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Oposição bate cabeça e anistia a Bolsonaro segue distante

Reunião sobre anistia a Bolsonaro gera desencontro de informações, enquanto Valdemar confirmou encontro e voltou atrás, aliados e assessorias negam conhecimento, evidenciando falha na comunicação política da direita

Costa Neto disse que a reunião teria governadores e líderes partidários para discutir perdão a Bolsonaro -  (crédito: Beto Barata/ PL)
Costa Neto disse que a reunião teria governadores e líderes partidários para discutir perdão a Bolsonaro - (crédito: Beto Barata/ PL)

Uma reunião para discutir uma possível anistia ao ex-presidente Jair Bolsonaro, inicialmente confirmada pelo presidente do Partido Liberal (PL), Valdemar Costa Neto, gerou desencontros de informações entre líderes da direita na tarde desta sexta-feira (10/10).

Em entrevista ao Correio, Valdemar afirmou que o encontro ocorreria na próxima segunda-feira (13), em São Paulo, com a participação de governadores e líderes de partidos aliados. “Vai ter uma reunião segunda-feira em São Paulo, com o governador Tarcísio. Vão o Ciro Nogueira (PP), Antonio Rueda (União Brasil), Marcos Pereira (Republicanos-SP) e Gilberto Kassab (Secretário de Governo e Relações Institucionais do Estado de São Paulo).[...] Eu não vou porque tenho outro compromisso, mas o Rogério Marinho (PL-RN) vai representar o partido. E eles vão discutir a anistia do Bolsonaro”, disse Valdemar.

Pouco depois, porém, Valdemar entrou em contato com a reportagem informando que a reunião não ocorrerá mais.

O secretário-geral do PL, Rogério Marinho, declarou ao Correio não ter conhecimento da reunião anunciada. “Fazemos reuniões todos os dias pela anistia, não paramos de lutar”, afirmou.

A assessoria do governador Tarcísio de Freitas (SP) também disse “desconhecer, até o momento”, qualquer reunião sobre o tema.

Valdemar havia destacado que a pauta principal da reunião seria a discussão de uma proposta de anistia que, segundo ele, “poderia mudar todo o jogo político” em relação à inelegibilidade e à prisão de Bolsonaro. Ele também mencionou que governadores aliados, como Tarcísio de Freitas (SP), Romeu Zema (MG), Ratinho Junior (PR) e Ronaldo Caiado (GO), estariam engajados na iniciativa.

Governadores na articulação

A articulação pela anistia extrapola as fronteiras do PL. Segundo Valdemar, governadores aliados, como Tarcísio de Freitas (SP), Romeu Zema (MG), Ratinho Junior (PR) e Ronaldo Caiado (GO), também apoiam o movimento. “Todo mundo quer a anistia. Nunca o Brasil viveu uma situação dessa. É uma injustiça o que estão fazendo com o Bolsonaro”, defendeu.

O ex-presidente cumpre prisão domiciliar desde agosto, por decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF). Em setembro, foi condenado a 27 anos e 3 meses de prisão por tentativa de golpe de Estado e outros crimes.

PL tenta reconstruir terreno político

Valdemar afirmou que o partido continuará seguindo a liderança de Bolsonaro. “Se o Bolsonaro disser que o poste é candidato, eu ponho o poste”, disse. Para ele, a sigla deve manter a fidelidade ao ex-presidente até o limite. “Metade do que o partido é hoje nós construímos; a outra metade, ele construiu sozinho.”

Sobre possíveis nomes alternativos, Valdemar citou que “muitas chapas seriam boas”, mencionando Tarcísio de Freitas e Michelle Bolsonaro como uma das combinações possíveis.

Apesar do cancelamento da reunião, o Congresso debate projetos de anistia e redução de penas relacionados aos atos de 8 de janeiro de 2023. A proposta de uma anistia ampla, geral e irrestrita divide parlamentares e sofre resistência popular.

Resistência no Congresso e baixa popularidade

Pesquisa Quaest/Genial Investimentos divulgada na última quarta-feira (8) mostra que 47% dos brasileiros são contra qualquer tipo de anistia, seis pontos a mais que no levantamento anterior. A desaprovação cresce à medida que o debate se amplia no Legislativo.

