POLÍTICAS PÚBLICAS

PDOT deve ser votado nesta terça-feira (25/11) na CLDF

Após 15 anos, revisão do Plano Diretor pode ir a plenário nesta terça-feira. Projeto enfrenta críticas por pontos polêmicos, e especialistas ouvidos pelo Correio veem fragilidade técnica na proposta. Relatora fala em "avanços dentro do possível"

A relatora da proposta destacou que a atualização é urgente, diante da necessidade de integrar mobilidade, meio ambiente e uso do solo -  (crédito: Anderson Parreira/Agência Brasília)
A relatora da proposta destacou que a atualização é urgente, diante da necessidade de integrar mobilidade, meio ambiente e uso do solo - (crédito: Anderson Parreira/Agência Brasília)

A revisão do Plano Diretor de Ordenamento Territorial (PDOT), principal instrumento que orienta o uso e a ocupação do solo na capital, deve ser votada hoje, na Câmara Legislativa (CLDF), segundo o presidente da Casa, Wellington Luiz (MDB). A norma em vigor é de 2009, sendo prevista uma revisão a cada 10 anos, processo que começou em 2019, mas foi suspenso devido à pandemia de covid-19 e retomado em 2023. Se for aprovado pelos distritais, o novo PDOT segue para sanção do governador Ibaneis Rocha (MDB).

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Entre os pontos mais polêmicos do novo PDOT está a criação do instrumento que permite a implantação de condomínios em áreas rurais. Críticos também apontam a falta de instrumentos eficazes de controle urbano, a pouca integração entre políticas de habitação, mobilidade, meio ambiente e infraestrutura, além da ausência de salvaguardas capazes de proteger áreas já pressionadas pela expansão irregular, pela grilagem e pela ocupação desordenada.

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Na CLDF, a oposição vê a proposta com ressalvas. O deputado distrital Gabriel Magno (PT) afirmou que o PDOT foi tratado como assunto de uma única secretaria (de Desenvolvimento Urbano e Habitação — Seduh), sem envolver de maneira orgânica as outras pastas. "Vários conceitos de áreas, que não o urbanismo, estão sub ou mal representados", ressaltou.

Magno destacou, ainda, que o projeto não promove e nem assegura diretrizes claras para orientar o orçamento governamental sobre os investimentos necessários em cada tema e em cada região administrativa. "As áreas prioritárias e as estratégias para alocação de áreas com vocação econômica não estão claras e assim continua o problema estrutural de mobilidade", afirmou.

A reportagem procurou a Seduh para comentar a votação, mas a pasta informou que "entende que o PDOT está, neste momento, sendo discutido pelos distritais".

 

Reunião

Ontem, deputados distritais se reuniram com o titular da Seduh, Marcelo Vaz, para ajustar o PDOT. O encontro, segundo fontes ouvidas pelo Correio, trouxe poucos esclarecimentos. A deputada Jaqueline Silva (MDB), relatora da proposta, disse que "a Comissão de Assuntos Fundiários (CAF) tem buscado garantir a segurança jurídica do projeto". Segundo ela, foram apresentadas 640 emendas ao projeto, sendo 148 acatadas e 15 acatadas como subemendas, que serão submetidas à sanção do governador Ibaneis Rocha.

"Avançamos muito dentro do que era possível para o aprimoramento da proposta. Todas as análises foram baseadas em critérios técnicos, logo esperamos aprovar o texto de acordo com o trabalho que conduzimos", disse Jaqueline. No parecer, a relatora destacou que a atualização do PDOT é urgente diante da expansão urbana desordenada, da pressão por regularização fundiária e da necessidade de integrar mobilidade, meio ambiente e uso do solo em um único marco regulatório.

Entre os principais eixos destacados no relatório está o fortalecimento da transparência e da participação social. O documento prevê, por exemplo, a criação de uma plataforma pública de monitoramento do PDOT, que permitirá o acompanhamento de indicadores, metas e execução das diretrizes previstas no plano. 

Outro ponto estruturante é a mobilidade urbana. O parecer reforça a necessidade de que o planejamento do território esteja diretamente conectado às políticas de transporte, priorizando corredores de alta capacidade, integração modal e incentivo a alternativas sustentáveis. 

O documento aborda a regularização fundiária e a função social da propriedade, temas historicamente sensíveis no DF. Emendas relacionadas à proteção ambiental também ganharam destaque no texto final, incluindo diretrizes para áreas sensíveis e definição de instrumentos de gestão territorial com base em risco ambiental e climático.

 

 

Críticas

O arquiteto e urbanista Frederico Flósculo, professor da Universidade de Brasília, critica a falta de profundidade técnica no PDOT que será votado pela CLDF. "Não há um diagnóstico consistente. Todos os PDOTs que temos feito são essencialmente imobiliários, não são planos de desenvolvimento", afirma. Para o especialista, o texto apenas "agenda novas áreas para a construção civil", sem enfrentar os verdadeiros desafios do desenvolvimento urbano.

