Rio de Janeiro — Os Jogos Olímpicos levaram 124 anos para que o número de mulheres competindo se igualasse ao de homens. Na edição de Paris-1900, elas representavam 2% dos atletas. Na versão de 2024 do megaevento, justamente na Cidade Luz, eram a metade. O cenário é de evolução, mas existe um porém: há poucas treinadoras por trás das conquistas e dos principais nomes do esporte mundial. O Brasil não está alheio ao problema.
O Comitê Olímpico do Brasil (COB) monitora o cenário. O tema, inclusive, foi debatido durante o Fórum Mulher no Esporte, nesta terça-feira (15/4). Consultora em Equidade de Gênero no esporte e especialista no desenvolvimento de treinadores, a doutora Larissa Galatti iniciou a reflexão. Em Paris-2024, a representatividade feminina entre treinadores do Time Brasil era de 12%. Número baixo, mas superior às edições anteriores dos Jogos. Em Tóquio-2020 e em Londres-2012 elas eram 7%, um ponto percentual a mais do que no Rio-2016. Ou seja, hoje, para cada nove treinadores, uma é mulher.
Mas um contraponto, a quantidade de treinadoras foi maior no ciclo Pré-Paris. No Pan de Santiago-2023, as mulheres representavam 15%. O cenário é desafiador, mas vem mudando. No entanto, esse desenvolvimento não é natural. A tendência é a manutenção do cenário, devido a diferentes motivos. O preconceito está entre as principais. Das treinadoras registradas no Brasil, 96% praticaram esportes. A maioria está na região Sudeste (55%), seguido do Sul (22%) e do Nordeste. O Centro-Oeste tem 6%, à frente apenas do Norte (5%).
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Elas estão cada vez mais qualificadas. Os números não mentem: 85% têm experiência como atleta, 62% realizaram cursos rápidos de federações, confederações e COB, e 53% atuaram de forma voluntária em comissões técnicas.
Atento a esse cenário, o COB lançou, em 2024, o programa Mentoria Individualizada Reflexão e Ação (MIRA). Os objetivos são: estimular consciência e reflexão; estabelecer metas individuais para aprimoramento de competências específicas; promover aprendizagens contextualizadas na atuação prática com ênfase em seus desafios cotidianos; articular conhecimentos profissional, interpessoal e intrapessoal; e fortalecer rede de suporte.
Durante o II Fórum Mulher no Esporte, o COB promoveu um painel com quatro treinadoras. Entre elas. Gianetti Bonfim, mãe do medalhista de prata da marcha atlética em Paris-2024, Caio Bonfim.
“Me vi na obrigação de aprender e estudar. Aí, firmou-se esse menino. Esse presente, que não é só um filho, é um atleta. Imaginem o meu sofrimento, como mãe e treinadora”, comentou. “Mulher não mata um leão, mata mil por dia. Temos de sair metendo o pé na porta e dizer: ‘cheguei e ninguém vai tomar meu lugar’”, discursou, Gianetti, bem humorada.
“Eu tinha uma revolta de ter nascido mulher, pelo contexto. Falo que estou misturada neste meio, entre velha geração com a nova. Tive de romper e brigar com o mundo, mesmo (no passado, quando era atleta). É uma coisa muito doida, porque as pessoas não aceitavam. Hoje, eu me considero como um instrumento de transformação e sinto orgulho. Vou mudar a minha história, a de meninos e meninas. O meu filho escolheu fazer a mesma coisa que eu fazia. Isso é um orgulho, um presente”, discursou Gianetti,
Também participaram do debate: Martha Rocha (treinadora de vela), Camila Ferezin (ginástica rítmica) e a neozelandesa Crystal Kaua (rugby sevens). Crystal é a primeira mulher a assumir o comando da Seleção Brasileira feminina. De outubro de 2024 para cá, brindou o país com a 9ª colocação, a melhor na classificação geral desde a entrada na elite mundial. Em 2025, liderou a equipe à campanha de 5ª posição na etapa de Vancouver do Mundial, o melhor resultado da história verde-amarela.
*O repórter viajou a convite do Comitê Olímpico do Brasil (COB)
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