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Crise do IOF: saída pela "letra fria da lei" ou pelo entendimento

Dino, Temer e Lira apontam: solução do impasse entre o governo e o Congresso tem dois rumos e sugerem que o menos indicado é o STF decretar um vencedor nessa contenda

Para o ministro, crise de governabilidade passa pelo Orçamento -  (crédito: Fotos: Mariana Campos/CB/D.A Press)
Para o ministro, crise de governabilidade passa pelo Orçamento - (crédito: Fotos: Mariana Campos/CB/D.A Press)

Lisboa — A crise política do Imposto sobre Operações Financeira (IOF) chegou a um impasse. Se o governo e o Congresso não se entenderem sobre a execução do orçamento, caberá ao Judiciário arbitrar essa disputa, estabelecendo vitoriosos e derrotados. Estará, assim, instalado um embate envolvendo os Três Poderes.

Relator das ações que tratam das emendas impositivas no Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Flavio Dino afirma que a questão orçamentaria é a raiz das crises de governabilidade, especialmente nos últimos 10 anos, e a questão precisa de uma solução. O tema foi tratado por Dino no painel “Governança Orçamentária e Democracia em Regimes Presidencialistas”, ontem, no XIII Fórum de Lisboa, que está sendo realizado na capital portuguesa por iniciativa do Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP), da FGV Justiça e do Lisbon Public Law Research Centre.

Dino fez uma exposição mostrando que, no momento em que as emendas impositivas nasceram, o país passou a ter dificuldades de governabilidade, com vários presidentes de diferentes partidos. Um problema que não nasceu neste terceiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva.

Em tom bem-humorado e muito aplaudido, Dino disse que coleciona desafetos por apresentar regras para as emendas parlamentares e por barrar emendas chamadas de RP8 (comissão) e RP9 (relator), por inconstitucionalidade decorrente da falta de transparência. “Acabei virando, por esses caprichos do destino, uma espécie de juiz travão. E é um papel chato”, disse.

O ministro afirma que o STF não quer resolver a questão sozinho, mas o país não pode enfrentar seguidos impasses. “Há uma necessidade de revisão do modelo. O Supremo não vai fazer isso sozinho. Estamos cuidando de transparência, rastreabilidade, casos de corrupção, para que haja o cumprimento das normas, das leis, da Constituição, da Lei Complementar 210”, afirmou.

Se não houver uma conciliação entre Executivo e Legislativo, o Judiciário vai arbitrar a solução. Da mesma forma, deve ocorrer com a crise do IOF, judicializada na semana passada. A Advocacia-Geral da União (AGU) ajuizou uma ação declaratória de constitucionalidade contestando a derrubada pelo Congresso do decreto presidencial que aumentou a alíquota do IOF.

Sem omissão

Dino ressaltou que há ações em tramitação no STF que discutem se a impositividade das emendas é inconstitucional. O Supremo fez uma audiência pública para discutir a questão, mas, segundo Dino, o tema ainda não está maduro para ser decidido. Porém, fica claro, pelo pronunciamento do ministro, que o STF não vai se omitir.

O magistrado apontou que a conciliação pode ser um caminho mais tranquilo para a questão do IOF, mas cabe ao relator do processo, ministro Alexandre de Moraes, conduzir o assunto. “O Supremo tem esses dois caminhos: pode simplesmente decidir à luz da letra fria da Constituição ou pode, por esse caminho de inovação institucional, chamar os Poderes e tentar, de algum modo, que haja um entendimento”, frisou.

Ao tratar do conteúdo da ação proposta pela AGU, Dino afirmou que a questão é rasa, tratada em jurisprudência do STF e passível de solução por qualquer estudante de direito no primeiro semestre do curso. “Não é uma questão complexa por fatores jurídicos, mas, sim, por esse ambiente de hiperjudicialização causado pelas dificuldades inerentes à política. A falência do presidencialismo de coalizão, nos últimos anos — quem sabe uma década —, fez com que crescentemente esses conflitos políticos sejam levados ao Supremo. E aquilo, sendo que juridicamente de fato é muito simples, acaba se tornando um grande problema para o Supremo resolver, seja decidindo, seja tentando uma conciliação”, explicou.

O ex-presidente Michel Temer, que também está em Lisboa, defende uma pacificação entre os poderes como forma de encerrar o impasse. “Tenho pregado isso com muita constância, porque não faço apenas por desejo próprio, mas por uma determinação da Constituição. A Constituição é ampla desde o preâmbulo de dispositivos que apontou a criação de um Estado com a solução pacifica de controvérsias. Pacificar o país é o que os brasileiros querem e necessitam”, ressaltou.

Temer se reuniu com vários políticos presentes em Lisboa em almoço oferecido a ele pela Confederação Nacional do Transporte (CNT), em famoso restaurante da cidade. Foi uma oportunidade para tratar do assunto e aconselhar muitos dos envolvidos nesse embate.

Passo atrás

O ex-presidente da Câmara Arthur Lira (PP-AL) também está em Lisboa acompanhando os desdobramentos da crise. “Entendo que este é um momento de todo mundo dar um passo atrás porque, por trás de tudo, tem um país que precisa andar, funcionar, ter suas pautas progredindo de maneira organizada”, afirmou.

Lira disse que há um esforço para que Executivo, Legislativo e Judiciário cumpram seus papéis nesses caminhos e sustenta que a crise não é maior do que os conflitos enfrentados pelos Poderes. “Executivo, Legislativo e Judiciário têm a própria autonomia”, afirmou. Como Temer e Dino diagnosticaram, Lira afirma que falta diálogo neste momento para resolver o embate.

postado em 04/07/2025 03:55
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