Música

Clodo Ferreira lança o álbum 'Calendário', escrito para trio de sopros

Trabalho foi gravado pelo grupo Nós na madeira, formado por Sidney Maia, Fernando Machado e Cristina Porto

 Clodo,  Cristina Porto, Fernando Machado e Sidney Maia, do grupo Nós de madeira -  (crédito:  Marcel Papa/Divulgação)
Clodo, Cristina Porto, Fernando Machado e Sidney Maia, do grupo Nós de madeira - (crédito: Marcel Papa/Divulgação)
postado em 16/04/2024 06:00 / atualizado em 16/04/2024 10:17

O nome de Clodo Ferreira está colado a algumas canções de sucesso como Revelação e Cebola cortada. Mas o que poucos sabiam é que, há mais de 30 anos, secretamente, ele escrevia partituras para música instrumental. Depois de muito tempo, Clodo venceu a timidez e resolveu lançar o álbum Calendário, que reúne 14 composições para trio de sopros. O álbum foi gravado pelo grupo Nós na madeira, formado por Sidney Maia, Fernando Machado e Cristina Porto. A direção musical é de João Ferreira, filho de Clodo. No  videoclipe de lançamento o artista plástico Darlan Rosa utilizou a composição do mês de abril para fazer uma homenagem a Brasília. E, nesta entrevista, Clodo explica como se tornou um compositor de peças instrumentais e como Brasília impactou a sua formação musical.

  •  Clodo,  Cristina Porto, Fernando Machado e Sidney Maia, do grupo Nós de madeira
    Clodo, Cristina Porto, Fernando Machado e Sidney Maia, do grupo Nós de madeira Marcel Papa/Divulgação
  •  Clodo com o filho João Ferreira
    Clodo com o filho João Ferreira Fotos: Marcel Papa/Divulgação
  • O álbum foi gravado no estúdio do Natiruts
    O álbum foi gravado no estúdio do Natiruts Marcel Papa/Divulgação

Como surgiu o projeto de fazer música instrumental depois de compor tantas canções populares?

Olha só, eu faço essas partituras há mais de 30 anos, mas nunca tive coragem de mostrar. De repente, mostrei para algumas pessoas, e elas acharam que estava muito bom. É um pouco erudita, então existe uma avaliação mais criteriosa. Eu tinha esse pudor. Agora, me entusiasmei vou deslanchar outros projetos. Tenho peças para quarteto de cordas, piano e flauta. Tenho composições só para piano. Há uns dois ou três anos, o grupo Nós nas madeiras, do Sidney Maia, propôs a gente fazer uma apresentação ao vivo na Casa da Cultura Brasília, da Janete Dornelas. Ficamos entusiasmados com o resultado. Daí nasceu a vontade de registrar o trabalho em disco. João, meu filho, fez a direção musical, gravamos no estúdio do Natiruts, Zero Neutro, cedido gentilmente.

Como você se tornou um compositor de música instrumental?

Na área de escrever músicas, sou autodidata. Utilizo um programa para escrever, você escreve e ouve a música. Com isso, fui fazendo as partituras e guardando. Cheguei a estudar dois anos na Escola de Música, durante a década de 1980, ia tocar clarineta, mas desisti, não dei conta.

Qual a diferença entre compor canções populares e escrever canções instrumentais?

A parte poética e da música popular faço dentro de um repertório desejado das canções de que aprecio. Gosto de Beatles, de Caetano. Tenho o gosto pela música de rádio, sempre me atraiu muito. Agora, esse trabalho é outro caminho. É mais sonoro do que vinculado à poética, é uma outra poética. É um exercício de abrir mão da palavra e expressar um sentimento e uma percepção.

E como é a ideia de fazer uma música para cada mês? Como traduzir o espírito do mês com uma linguagem tão abstrata quanto a música?

