
Após uma intensa pressão e muitas dificuldades, o governo Donald Trump comemora uma vitória apertada: por 218 votos a favor e 214 contra, foi aprovado o megapacote orçamentário na Câmara de Representantes dos Estados Unidos. Três senadores republicanos mudaram de posição Susan Collins, do Maine; Thom Tillis, da Carolina do Norte; e Rand Paul, do Kentucky — eles se juntaram aos democratas que rejeitaram as medidas. Apesar disso, é a primeira grande conquista legislativa da atual gestão. A ideia é sancionar a proposta hoje que é feriado nacional norte-americano, o Dia da Independência.
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Trump repetiu, por onde passou, seu ponto de vista sobre as novas medidas. "Com um projeto de lei grande e bonito, vamos tornar este país mais forte, mais seguro e mais próspero do que nunca, e todos os americanos se beneficiarão disso." Horas antes, o republicano ocupou as redes sociais e escreveu: "Um dos projetos de lei mais importantes da história". Com essa vitória, ele consolida sua visão da política americana, depois das decisões a seu favor da Suprema Corte de Justiça e dos ataques dos Estados Unidos, que levaram a uma trégua no conflito entre Israel e Irã.
O megapacote intensifica a fiscalização da imigração e reduz os investimentos em programas sociais, como os cortes no Medicaid — o programa federal que fornece cobertura de seguro-saúde para americanos pobres e deficientes, e no Programa de Assistência Nutricional Suplementar (Snap). Até a aprovação, foi um longo caminho: noites e madrugadas de discussões com resistência veemente dos democratas e várias votações na Câmara e no Senado.
O ponto central do pacote (ver quadro) é a ampliação dos cortes de impostos feitos em 2017, durante o primeiro mandato de Trump, bem como a criação de isenções para gorjetas, horas extras e juros de empréstimos de automóveis. A estimativa é de que a dívida do país será acrescida em US$ 3,3 trilhões.
Ironias
Em ironia a Trump, os democratas batizaram o megapacote de "grande e feio" por desmontar os programas de combate à pobreza para financiar isenções fiscais para os ricos, além de custear projetos militares e de segurança, intensificando também a campanha contra os imigrantes. Na última etapa de discussões, o líder da minoria democrata na Câmara, Hakeem Jeffries, tentou impedir a aprovação do projeto de lei ao fazer um discurso de oito horas e 44 minutos, o mais longo de todos os tempos.
"Isso é extraordinário. Esse ataque aos americanos comuns, esse ataque às crianças, aos veteranos, aos idosos, às pessoas com deficiência. É inacreditável para mim, tudo isso num único projeto de lei, grande e feio", disse Jeffries, segundo o The Guardian.
Os democratas esperam que a oposição pública ao projeto de lei os ajude a retomar o controle da Câmara baixa nas eleições de meio de mandato, em 2026, com o argumento de que a iniciativa do presidente representa uma enorme redistribuição de riqueza dos americanos mais pobres para os mais ricos.
Porém, a ABC News destacou que alheia à pressão dos democratas, a Casa Branca comemorou os resultados das votações. Logo após a aprovação, veio a declaração: "Vitória!". A portadora da mensagem foi a secretária de imprensa da Casa Branca, Karoline Leavitt, nas redes sociais.
Veja algumas medidas do plano
- Prorrogação de cortes
Com a nova lei, a dedução padrão para cidadãos em
US$ 1 mil; US$ 1,5 mil para chefes de família; e US$ 2.000 para os casais, embora
essa vantagem expire
em três anos.
Isenções fiscais
Os idosos acima dos 65 anos terão direito a uma dedução a mais de US$ 6 mil. A contrapartida é que a renda bruta não excede US$ 75 mil para solteiros ou US$ 150 mil para casais.
- Mão firme contra imigrantes
Repasse de US$ 45 bilhões para a ICE (polícia da Imigração), os quais serão investidos nos centros de detenção para estrangeiros ilegais. Outros US$ 14 bilhões custearão as deportações, sendo que um total de US$ 50 bi serão realocados para o fortalecimento de barreiras na fronteira com o México. Há, ainda, a previsão de contratar 10 mil agentes da ICE até 2029. Ao todo, US$ 350 bilhões serão empregados na política migratória.
- Sem seguro-saúde
A estimativa é de que mais de 10,6 milhões de cidadãos fiquem sem o seguro-saúde.
- Dedução fiscal
O teto de dedutibilidade para impostos estaduais e municipais será mantido em US$ 40 mil, mas apenas até 2028, quando poderá baixar para US$ 10 mil.
- Robin Hood às avessas
Os contribuintes mais ricos perceberão um aumento em suas rendas da ordem de 2,4%, enquanto os mais pobres perderão até 2,5% em seus ganhos.
Perguntas para Lucas Soares Portela, professor de relações internacionais no CEUB, com experiência nas áreas de política internacional, segurança e análise institucional
Ao aprovar o megapacote no Senado, Trump se torna ainda mais forte?
