essa situação", completa.

Fiscalização

Em outubro de 2022, a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) estabeleceu a obrigatoriedade da identificação de chamadas de telemarketing pelo prefixo 0303. A medida visava facilitar o reconhecimento dos números pelo consumidor, além de contribuir para o combate a fraudes e ligações abusivas.

No entanto, essa medida foi revogada em agosto deste ano, pela própria Anatel, que alegou, em nota, que a anulação da regra ocorreu devido à substituição por outras estratégias consideradas mais eficientes no combate ao incômodo dos consumidores.

A Conselheira da Anatel, Cristiana Camarate, explica que, a partir do novo método de fiscalização, as empresas precisam, a partir de agora, autenticar as chamadas. "Isso significa que, ao receber uma ligação, o celular terá uma verificação de que aquela chamada está vindo de uma empresa regularizada. Na prática, isso gera muita segurança para o consumidor", esclarece.

Essa tecnologia de autenticação permite a identificação do autor da chamada, já que concede a exibição do número devidamente registrado pelo autor da ligação, o nome da empresa que o registrou e, até mesmo, a sua logomarca, acompanhada por selo que atesta a veracidade das informações

Segundo a conselheira, atualmente, as maiores queixas dos consumidores são relacionadas a chamadas perigosas e fraudulentas, diferentemente de alguns anos atrás, quando a maioria reclamava de importunação por ligações para oferta de produtos ou serviços. "É por esta razão que a Anatel determinou a autenticação imediata destas empresas. O 0303 passa a ser facultativo. Ele representa atualmente apenas 10% das chamadas que estão circulando. E muitas delas eram com números falseados, fraudulentos, capazes de enganar o consumidor. Com essas medidas, nós esperamos atuar na causa raiz do problema", conclui Cristiana.

De acordo com a Agência, as empresas que realizam mais de 500 mil chamadas mensais terão 90 dias para se adequar à medida, contados a partir de 7 de agosto deste ano.

A advogada afirma que enquanto a autenticação e a identificação completas não forem visíveis, o usuário fica prejudicado. Mas salienta que existem outras opções de monitoramento. "Ferramentas como o portal Qual Empresa Me Ligou? continuam permitindo descobrir o CNPJ por trás de números de pessoa jurídica", sugere.

Thiago Ramos, 24, também se queixa das ligações recorrentes que recebe indesejadamente. Para ele, existem outras alternativas mais eficazes de captar os clientes. "Acho que os contatos poderiam ser feitos por e-mail quando são mais importantes. Acredito que diminuir a meta de atendimento das pessoas que trabalham em empresas de telemarketing também pode ser uma opção eficiente", afirma o jovem.

O estudante conta uma situação que passou recentemente com excesso de ligações de uma plataforma de serviços financeiros. "Eu fiquei devendo um dia e eles me ligaram diversas vezes, no mesmo dia. São ligações automatizadas, sempre com um robô falando. É algo que a gente pode ver que já se enquadrou na nossa cultura, mas é inaceitável", queixa-se.

Medidas e soluções

A advogada cita alguns mecanismos de fiscalização das chamadas abusivas, como como o Não Me Perturbe,  o Não Me Ligue, do Procon-SP, e o Qual Empresa Me Ligou?, onde é possível consultar o CNPJ do originador da ligação.

A especialista alerta que empresas que descumprem normas estabelecidas pelos clientes, como o bloqueio do número pelo Não me Perturbe, podem ser penalizadas. "As infrações ao CDC estão sujeitas a sanções administrativas, como advertência, multa e suspensão de fornecimento do serviço, além de medidas civis e, em casos de cobrança abusiva, até criminais, segundo o artigo 71 do CDC", aponta.

*Estagiária sob a supervisão de Márcia Machado

 


  • Google Discover Icon
postado em 25/08/2025 11:00
x