Comecei a fazer as músicas ainda sem esse projeto. O projeto foi se impondo quando pensei em trio de sopro. Vi que podia se encaixar na primavera. Vivaldi fez Quatro estações, Hermeto fez uma música para cada dia do ano. Vi que poderia vinculá-las a um mês do ano. Isso acontece de uma forma inteiramente intuitiva.

Mas existem algumas referências para te orientar?

O mês de junho lembra São João, tem uma levada de quadrilha. A primavera lembra algo florescente, mais alegre. É muito subjetivo. Alguns meses me parecem mais graves. Não sei se porque aconteceram coisas em agosto. Maio é algo mais florido. Fui associando essa subjetividade que cada época do ano traz para a gente. Mas, repito, que não comecei com calendário. Só depois, descobri essa possibilidade.

Qual a sua primeira visão de Brasília?

A visão, por coincidência, é a mesma do Climério. Viemos ambos de avião, com diferença de uns quatro anos. Saí no final da tarde e cheguei no início da noite. A diferença visível era visível entre a luz humilde de Teresina e o colar de luzes impressionantes de Brasília. Eu tinha 13 anos de idade. Fui morar em Taguatinga, onde fiquei por três anos.

Qual o legado de Taguatinga em sua formação?

Foi a música. Lá, estudei no Cemab, junto com o Riba, do Placa Luminosa, aos 14 anos. Toquei em um conjunto do Riba, chamado Os Quadradões, devia ser 1967 e 1968. Tive de sair porque eu fiz 16 anos e não podia tocar à noite com essa idade. Antes, fiz uma dupla, imitando Leno e Lilian. Era Clodo e Ana. A gente se apresentava em uns programas de tevê, na TV Nacional e na TV Brasília.

Nesta época, havia muita vida musical em Taguatinga?

Sim, lá havia muitas bandas. Eu e o Riba brincávamos que Taguatinga era quase Liverpool, tinha muitas bandinhas de jovens. A gente saía sem rumo para rua e entrava de penetra nas festas. Tocava mais com Os Quadradões. Depois, comecei a compor com 15 anos.

Como eram essas composições?

Eu era coringa, fazia letra para o Clésio e música para o Climério. Na época, eu tinha muita influência da Jovem Guarda e da Tropicália.

É possível afirmar que Revelação tem algo do clima de Jovem Guarda?

A melodia é do Clésio, a letra é minha. Acho que a letra já tinha uma linguagem, pós-Bob Dylan, pós-Beatles, uma influência internacionalizante. A levada que identifica vem de outro momento.

E, no Plano Piloto, o que te marcou?

No Plano Piloto, o que marcou nesta época foi o Festival do Ceub, em 1972. Concorri com duas músicas, Placa luminosa, minha e do Zeca Bahia, colega da 312, e Sino, sinal aberto, só minha. Quem defendeu as duas músicas foi o grupo Matuskelas. O disco da banda Matuskelas foi relançado pela Sony. Foi lá que conheci Fagner, que fazia parte do júri. E isso foi muito importante para impulsionar a minha carreira.

O que te agrada em Brasília?

O que agrada é que Brasília tem uma forma de sociabilidade que não depende de a gente ficar junto o tempo todo com os amigos. Isso é diferente de outras cidades. Você conhece uma pessoa e se não a vê  todo o tempo, a amizade é a mesma. Eu acho que como Brasília é uma cidade setorizada, as pessoas nem sempre se encontram com facilidade, ficam um ano sem se ver, mas isso não arrefece a amizade.

E o que te incomoda em Brasília?

É Brasília ser vista como a capital da política e dos políticos. Me entristece porque não é verdade. Aqui tem milhões de pessoas que não são políticos. Há muitos artistas, a cidade tem uma vida cultural muito interessante e muito rica.

Você compôs várias canções de sucesso. Mas você continua compondo?

Sim, componho regularmente. Faço parcerias com gente de Brasília com amigos de fora, usando a internet. A música faz parte de minha vida.

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