SEGURANÇA PÚBLICA

Feminicídio e crimes digitais são prioridade, afirma Sandro Avelar

Em entrevista exclusiva ao Correio, o secretário de Segurança Pública, Sandro Avelar, fez um balanço da atuação da pasta em 2025 e destacou quais ações têm sido as que mais necessitam de atenção em sua gestão

O secretário de Segurança Pública do Distrito Federal, Sandro Avelar, fez um balanço das ações desenvolvidas ao longo do último ano e apresentou as prioridades da pasta para 2026. Entre os principais destaques apontados, estão o enfrentamento ao feminicídio e o avanço dos crimes cibernéticos, áreas que, segundo ele, têm exigido mais atenção da pasta. Destacou também a contratação de mais 2 mil agentes de segurança no dia 29.

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Quais crimes têm exigido mais atenção da pasta?

Não há nenhum tipo de crime que não receba empenho da secretaria, mas o feminicídio, os crimes cibernéticos e os crimes violentos letais intencionais têm exigido atenção especial. No DF, todos os casos de feminicídio foram solucionados. Em todos eles, sem exceção, o autor está preso ou morreu, o que demonstra a atuação repressiva e também o investimento em prevenção. Hoje, as próprias delegacias disponibilizam o equipamento Viva Flor, que permite à mulher acionar diretamente as forças de segurança e receber atendimento imediato. Ainda assim, é fundamental o engajamento de outras áreas e da sociedade. Quase 80% das mulheres vítimas de violência não haviam procurado o Estado antes, e a maioria dos casos de feminicídio ocorre dentro de casa. É preciso romper com a cultura de que em briga de marido e mulher não se mete a colher. Temos que intervir, proteger as mulheres e jamais nos omitir.

Entrando nas ações conjuntas, como a segurança do DF tem trabalhado para conter o avanço dos crimes digitais? 

Esse é o tipo de criminalidade que mais cresce no DF. Nós temos fortalecido, sobretudo, a inteligência da Polícia Civil para que faça o combate a esse tipo de criminalidade, que são vários tipos diferentes e precisam ser combatidos com o conhecimento técnico. Tenho defendido, inclusive, a realização de um concurso em que um percentual das vagas seja destinado a profissionais com conhecimento específico, para fortalecer o combate aos crimes cibernéticos. 

Como a inteligência artificial e outras ferramentas digitais podem ajudar no combate ao crime?

O uso de ferramentas digitais é uma realidade. No Conselho Nacional de Segurança Pública e Defesa Social (Conseg), aprovamos uma moção contrária ao entendimento de que a segurança pública não deve utilizar inteligência artificial. As restrições à capacidade de investimento nessa área são, sobretudo, por respeito à Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). Ainda assim, defendemos que a segurança pública precisa, e muito, da utilização da inteligência artificial. Atualmente, essa tecnologia é usada na produção de dados estatísticos, mas queremos ampliar e aprofundar o uso cada vez mais.

Quais são os crimes que registraram queda em 2025?

De forma geral, os crimes contra o patrimônio e homicídios registraram a maior queda. Mas estamos dentro de um desafio interessante, porque, em 2024, os crimes contra a vida atingiram o menor número de toda a série histórica (iniciada há 40 anos). Em 2025, temos números muito próximos, mas é uma meta difícil de ser alcançada, sobretudo porque nós tivemos uma situação excepcional na comunidade terapêutica (que pegou fogo no Paranoá), em agosto, quando ocorreram seis homicídios em um só evento. Talvez isso venha a nos impedir de ter uma redução em cima do que foi o ano passado. Mas, de toda forma, temos hoje as menores taxas de homicídio do Brasil. 

Há um avanço em todo o país de facções criminosas, que cobra uma ação conjunta dos estados e municípios. Como fazer essa articulação? Um modelo como o "SUS da segurança pública" pode ser o caminho?

No DF, temos conseguido controlar o avanço do crime organizado porque, uma das características das organizações, é a tomada de território que as facções costumam fazer. Isso acontece em outros estados, mas aqui, no DF, não existe nenhum lugar em que as nossas polícias não entrem, garantindo que tenhamos esse controle. Houve uma uma preocupação sobre o possível avanço das facções criminosas quando foi inaugurado o quinto presídio federal (no complexo da Papuda), que tem a essa natureza específica de receber lideranças perigosas, mas temos feito um trabalho muito forte, no qual temos produzido muitas informações de inteligência, geradas de dentro dos presídios. No governo Temer, o então ministro da Segurança Pública, Raul Junqueira, propôs a criação do Sistema Único de Segurança Pública (Susp), nos moldes do SUS. É algo muito positivo, mas que demanda coordenação por parte do governo federal, respeitando as peculiaridades de cada estado. Ao mesmo tempo em que os estados têm que ter autonomia para gerenciar as suas políticas de segurança, o governo federal tem que assumir esse papel de protagonista na coordenação do todo. 

