
Tantas vezes exaltamos as qualidades da Brasília que habita nossas memórias e nossos sentimentos mais alegres. Aquela que vivemos nas temporadas de seca e nos chuvosos outubros. A que certa vez ficou coberta de neve, e a que agora se alegra com o laranja dos flamboyants.
Mas há um lado doloroso que insiste em perseguir nossa capital. Desde as primeiras décadas e agora nesse início da segunda metade de século de existência, crimes brutais marcaram as páginas do jornal e as quadras do seu Plano Piloto. Para ser uma cidade modelo, é preciso também ser exemplo, merecer reverência e ser alvo do orgulho de seus moradores.
Se, ao passarmos por um parque, o primeiro pensamento que vier à mente for sobre o crime que ocorreu ali, é porque o modelo falhou, e quem perde somos todos nós. Arrastamos conosco também um país inteiro que depositou confiança e envidou esforços às vezes sobrehumanos para que seus edifícios fossem erguidos.
Não é normal que adolescentes matem por causa de um celular. A vida não é banal. Muito menos uma vida tão jovem quanto a de Isaac Vilhena. Ele praticava esporte no parque que amava, ao lado de sua casa, perto de seus pais e irmãos, na companhia de amigos de escola, quando foi vítima da violência. E qualquer violência desse tipo é uma falha incontestável.
Quando os pais de Isaac falarem, eles precisam ser ouvidos. Sua dor, inimaginável, deve ser aplacada com ações concretas. Dizer basta à violência é dizer sim à educação, sim ao humanismo, sim às cidades que se conectam com seus habitantes e com suas periferias, de forma humana e responsável.
O Parque Maria Cláudia Del'Isola foi inaugurado há poucos anos, em um vazio que gritava entre as quadras 112 e 113 Sul. Ganhou o nome da jovem que foi violentada, assassinada e teve o corpo escondido dentro da própria casa, e se tornou uma homenagem a ela e a todas as vítimas de violência em Brasília, graças à força da mãe, Cristina Del'Isola.
Recordo-me até hoje da angústia da família à procura da menina. Ela tinha quase a minha idade, e seu pai era diretor na escola em que eu estudava. Sua morte foi um golpe, deixou o sentimento de vulnerabilidade e de medo.
O assassinato de Isaac, no último 17 de outubro, no parque que leva o nome de Maria Cláudia, é um novo golpe. A sensação que me toma é mais uma vez de impotência e, principalmente, de revolta. Fui ao inferno pela segunda vez, como cantou Renato Russo. Coração dilacerado, penso nos meninos e meninas desta cidade. Que Brasília entregaremos a eles?

Cidades DF
Cidades DF
Cidades DF
Cidades DF
Cidades DF
Cidades DF
Cidades DF