São Paulo – Apesar de o dólar ter andado mais enfraquecido frente à várias moedas nos últimos dias, inclusive o real, por conta do afrouxamento da política monetária do Federal Reserve (Fed, banco central dos Estados Unidos), que começou a cortar os juros na última reunião do comitê de política monetária da instituição (Fomc, na sigla em inglês), neste ano, dificilmente ele poderá contribuir para uma antecipação do início do ciclo de cortes de juros da taxa básica da economia (Selic), atualmente em 15% ao ano.
Essa é a avaliação do economista-chefe do Itaú Unibanco, Mário Mesquita. “O dólar precisa ir para R$ 5 para criar espaço para um corte antecipado da taxa de juros básica, além de sinais mais claros de desaceleração da economia”, afirmou o especialista, a um grupo de jornalistas que participou da cobertura do evento Macrovision 2025, realizado pelo BBA Itaú, nesta segunda-feira (29/9), em São Paulo.
Na semana da reunião do Fomc e o Comitê de Política Monetária (Copom), do BC brasileiro, nos dia 16 e 17 de setembro, o dólar chegou a ser negociado abaixo de R$ 5,30, mas voltou a ficar acima desse patamar, tanto que, na tarde desta quinta, era negociado em torno de R$ 5,32 para a venda. Conforme as projeções do Itaú Unibanco, a divisa norte-americana deverá encerrar este ano cotada a R$ 5,35 e, no ano que vem, em R$ 5,50.
“Haverá mais corte de juros nos EUA do que no Brasil”, frisou. Ele lembrou que a atividade ainda não dá sinais de que está desacelerando em um ritmo que o Banco Central espera para mudar o rumo atual da política monetária. Para o ano que vem, o Itaú e o BC estimam crescimento do PIB de 1,5%, mas Mesquita alertou que há um “viés de alta”, porque não foi incluído o aumento de gastos do governo que sempre acontece em ano eleitoral, e, com isso o PIB poderá crescer em torno de 2%. Para este ano, o BC prevê avanço de 2% no PIB brasileiro. Enquanto isso, o Itaú prevê avanço de 2,2%.
Pelas contas de Mesquita, a taxa real (descontada a inflação) neutra no país — que é quando o é de 6% ao ano, chegando a 5%, em algumas estimativas do mercado. Isso quer dizer que, se a Selic ficar abaixo desse patamar, consegue estimular a economia, e, acima disso, segue contracionista, ou seja, freando a atividade.
Essa taxa neutra já foi menor, de 3% ao ano, quando vigorou o teto de gastos, ou seja, quando o mercado tinha mais credibilidade na política econômica do governo do que atualmente. “Isso mostra a perda de potência da política monetária por conta da política econômica mais expansionista e ajuda a explicar o porquê de a taxa de juros neutra e a de juros nominal serem tão altas no Brasil”, explicou.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e o presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, participaram do evento do Itaú voltado para funcionários e clientes das instituições do grupo. Na avaliação de Mesquita, o Banco Central só deverá iniciar o corte de juros em janeiro de 2026.
“O Banco Central está naquela situação em que a política monetária afeta primeiro a atividade e depois a inflação e que ainda não estão recuando no ritmo esperado”, afirmou ele ao comentar o discurso de Galípolo reforçando que o BC seguirá com cautela monitorando o cenário econômico antes de flexibilizar a taxa Selic. “A gente acha que é mais provável que isso aconteça (o início do ciclo de corte de juros) no primeiro trimestre do ano que vem”, acrescentou.
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Meta fiscal
Em relação às declarações do ministro Haddad ter afirmado que pretende cumprir a meta fiscal, Mesquita demonstrou desconfiança em relação à capacidade de o governo realmente entregar um resultado primário dentro da meta se ele não continuar realizando descontos de gastos da conta, como precatórios. “A intenção do governo é de resolver a meta e de outro lado, com iniciativas para tirar gastos da conta, mas o que importa é o gasto efetivo, e não o que não está na conta do arcabouço fiscal”, explicou.
Haddad também minimizou a decisão do Tribunal de Contas da União (TCU) da semana passada, que indicou que o governo não pode perseguir o piso da meta, e sim o centro do objetivo fiscal. Na avaliação de Mesquita, o que o ministro mostrou foi que há diferenças de interpretações entre o Executivo e o TCU. E, portanto, essa questão “não está resolvida”.
Na avaliação do economista do Itaú, o próximo governo terá um desafio grande pela frente que será enfrentar três importantes problemas fiscais: a vinculação das pensões e aposentadorias ao salário-mínimo, a rigidez dos gastos com saúde e educação e os gastos tributários, que precisam ser reavaliados antes de serem renovados anualmente.