Na avaliação do urbanista, o DF também vive um grave desequilíbrio habitacional que não é enfrentado pelo plano. Ele lembra que um terço da população vive em áreas irregulares e que, nas últimas três décadas, grileiros dominaram grande parte da expansão urbana. "Fomos construindo centenas de condomínios irregulares e muitos deles acabaram premiados na história de Brasília. O PDOT empurra os problemas com a barriga e não enfrenta o que de fato estrutura a vida urbana", critica.

Entre entidades que representam arquitetos e urbanistas da capital, o clima também é de ressalvas em relação à proposta. O arquiteto André Tavares, conselheiro do Instituto de Arquitetos do Brasil no Distrito Federal (IAB/DF), chama atenção para um ponto polêmico, que é a criação do instrumento que permite a implantação de condomínios em áreas rurais. "É uma mudança profunda, sem diálogo e com potencial para gerar conflitos com políticas agrárias, fragilizar áreas ambientais sensíveis e ampliar desigualdades", alerta. Para o IAB, o instrumento pode intensificar problemas históricos do DF ao estimular parcelamentos de alto padrão em áreas de recarga hídrica e zonas rurais

Tavares também afirma que o plano falha ao lidar com o uso e a ocupação do solo, especialmente nas áreas irregulares onde vive uma parcela significativa da população do DF. Para ele, o PDOT não integra de forma clara a regularização responsável, a proteção de comunidades vulneráveis e o enfrentamento à grilagem — inclusive a vertical. "O despejo não é solução. A cidade precisa de políticas de moradia bem localizadas, com infraestrutura, transporte, trabalho e serviços", enfatiza. 

 

 

Palavra de especialista 

Sâmya Gomes Veloso, professora da Estácio Brasília, Mestre em Engenharia Civil e Urbanista

O Plano Diretor de Ordenamento Territorial (PDOT) do Distrito Federal é um documento pouco conhecido pelo público, mas constitui-se um instrumento imprescindível para o planejamento estratégico das regiões administrativas em termos ambientais, econômicos, sociais e urbanos. Em suma, o objetivo desse documento é estabelecimento de diretrizes que visam ao crescimento ordenado das cidades.

O conhecimento e participação da sociedade no processo de planejamento territorial promove uma sociedade pacífica, justa e inclusiva em todos os níveis.

Em primeiro lugar, é importante destacar que, ao delimitar áreas específicas para conservação, o plano busca atenuar os impactos ambientais decorrentes do desenvolvimento urbano descontrolado e também garantir o direito de usufruto da terra por povos indígenas e comunidades tradicionais. Dessa forma, ele não visa somente proteger recursos naturais, mas também ao reconhecimento do saber original e tradicional de proteger, recuperar e promover o uso sustentável dos ecossistemas.

O PDOT também estabelece diretrizes para o desenvolvimento econômico ao definir zonas adequadas para a instalação de indústrias, comércio e serviços. Essa distribuição planejada é crucial para evitar a concentração excessiva de atividades econômicas em determinadas áreas, o que ocasiona desequilíbrios urbanos significativos. Nessa toada, o PDOT impulsiona o crescimento econômico em locais fora das zonas tradicionais de comércio e indústria, reduzindo a desigualdade socioeconômica.

No que tange às questões sociais, ao prever áreas destinadas à habitação social e à infraestrutura urbana, o plano busca assegurar a padronização de distribuição dos serviços à população, além de buscar o de bem-estar para todas as pessoas, tornando os espaços mais inclusivos, seguros, resilientes e sustentáveis, observado o acesso à cultura e o combate à pobreza.

De forma mais expressa, o PDOT orienta o ordenamento territorial pela consolidação e qualificação da ocupação urbana buscando a regularização fundiária urbana e rural, com foco na integração urbanística e socioambiental plena dos assentamentos informais à cidade. Isso tudo valorizar e proteger o patrimônio cultural e o conjunto urbanístico de Brasília.

O PDOT é um instrumento que supera sua função inicial de ordenar o território e se transforma num instrumento democrático que articula com as demais políticas setoriais, promovendo o desenvolvimento territorial e socioeconômico de todo o Distrito Federal, refletindo as necessidades e aspirações da população para o futuro.

 

Eixos do PDOT

Para organizar o processo de revisão, o governo estruturou o debate em oito eixos temáticos, cada um responsável por orientar análises e propostas específicas:

  • Habitação e Regularização Fundiária: políticas para garantir moradia e avançar em processos de regularização.
  • Gestão de Valorização Social da Terra: instrumentos urbanísticos relacionados à função social da propriedade, uso do solo e recuperação da valorização imobiliária
  • Ruralidades: diretrizes para o desenvolvimento integrado das áreas rurais do DF
  • Território Resiliente: estratégias para fortalecer a capacidade do território de enfrentar eventos naturais e impactos ambientais
  • Meio Ambiente e Infraestrutura: avaliação da capacidade de suporte ambiental e diretrizes para o desenvolvimento sustentável
  • Mobilidade: integração entre mobilidade urbana e ordenamento territorial
  • Desenvolvimento Econômico Sustentável e Centralidades: organização das áreas com concentração de empregos e serviços
  • Participação Social e Governança: mecanismos de gestão democrática e instrumentos para garantir a função social da cidade e da propriedade

 

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DC
postado em 25/11/2025 05:00
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