
Diante das investigações da Polícia Federal (PF), que apura indícios de possíveis condutas de gestão fraudulenta de dirigentes do Banco de Brasília (BRB) durante a operação de compra do Banco Master, surgem questionamentos sobre se os vencimentos ou as aposentadorias de servidores do governo do Distrito Federal serão prejudicados.
Embora a Operação Compliance, que prendeu, na semana passada, o presidente do Banco Master, Daniel Vorcaro, e afastou o então presidente do BRB, Paulo Henrique Costa, apure crimes de gestões temerária e fraudulenta, a advogada Deborah Toni, sócia fundadora do Deborah Toni Advocacia (DTA/DF), argumentou que os funcionários públicos do DF terão seus salários garantidos pelo Tesouro do Distrito Federal (DF).
A especialista em direito público, no entanto, recomendou que, diante da crise no Banco de Brasília, os servidores distritais exijam do governo do Distrito Federal "a divulgação completa e auditada da situação financeira do banco (BRB), dos passivos ocultos e dos riscos reais aos quais os fundos de previdência estão expostos".
Qual é a exposição dos servidores públicos à crise do BRB? Considerando que o BRB é estatal e atende muitos servidores do DF, até que ponto a eventual perda patrimonial ou fragilização financeira do banco pode afetar os benefícios, salários, previdência ou planos vinculados ao banco?
A exposição do servidor público do DF existe, mas é indireta em relação aos seus direitos estatutários básicos. Os salários e os benefícios regulares são garantidos pelo Tesouro do Distrito Federal (DF) e têm natureza jurídica de direito público, não dependendo do patrimônio do BRB. A fragilização do banco, contudo, pode afetar:
- Fundos de Previdência (Risco Principal): O risco mais significativo reside na gestão dos fundos de pensão e do Instituto de Previdência dos Servidores do DF (IPREV-DF), especialmente se estes fundos investiram em produtos de alto risco ou tiveram exposição a operações financeiras questionáveis do grupo BRB. Se o BRB é acionista ou gestor desses recursos, a desvalorização ou má gestão pode comprometer o patrimônio que garante as aposentadorias futuras.
- Serviços e Crédito Consignado: A saúde financeira do BRB é essencial para a concessão de crédito consignado e a manutenção da qualidade dos serviços bancários (recebimento de salários, contas correntes). Uma crise prolongada pode levar a um encolhimento da oferta de crédito ou à deterioração dos serviços.
- Investimentos Pessoais: Servidores que possuem poupanças, investimentos ou títulos no BRB (como Certificados de Depósito Bancário - CDBs) estão protegidos pelo Fundo Garantidor de Créditos (FGC), dentro do limite de R$ 250 mil por CPF. Perdas acima deste valor estariam sujeitas a um processo de liquidação.
Quais mecanismos do direito público (controle interno, prestação de contas, tribunal de contas, improbidade administrativa) podem ser acionados para responsabilizar os gestores?
O Direito Público, através de seus diversos mecanismos de controle, possui ferramentas robustas para responsabilizar os gestores do BRB, dado seu caráter de instituição controlada pelo poder público do DF:
- * Tribunal de Contas (TCDF e TCU): O Tribunal de Contas do DF (TCDF) é o principal fiscalizador. Pode instaurar Tomada de Contas Especial (TCE) para apurar a ocorrência de dano ao erário decorrente de má gestão, desvio de recursos ou operações fraudulentas. Os gestores podem ser condenados ao ressarcimento integral do prejuízo (débito) e aplicação de multas, além de ficarem inabilitados para o exercício de cargo em comissão. O TCU pode atuar caso haja envolvimento de recursos federais.
- * Improbidade Administrativa: O Ministério Público e o DF podem ajuizar Ações por Ato de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429/92), visando punir os gestores por atos que geraram prejuízo ao erário (art. 10) ou violação dos princípios da administração (art. 11), como a lealdade às instituições e a moralidade. As sanções incluem a perda da função pública, suspensão dos direitos políticos e indisponibilidade de bens.
- * Controle Interno e Compliance: A própria estrutura de Controle Interno do BRB tem o dever legal de identificar e reportar irregularidades. A falha ou omissão nesse dever pode levar à responsabilização dos auditores e membros dos conselhos de administração e fiscal por omissão no dever de fiscalizar (responsabilidade solidária).
- * Responsabilização Penal: Em casos de crimes contra o sistema financeiro, peculato ou gestão fraudulenta, o Ministério Público e a Polícia Federal conduzem a Ação Penal para punição criminal.
O que pode ser feito para proteger os servidores?
A proteção dos servidores passa, primariamente, pela exigência de transparência rigorosa e pelo fortalecimento da governança do banco:
- * Restruturação da Governança: O Governo do DF, como controlador, deve garantir a substituição dos gestores envolvidos em irregularidades por quadros técnicos e idôneos, além de exigir a reestruturação dos departamentos de riscos e compliance do BRB.
- * Fiscalização Concentrada no IPREV-DF: É fundamental que os órgãos de controle (TCDF e CLDF) e o próprio Sindicato acompanhem de perto a carteira de investimentos do IPREV-DF, exigindo a desvinculação ou reavaliação imediata de qualquer ativo de risco atrelado a operações questionáveis do BRB ou de seus parceiros.
- * Exigência de Transparência: Servidores têm o direito de exigir do BRB e do GDF a divulgação completa e auditada da situação financeira do banco, dos passivos ocultos e dos riscos reais aos quais os fundos de previdência estão expostos.
Quais medidas legais os servidores e sindicatos podem adotar agora para resguardar seus interesses? Diante das denúncias da Operação Compliance Zero e do risco à saúde financeira do BRB, os servidores podem judicializar o caso (ações coletivas ou representações junto a tribunais de contas), pedir transparência e fiscalização mais rígida, ou pressionar por comissões de investigação?
Todas essas medidas são legítimas e cruciais sob o prisma do Direito Público. A atuação deve ser simultânea nos campos judicial, administrativo e político:
- * Judicialização (Ações Coletivas): Os Sindicatos e associações de servidores possuem legitimidade para ingressar com Ação Civil Pública para defender os direitos coletivos e individuais homogêneos da categoria, buscando o ressarcimento de perdas em investimentos ou a anulação de atos de má gestão que afetem os benefícios. A Ação Popular também é uma ferramenta cível disponível a qualquer cidadão (servidor) para anular atos lesivos ao patrimônio público.
- * Representação e Controle Administrativo: Formalizar Representações e Denúncias junto ao TCDF é a medida administrativa mais direta para forçar a atuação do controle externo. O TCDF, por sua vez, tem o poder de impor medidas cautelares, como o afastamento de gestores e o bloqueio de bens, para evitar maiores prejuízos.
- * Pressão Política (CPI): A pressão sobre a Câmara Legislativa do DF (CLDF) para a instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) é um instrumento político poderoso. A CPI tem o poder de investigação de autoridades, convocação de testemunhas e quebra de sigilo, dando a necessária publicidade e visibilidade ao escândalo e potencializando o impacto das investigações do Ministério Público e da Polícia.
A combinação estratégica desses instrumentos é o caminho mais eficaz para o funcionalismo proteger seu patrimônio e garantir a responsabilização dos envolvidos na crise do BRB.

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