Cinema

Bruno Gagliasso fala sobre as motivações para fazer o filme 'Honestino'

Em entrevista exclusiva ao Correio, Bruno Gagliasso, que interpreta o estudante da UnB e presidente da UNE no cinema, destaca que "memória é parte integrante da justiça"

 Bruno Gagliasso, caracterizado, em detalhe do poster do longa Honestino -  (crédito: Cadu Ibarra/CB/D.A. Press)
Bruno Gagliasso, caracterizado, em detalhe do poster do longa Honestino - (crédito: Cadu Ibarra/CB/D.A. Press)

Movido por uma "força serena", afirmada na humanidade, o ator Bruno Gagliasso conta ter reanimado, com o longa Honestino, momentos marcantes na vida do presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE) que, militante durante a ditadura, passou por prisões até ser sequestrado, em 1973, torturado, assassinado e dado como desaparecido.

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O destino do estudantes da Universidade de Brasília (UnB) Honestino Monteiro Guimarães, aos 26 anos, é retratado no filme-documentário híbrido comandado pelo diretor Aurélio Michiles, e produzido por Nilson Rodrigues (da Mercado Filmes). O misto de narrativa — que, pela montagem, garantiu prêmio para André Finotti, no recente Festival do Rio — agradou em cheio ao intérprete Gagliasso. "Acho que (a linguagem mista) aproxima muito o público da história que foi vivida e que tentaram calar", pontua.

Diretor sempre empenhado no resgate de fatos históricos (como os longas O cineasta da selva e Segredos do Putumayo), Michiles se apoiou em livros como Honestino, o bom da amizade é a não cobrança (de Maria Rosa Leite Monteiro, mãe de Honestino) e ainda em cartas e poemas escritos pelo militante. 

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No combate a atitudes fascistas atuais, Michiles vê o material de cinema como catalisador à "necessidade de reação" e enfrentamentos. Com direito a depoimento da biógrafa do líder estudantil, Beth Almeida (autora de Paixão de Honestino), o filme ainda traz contribuições como as do cineasta Jorge Bodanzky (ex-aluno e professor da UnB) e do jornalista Franklin Martins. Entre as vozes contundentes, Gagliasso se pronuncia: "Para mim, ser neutro, é o famoso ficar em cima do muro — nada mais é do que ter escolhido um lado, e estar do lado do opressor, e não do oprimido". Depois do sucesso no Festival do Rio, o lançamento nacional do filme está previsto para maio do próximo ano.

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Entrevista// Bruno Gagliasso, ator

A que qualidades de Honestino você se ateve?

Coragem, integridade e principalmente empatia. Ele era uma pessoa que acreditava profundamente nas pessoas. Ele unia, ao invés de dividir. E tentei trazer essa força dele, uma força serena, mas de um cara que enfrentava o impossível, mas com humanidade.

Como vê o misto de documentário e ficção numa mesma obra?

Acho muito forte. É uma mistura que rompe fronteiras. Há a verdade do documentário, que ganha com mais emoção. E a ficção, acho que se fortalece e traz para o agora essa história real. Isso aproxima muito o público da história que foi vivida e que tentaram calar. Você não precisa escolher entre a verdade e a arte. Você embarca. É muito potente, principalmente pela forma com que o Aurélio Michiles (diretor) conduziu essa simbiose entre verdade e e ficção.

Quem próximo a ele te abasteceu de dados e elementos para a interpretação?

O Aurélio (cineasta), sem sombra de dúvidas, companheiro de militância, um cara com os mesmos princípios éticos, com a mesma força serena e um grande diretor. Eu conheci a família e os amigos do Honestino depois, e durante as filmagens. É uma história muito forte. E que estava dentro de mim. É isso que eu busco, são histórias assim que gosto e quero contar. Fui (na construção do personagem) pelo afeto e pela dor. Acho que foi um afeto e uma dor que me ajudaram a entender o homem Honestino. O ser humano honesto que está por trás de tudo que ele representa: este símbolo de luta pela liberdade, por educação e por democracia.

Qual a sua relação com Brasília e como passou o período das filmagens?

Brasília é um personagem muito forte no filme. Para mim, foi um encontro. Acho que um reencontro. Você sente o peso que Brasília tem, o peso histórico. E, ao mesmo tempo, você sente a energia pulsante. A cidade é jovem. Durante a filmagem, foi muito intenso, um mergulho muito grande, muita emoção, a gente filmou dentro da Universidade de Brasília, tudo que o Honestino passou, e a gente mostra no filme o que aconteceu ali; então, estava filmando onde tudo aquilo tinha acontecido, e sendo dirigido por quem vivenciou aquilo ali dentro!

Quais as suas leituras cotidianas?

Não tem como não ler sobre política. É o hoje; o que está. Está estampado não só nos jornais, na televisão, mas nas redes sociais também. Então, leio política — leio, e gosto, de filosofia. Gosto muito de natureza. Eu gosto muito de ler sobre histórias reais. Gosto de texto que me provoque. Que me tire do meu lugar comum, que me faça querer fazer diferença. Tudo isso me puxa para uma leitura de resistência. De luta. Eu acho que é por isso que o Honestino acabou chegando à minha mão como chegou. Não é o primeiro filme que faço sobre ditadura, sobre o período tenebroso que a gente viveu. Fiz Marighella, só que eu estava do outro lado. Estava (em cena, como o delegado Lúcio, baseado no policial Sérgio Fleury) do lado da escória e não do lado certo da história, como eu estou agora com Honestino.

Como vê a revisão de nomenclaturas para monumentos como a Ponte Honestino, no DF?

Importante! Acho que nomear e reconhecer é um ato político e também, muito simbólico. É decidir o que a gente é: falar sobre o que a gente quer lembrar, e falar do que a gente não quer repetir. Eu acredito que memória é parte integrante da justiça. É isso: memória é fazer justiça.

Quais são causas mais urgentes contemporâneas na sua visão? Honestino é inspirador?

Ele é, por representar a defesa da democracia. É a luta da verdade, da justiça social. O Honestino lutou exatamente por três principais coisas. Lutou por um país livre, pela educação e pela democracia. Sim, essa luta continua. Essa luta é constante, e é muito inspiradora. Ele lembra a gente, a todo instante, que liberdade não é um direito dado — é uma conquista. É uma conquista diária. A gente precisa lutar todo dia e o tempo todo por ela. Tem sempre alguém querendo te tirar isso. Então, a gente precisa ter consciência sobre sobre a história. O nosso filme é um filme sobre o presente, não é só sobre o passado. E o Honestino falava isso. Acho que é por isso que a gente fala que nosso filme é muito para os jovens. O Honestino falava que os jovens não são futuro, os jovens são o presente.

 


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postado em 19/10/2025 06:00
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