Mesmo a proposta de redução de penas, apelidada de “PL da Dosimetria”, enfrenta resistência: pouco mais da metade da população também se opõe à ideia.

Na Câmara, o deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP) pretende divulgar parecer sobre o tema na próxima semana, prevendo uma votação terça-feira (14). Já no Senado, Otto Alencar (PSD-BA) declarou a jornalistas ser contra mudanças que beneficiem os condenados, mas afirmou que “vai estudar o texto com os pares” caso chegue à Casa.

Divergências e pressões

O debate divide o Congresso. Enquanto Cleitinho (Republicanos-MG) defende a anistia, argumentando “disparidade no tratamento da Justiça”, outros parlamentares reagem com firmeza.

“Pezão e Sérgio Cabral. Um [Cabral] foi condenado a 400 anos. Ele teria que ressuscitar para poder pagar essa pena umas quatro vezes. Está querendo vir, no ano que vem, como deputado federal. O outro virou prefeito. Enquanto isso, um ex-presidente com zero corrupção, que não tem uma condenação por corrupção, está há 60 dias dentro da casa dele. Não precisa gostar do Bolsonaro, viu? Só precisa ser justo”, disse Cleitinho, em discurso em plenário na quarta-feira (8) citando precedentes históricos de anistia.

Já Izalci Lucas (PL-DF) mantém o discurso fiel ao bolsonarismo: “Vamos votar e aprovar a anistia geral e irrestrita. Quem decide o candidato é o presidente Bolsonaro. Hoje, ele é o nosso candidato.”, disse ao Correio.

Por outro lado, vozes refutam a manobra. Reginaldo Veras (PV-DF) classificou o ex-presidente como “um canalha” e disse que ele adia a escolha do sucessor “porque ainda tem esperança de se salvar”. Para Veras, Tarcísio e Michelle têm chances reais de disputar, mas criticou Zema como “fraco, sem representatividade nacional, incompetente e sem sal”, disse ao Correio.

O cientista político Rudá Ricci, doutor e Mestre pela Unicamp, avalia que o atraso de Bolsonaro em apontar um sucessor não é cálculo estratégico, mas reflexo de sua personalidade. “Ele é um líder desqualificado, sem muito repertório. É paranoico e vaidoso. Tem medo de indicar alguém que não consiga controlar. Ele nunca teve uma estratégia inteligente e continua assim. Está segurando por pura vaidade”, afirma Ricci.

“A direita está em crise”, diz Maria do Rosário

A deputada Maria do Rosário (PT-RS) avalia que o bolsonarismo entrou em colapso interno. “O bolsonarismo jogou a direita em uma crise. Estão se engalfinhando para definir o sucessor, mas nenhum tem projeto real de desenvolvimento ou bem-estar para o país.”

Para ela, a possível chapa de Tarcísio e Michelle Bolsonaro concorre também com Eduardo Bolsonaro e Ronaldo Caiado, mas nenhum deles tem “chance real” para vencer Lula, que segundo pesquisas segue à frente.

Lula mantém liderança em todos os cenários

Segundo a pesquisa Quaest,divulgada na última quinta-feira (9), Lula lidera em todos os cenários simulados para 2026, com vantagem de 10 pontos sobre Bolsonaro e 12 sobre Tarcísio e Michelle. O levantamento, feito entre 2 e 5 de outubro, ouviu 2.004 pessoas e tem margem de erro de dois pontos percentuais.

Além disso, Eduardo Bolsonaro aparece como o nome mais rejeitado entre os potenciais candidatos à Presidência.

Para o deputado Zé Neto (PT-BA), a proposta de anistia não deve prosperar. “Eles acham que governam longe da opinião pública e do bom senso. Isso é inconstitucional. O Supremo não vai levar adiante uma situação absurda dessa”, afirmou em entrevista ao Correio.

Zé Neto defende que “quem tentou incendiar o Brasil para acabar com as instituições deve pagar caro” e criticou a tentativa da direita de politizar o tema. “A democracia é do Estado de Direito.”

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postado em 10/10/2025 23:42 / atualizado em 10/10/2025 23:42
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