Ao aprovar o megapacote, Donald Trump conquista uma dupla vitória. A primeira, de caráter estratégico, ao demonstrar sua capacidade política de articular apoios no Congresso e romper paralisias institucionais, especialmente dentro do Partido Republicano, validando o "fôlego" necessário para um eventual segundo mandato. A segunda vitória refere-se à recuperação do protagonismo legislativo, o que sinaliza aos seus eleitores que ele pode entregar resultados concretos no Congresso. Essas demonstrações de liderança no processo decisório legislativo evidenciam a complexidade envolvida na aprovação do pacote. A inclusão de diversas pautas na proposta pode, por um lado, prejudicar a aprovação total do texto ao tratar de temas sensíveis. Por outro lado, essa estratégia dificulta a oposição a medidas específicas, permitindo que a agenda presidencial avance de forma mais concentrada e menos fragmentada. Projetos amplos como esse, quando apresentados como urgentes e prioritários, permitem ao governo centralizar o debate político, sufocando iniciativas paralelas. Outro benefício explorado foi a capacidade de conduzir os debates temáticos em torno do pacote, colocando adversários em contradição. Por exemplo: mesmo que um congressista seja contra a proposta por motivos econômicos, pode ser acusado de não apoiar um projeto de segurança. Assim, o megapacote representou não apenas uma vitória convertida em força política, mas também uma jogada estratégica que permitiu a Trump "travar" diversas decisões em uma única votação.
O que deve ocorrer com os rebeldes republicanos?
Embora a vitória de Donald Trump tenha sido apertada, os efeitos sobre os chamados "republicanos rebeldes" — aqueles que não mantêm um alinhamento automático com o ex-presidente — são significativos. Isso porque, nos Estados Unidos, os votos no Congresso são geralmente públicos, salvo raras exceções, o que permite traçar um verdadeiro mapa das preferências políticas dentro do Partido Republicano. Além disso, quanto menor a margem de vitória, maiores tendem a ser as ações pós-votação voltadas ao realinhamento partidário e à prevenção de futuras dissidências. Especialmente considerando a forma como Trump conduz sua política, em que a lealdade à sua figura e ao partido funciona como uma moeda de sobrevivência. Dessa forma, resta aos republicanos dissidentes trabalhar para reconquistar a confiança de Trump. Caso contrário, correm o risco de perder apoio e influência dentro do partido, tornar-se alvos de retaliação nas primárias eleitorais e precisar se reposicionar publicamente para evitar o isolamento. Assim, a vitória de Trump fortalece a ala leal e reduz o espaço para dissidências internas. A vitória do Trump na aprovação desse pacote pode ser revertida em três indicações de perspectivas futuras que precisam ser observadas: fortalecimento de Trump e controle do partido; impulso à governabilidade; e redefinição do mapa político interno. Sobre o fortalecimento político partidário, a vitória de Trump, mesmo que apertada, reforça seu papel como líder dentro dos republicanos. Além disso, começará um processo de substituição de lideranças que se revelaram dissidentes, possibilitando constante fortalecimento legislativo de Trump. Em termos institucional, não é a só a vitória que apresenta benefícios, mas o que foi aprovado. Esse pacote apresentou mecanismos cujo aprovação permitirá uma governança mais fluida e menos "engessada" ao governo, pois dá ao governo base legal, orçamentária e política para implementar sua plataforma. No pacote, temas sensíveis, como defesa, cortes fiscais e segurança de fronteira foram aprovados sem muitos entraves. Em relação a redefinição interna, a vitória permite conversões discursivas, permitindo que Trump se comunique com seus currais eleitorais com a narrativas de entregas futuras mais concretas. Por sua vez, dentro do partido começará um processo de depuração, isolando os rebeldes e dificultando possíveis reeleições. Esses dois pontos, se permanecerem, poderão facilitar a corrida presidencial de Trump, pois municiam o presidente para construções narrativas poderosas. Assim, o resultado dessa votação aumentará o capital político do Trump, permitindo que dite o ritmo e temas da agenda legislativa dos Estados Unidos. A máquina política estadunidense operará com maior visibilidade, devido ao tema aprovado, facilitando execução administrativa. Com isso, Trump reforça sua liderança interna e se projeta como o eixo central da governança republicana nos próximos embates políticos.
Saiba Mais
Ponto a ponto - QUADRO
Prorrogação de cortes
Com a nova lei, a dedução padrão para cidadãos em
US$ 1 mil; US$ 1,5 mil para chefes de família; e US$ 2.000 para os casais, embora
essa vantagem expire
em três anos.
Isenções fiscais
Os idosos acima dos 65 anos terão direito a uma dedução a mais de US$ 6 mil. A contrapartida é que a renda bruta não excede US$ 75 mil para solteiros ou US$ 150 mil para casais.
Mão firme contra imigrantes
Repasse de US$ 45 bilhões para a ICE (polícia da Imigração), os quais serão investidos nos centros de detenção para estrangeiros ilegais. Outros US$ 14 bilhões custearão as deportações, sendo que um total de US$ 50 bi serão realocados para o fortalecimento de barreiras na fronteira com o México. Há, ainda, a previsão de contratar 10 mil agentes da ICE até 2029. Ao todo, US$ 350 bilhões serão empregados na política migratória.
Sem seguro-saúde
A estimativa é de que mais de 10,6 milhões de cidadãos fiquem sem o seguro-saúde.
Dedução fiscal
O teto de dedutibilidade para impostos estaduais e municipais será mantido em US$ 40 mil, mas apenas até 2028, quando poderá baixar para US$ 10 mil.
Robin Hood às avessas
Os contribuintes mais ricos perceberão um aumento em suas rendas da ordem de 2,4%, enquanto os mais pobres perderão até 2,5% em seus ganhos.