
Uma substância retirada da peçonha de uma espécie de vespa pode ser uma luz para mais de 1,2 milhão de pessoas com Alzheimer no Brasil. Pensando em reduzir o sofrimento de pacientes e familiares que cuidam de parentes com a enfermidade, pesquisadores da Universidade de Brasília (UnB) realizam estudos para conter a progressão da degeneração cerebral e uma forma de retardar o avanço da doença.
Apoiado pelo programa FAP-DF Learning 2023, da Fundação de Apoio à Pesquisa do Distrito Federal (FAP-DF), um grupo interdisciplinar da Universidade de Brasília (UnB), que conta com pesquisadores de diversos institutos, incluindo Física, Farmácia, Nanotecnologia e Neurofarmacologia, está desenvolvendo peptídeos — cadeias de aminoácidos que, posteriormente, formam proteínas — que podem ter aplicações terapêuticas e com potencial de impedir a formação de uma das principais proteínas associadas ao Alzheimer, a beta-amiloide.
Inspirado em estudos anteriores, o projeto utiliza o peptídeo octo vespina, extraído da peçonha da vespa social Polybia occidentalis, como uma das principais armas contra a doença. A coordenadora do projeto, Luana Cristina Camargo, do Instituto de Psicologia da UnB, explicou o uso dessa substância para a pesquisa. "A peçonha da vespa para tratar doenças neurodegenerativas é utilizada há mais de 20 anos. O composto ocidentalina 1202 — extraído da peçonha da vespa Polybia occidentalis — foi modificado e avaliado para ser mais semelhante a beta-amiloide. Depois disso, começamos os estudos para aplicar contra o Alzheimer", afirmou.
A escolha dessa substância não ocorreu por acaso. Luciana explica que a octo vespina demonstrou bons resultados contra uma das causas prováveis de da doença. "Em um quadro de Alzheimer, existe uma alteração e acúmulo de beta-amiloide no nosso encéfalo. Observamos que esse peptídeo modificado apresentou uma melhora dos déficits cognitivos em animais", disse.
Os estudos também se preocupam com a aplicação e proteção da substância até chegar ao cérebro, sendo a forma intranasal — aplicação diretamente na cavidade nasal — uma das mais promissoras. Ao Correio, a coordenadora do projeto afirma que essa avaliação foi feita em 2015. "Durante o meu mestrado, imaginamos que a aplicação direta no cérebro poderia ser degradada. O intuito é deixar a aplicação mais viável aos humanos e utilizar a bioinformática para aprimorar", afirmou.
Apesar dos avanços, Luciana também lamenta os problemas que o projeto encontra. "Como qualquer pesquisa, precisamos de equipamentos para fazer avaliações, infraestrutura para fazer simulações e análises de bioinformática, além da compra de compostos". Nesse aspecto, o projeto conta com apoio da FAP-DF, que Luciana avalia como fundamental. "Ela fomentou diferentes projetos de pesquisa dentro do grupo e auxiliou bastante no desenvolvimento dessa pesquisa ao longo dos anos", ressaltou.
Para os próximos passos, a pesquisadora espera que todos os processos legais sejam alcançados. "O que esperamos, de verdade, é que realmente esses compostos sejam utilizados, passem para as próximas etapas de testar em humanos e chegar ao mercado com a aprovação da Anvisa e com todas essas etapas regulatórias bem sucedidas", afirmou.
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Sintomas
O neurologista Lucas Cruz, do Hospital Anchieta, alerta para sintomas que podem ser confundidos com o envelhecimento natural. "O mais marcante é a perda de memória progressiva. Por isso, é importante confirmar com familiares ou acompanhantes se os esquecimentos estão realmente se agravando ao longo do tempo", disse. "Problemas para executar atividades rotineiras, como cozinhar, cuidar das finanças ou se vestir, também podem ser comuns", disse. Ele também alerta para dificuldades no planejamento de atividades ou para seguir etapas de alguma tarefa.
Outro sintoma comum é a desorientação temporal e espacial, além da dificuldade em se expressar. "Confundir dias da semana, perder a noção de datas importantes ou até se perder em lugares familiares, são fatores de atenção. O paciente também pode encontrar dificuldade para encontrar palavras e até usar expressões inadequadas", acrescentou.
Tratamento e prevenção
Apesar do quadro assustador, um diagnóstico precoce é crucial para o enfrentamento da doença. No Distrito Federal, a Secretaria de Saúde (SES) disponibiliza atendimento médico para pessoas com Alzheimer nas unidades da atenção primária e nos ambulatórios da atenção especializada, como em geriatria, neurologia e psiquiatria, que podem ser encontrados nas policlínicas.
Segundo a pasta, a orientação é que, caso perceba que um familiar esteja apresentando prejuízo cognitivo progressivo, como alteração de memória, atenção, orientação, linguagem, capacidade de organização e planejamento, por exemplo, é necessário procurar a unidade de saúde da atenção primária mais próximo de sua residência para uma avaliação médica. Em caso de suspeita e, se julgar necessário, o médico de família irá encaminhar o paciente para uma avaliação especializada.
O neurologista do hospital Anchieta Lucas Cruz comenta sobre alguns tratamentos que podem retardar a progressão do Alzheimer. " Os medicamentos mais utilizados pertencem à classe dos anticolinesterásicos, que atuam na memória e cognição. Além deles, medidas não farmacológicas como estimulação cognitiva, fisioterapia, acompanhamento psicológico e apoio multiprofissional desempenham um papel fundamental", disse. Para o especialista, o suporte da família é essencial. "O cuidado diário influencia diretamente o bem-estar do paciente e de quem convive com ele", acrescentou.
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