OPERAÇÃO POÇO DE LOBATO

Operação Poço de Lobato: como ocorreu o cerco aos maiores sonegadores do país

Investigações de vários órgãos revelam esquema doméstico e nos EUA do Grupo Refit, que deixou de pagar R$ 26 bi de impostos

Um dos maiores devedores do país. Foi com essas palavras que o secretário-especial da Receita Federal, Robinson Barreirinhas, descreveu o Grupo Refit, que, há poucos anos, era conhecido como Refinaria de Manguinhos, uma das principais empresas no setor de combustíveis e que atuava somente no Rio de Janeiro. Com o passar dos anos, a companhia mudou de nome e passou a administrar um grande conglomerado formado por holdings e empresas sobrepostas em âmbito nacional e internacional.

A Operação Poço de Lobato — que tem esse nome em referência ao primeiro poço de petróleo perfurado no Brasil, em 1939, no bairro Lobato, em Salvador — foi deflagrada, na manhã de ontem, pela Polícia Federal e uma série de outros órgãos. Foram cumpridos 126 mandados de busca e apreensão aos supostos envolvidos no esquema em quatro estados (São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Bahia) e no Distrito Federal. O grupo teria sido responsável por uma dívida de R$ 26 bilhões devido ao não pagamento de tributos.

De acordo com as autoridades, o grupo mantinha relações com outras empresas investigadas na Operação Carbono Oculto, deflagrada em agosto deste ano e que também mirou empresas do setor de combustíveis. Do segundo semestre de 2024 ao primeiro deste ano, o grupo movimentou mais de R$ 72 bilhões, por meio de empresas próprias, fundos de investimento e offshores, com o objetivo de ocultar lucros.

editoria de arte - esquema megaoperacao

Segundo a Receita, a blindagem dos recursos fraudulentos ocorria por meio de uma grande operadora financeira que atuava como sócia de outras instituições que também prestavam serviços ao grupo. A empresa maior seria uma espécie de "mãe", enquanto que as menores que eram controladas pela principal seriam as "filhas".

A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) e o Comitê Interinstitucional de Recuperação de Ativos do Estado de São Paulo (Cira/SP) bloquearam mais de R$ 10,2 bilhões em bens dos envolvidos na operação, como imóveis e veículos, como medida cautelar. Antes da megaoperação de ontem, ainda no âmbito da Operação Carbono Oculto, o Fisco reteve quatro navios que continham aproximadamente 180 litros de combustíveis. Por conta disso, a refinaria do grupo foi interditada pela Agência Nacional de Petróleo (ANP), que identificou uma série de irregularidades.

Lavagem de dinheiro

Com dinheiro de formuladoras e distribuidoras vinculadas ao grupo, importadoras atuavam como terceiros para lavar dinheiro e sonegar impostos na compra de diesel, nafta e hidrocarbonetos de fora do país. Desde 2020, o Fisco identificou a importação de mais de R$ 32 bilhões em combustíveis que eram declarados como "derivados de petróleo para industrialização", e não "gasolina importada". As investigações também apontaram a falta de provas do processo de refino e indícios de uso de aditivos químicos não autorizados pela regulamentação.

O Grupo Refit ainda movimentava recursos no exterior por meio de empresas offshore. As investigações sobre o caso apontam que entidades criadas no estado de Delaware, nos Estados Unidos — conhecido paraíso fiscal — que operavam como sócias e cotistas e tinham os mesmos representantes que empresas vinculadas ao grupo no Brasil.

As investigações da Receita apontam que, por meio da aquisição de uma exportadora em Houston, a Refit importou mais de R$ 12,5 bilhões em combustíveis. Além disso, 50 empresas offshore que remetem recursos para a compra de participações e imóveis no Brasil já foram identificadas nos EUA, o que totaliza aproximadamente R$ 1 bilhão.

Em entrevista a jornalistas ontem, Barreirinhas comemorou o sucesso da operação e da atuação com outros órgãos federais, como a Polícia Federal e o Ministério Público, além de estaduais, como as polícias civis. O secretário lembrou que, nos últimos meses, o órgão apreendeu a carga de cinco navios carregados com derivados de petróleo que desembarcaram no Brasil por meio de uma interposição fraudulenta que envolve o mesmo grupo. Além disso, também destacou que foi a primeira vez "em muito tempo" que uma ação da Receita não foi barrada por liminares da Justiça.

"Isso foi feito pela forma como estamos atuando, com muita transparência, com cooperação, levando rapidamente ao judiciário as informações e mostrando aos juízes o que está em jogo aqui. É uma forma diferente que deve continuar a ser utilizada nesse tipo de operação", comentou. Ele disse, ainda, que a parceria entre Receita e PF deve se intensificar após essa operação. "Nós estamos fechando o cerco daqueles que lá do andar de cima, que lá da Faria Lima, que lá de suas mansões em Miami e na Europa corroem a segurança pública do Brasil e traz indignação e desespero à população brasileira. Nós vamos mudar isso", acrescentou

Na mesma entrevista, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), destacou que, somente em seu estado, o Refit mantinha uma dívida ativa de impostos de R$ 9,6 bilhões e comparou esse valor com o aumento do custeio do governo de São Paulo com a saúde pública em 2025, que foi de R$ 10 bilhões. "Essas pessoas se especializaram em não pagar tributo", afirmou.

Mentor

O Grupo Refit é controlado pelo empresário paulistano Ricardo Magro, de 51 anos, que, desde 2016, mora em uma área nobre de Miami, nos Estados Unidos. A empresa esteve sob uma série de investigações tributárias e disputas com distribuidoras e órgãos de fiscalização nos últimos anos. Sobre o rótulo de "maior devedor contumaz de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) do país", ele disse que isso se resume a uma suposta perseguição institucional promovida por grandes empresas do setor.

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Diante do contexto da megaoperação deflagrada ontem, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, defendeu a aprovação do projeto de lei (PL) do devedor contumaz, que endurece as regras para as empresas reincidentes na sonegação de impostos. Haddad considera que a lei está "muito equilibrada" e disse que o texto vem para separar o "joio do trigo". Sobre o uso de fundos offshore nos EUA, o ministro disse que levou ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, junto com o ministro Ricardo Lewandowski, a necessidade de incluir na pauta de negociações bilaterais no combate ao crime organizado por meio de empresas offshore. As investigações da Receita apontaram que, por meio da aquisição de uma exportadora em Houston, o Refit importou mais de R$ 12,5 bilhões em combustíveis.

 

 

 

 

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