Recebemos o relato de uma moradora da 710/711, da Asa Norte, que precisou chamar a Polícia Militar para poder entrar em casa, pois pessoas em situação de rua a ameaçavam. Sabemos que essa questão exige uma atuação mais ampla, mas, quais ações a polícia tem feito para mitigar ou amenizar
esse problema?

Esse problema exige o envolvimento do Judiciário, sobretudo das instâncias superiores, porque decisões que restringem a atuação policial e da área de desenvolvimento social acabam gerando na população uma sensação de insegurança, por serem entendidas como permissivas. A questão não pode ser tratada apenas como um problema de segurança pública, já que a polícia atua dentro da legalidade e cumpre determinações judiciais. Um dado preocupante é o aumento dos homicídios entre a população em situação de rua. Com restrições às abordagens policiais, pessoas mal-intencionadas acabam se valendo desse entendimento para portar armas brancas. Atualmente, cerca de 70% dos homicídios na região metropolitana do DF envolvem vítimas e autores em situação de rua. Vivemos um momento delicado, em que se espera a atuação da polícia, mas o policial acaba inibido, receoso de ultrapassar uma linha muito tênue entre o que é legal e o que pode ser interpretado como abuso.

Como preservar o centro da cidade de pequenos delitos e, dessa forma, dar mais segurança aos moradores e turistas que vêm até Brasília?

Criamos muitas cotas do serviço voluntário para poder ter uma quantidade maior de policiais nas ruas. Temos investido em tecnologia, como câmeras espalhadas pelo centro da área para podermos contar com essas imagens tanto para prevenir o crime e medir a atuação do criminoso, mas também no sentido repressivo, de se identificar a autoria de eventuais casos que aconteçam e sejam rapidamente presos.

Temos uma segurança pública de referência no Brasil, mas por que a sensação de insegurança das pessoas ainda preocupa?

Um dos fatores é o aumento da população em situação de rua, que cria uma ideia de falta de controle e isso gera, efetivamente, sensação de insegurança. Mesmo que, no geral, os números da segurança aqui têm sido muito bons. Por exemplo, em 2014, nós tivemos 80 latrocínios. Em 2024, oito. É uma redução de 90% deste tipo de crime. Mas, quando acontece, ainda é algo que choca a todos e pode passar a ideia de que esse crime esteja acontecendo continuamente. A população demonstrar preocupação é absolutamente normal e o nosso papel é ter policiamento na rua e investir em tecnologia, câmeras e equipamentos que transmitam o sentimento de segurança.

Quais são os gargalos da segurança pública do DF?

Temos trabalhado para aumentar o efetivo. Vamos nomear, no próximo dia 29, mais de 2 mil policiais, entre militares, civis e penais, em um processo de retomada das forças de segurança do DF. Quando estive à frente da SSP, entre 2011 e 2014, o DF contava com cerca de 16 mil policiais militares, para uma população de 2,5 milhões de habitantes. Ao retornar ao cargo, encontrei a corporação com menos de 10 mil policiais. Hoje, estamos voltando ao patamar de aproximadamente 12 mil agentes.

A saúde mental das forças de segurança é um dos aspectos que o senhor abordou na gestão de 2025. Quais foram os avanços e o que pode ser feito para que nossos policiais tenham qualidade de vida e que suas questões pessoais não afetem o trabalho diário?

Tentamos garantir aos policiais as melhores condições de trabalho, com atenção especial à valorização remuneratória. As corporações estavam defasadas em comparação a outros estados, e defendemos a equiparação com a Polícia Federal. Além do reconhecimento profissional, adotamos políticas voltadas à preservação da saúde física e mental dos policiais, carreiras que sofrem desgaste constante. É fundamental que a sociedade acolha o policial como parte da própria comunidade. No DF, trabalhamos com o conceito de segurança pública integral, previsto no artigo 144 da Constituição, que estabelece que a segurança é dever do Estado, mas responsabilidade de todos. Nesse sentido, criamos estruturas de atendimento biopsicossocial nas corporações e, na Secretaria de Segurança Pública, implantamos o Centro de Atendimento Biopsicossocial (CAB), com oferta de apoio psicológico, fisioterapia, atividades físicas monitoradas e incentivo à prática esportiva. Também adotamos a transparência como princípio, por acreditarmos que a divulgação de dados fortalece a confiança da população e reforça que a segurança pública é construída de forma coletiva, com a participação da sociedade, de outros órgãos e do setor privado.

 

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