O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e o ex-ministro da Casa Civil Walter Braga Netto apresentaram recurso contra o resultado do julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) que os condenaram por integrar o núcleo de comando da trama golpistaque resultou na depredação das sedes dos Três Poderes, em 8 de janeiro de 2023.
Os chamados embargos de declaração — que não têm a prerrogativa de alterara decisão da Primeira Turma da Corte — foram os instrumentos jurídicos usados pelas respectivas defesas no último dia do prazo legal para apresentação dos recursos. Mas, na leitura da argumentação dos advogados, fica claro o objetivo de colocar o julgamento em xeque para tentar reverter as condenações. Eles foram os primeiros dossete condenados a apresentar o recurso.
No caso do ex-presidente, condenado a 27 anos e 3 meses de prisão, sendo 24 anos e 9 meses em regime fechado e 2 anos e 6 meses em regime semiaberto, o recurso de 85 páginas elenca uma série de supostas ilegalidades que teriam sido cometidas no andamento do processo.
Entre os principais pontos de questionamento, que abrem a argumentação do embargo, estão a falta de provas (nos autos) de efetiva participação de Bolsonaro nos atos de 8 de janeiro, cerceamento da defesa — destacando que os advogados não tiveram tempo para analisar os milhares de documentos dos autos, o que caracterizaria o chamado cerceamento por 'document dump' — e contradições nos depoimentos do delator do processo, o então ajudante de ordens da Presidência Mauro Cid.
“O delator, confessadamente pressionado, mentiu desde o início e seguiu mentindo, sem pudor”, diz o documento protocolado no Supremo no fim da tarde desta segunda-feira (27/10), a poucas horas do fim do prazo para apresentação dos recursos.
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Na sequência, a defesa de Bolsonaro passa a apontar supostas “contradições entre premissas, provas e conclusões” para tentar convencer a Primeira Turma do STF de que o ex-presidente não participou dos chamados “atos executórios” da trama golpista.
“A incoerência jurídica estampada no acórdão quando pretende-se punir o embargante (Bolsonaro) pelos fatos do dia 8 de janeiro é tão grave quanto a falta de lógica entre premissa e prova que ocupa muitos dos fatos e ações imputados ao ex-presidente”, argumenta a defesa. Também há questionamento em relação à dosimetria que determinou o tamanho da pena.
“As contradições e omissões aqui detalhadas mostram, antes, a injustiça da condenação” do ex-presidente, conclui. A defesa tenta convencer a Primeira Turma de que houve erros da Justiça que precisam ser sanados.
“A importância dos embargos de declaração é aqui ainda maior. Não se trata de apenas buscar efeitos infringentes, mas de permitir que erros e equívocos sejam corrigidos”, argumentam os advogados Celso Vilardi, Paulo da Cunha Bueno e Daniel Tesser, que assinam o recurso como representantes de Jair Bolsonaro.
Braga Netto
O embargo de declaração apresentado pela defesa do ex-ministro e ex-companheiro de chapa de Bolsonaro na campanha pela reeleição Braga Netto é bem mais enxuto do que o do ex-chefe, com apenas 22 páginas, mas segue a mesma linha de argumentação.
Para os advogados do militar — condenado pela Primeira Turma a 23 anos e seis meses de prisão em regime fechado e mais dois anos e seis meses em regime semiaberto —, a condenação “decorreu de um processo conduzido sem a necessária imparcialidade, norteado por uma delação comprovadamente mentirosa e em franca violação às provas dos autos e ao duplo grau de jurisdição”.
“Em conclusão, a condenação do gen. Braga Netto é absolutamente injusta e contrária à prova dos autos”, afirmam os advogados — que incluíram a tese de suspeição do ministro relator da ação penal, Alexandre de Moraes (acusação recusada pela Primeira Turma em análises anteriores). Por isso, a defesa declarou que “irá se ater exclusivamente às hipóteses de cabimento dos embargos de declaração e registra que todas as vias de impugnação cabíveis contra a injusta condenação do gen. Braga Netto e as ilegalidades desta ação penal serão apresentadas e denunciadas no momento oportuno”.
Embargos de declaração
Os embargos de declaração são os primeiros recursos possíveis após uma sentença judicial e devem ser protocolados em até cinco dias após a publicação do acórdão. A função é técnica, para corrigir falhas formais, sem capacidade de mudar o resultado do julgamento. “Os embargos de declaração não têm efeito modificativo. Sua função é apenas corrigir omissões, contradições ou erros formais presentes no acórdão, sem alterar o mérito da condenação”, explica o advogado e professor de direito Ilmar Muniz, da Universidade Paulista.
Após a análise dos embargos declaratórios, as defesas ainda podem apresentar os chamados embargos infringentes, cabíveis se a condenação não tiver sido unânime. Além do julgamento no STF, os militares condenados também serão submetidos a julgamento pela Justiça Militar, exceto Mauro Cid, que cumpre dois anos de detenção em regime aberto devido ao acordo de colaboração premiada. Os advogados de Cid foram os únicos a não questionar o resultado do julgamento do chamado núcleo crucial da tentativa de golpe.
Além de Bolsonaro, Braga Netto e Mauro Cid, mais cinco pessoas foram condenadas a penas que variam entre 16 e 26 anos de prisão: o ex-ministro da Justiça Anderson Torres, o almirante Almir Garnier, os generais Augusto Heleno e Paulo Sérgio Nogueira, e o ex-diretor da Abin Alexandre Ramagem. Com exceção de Ramagem, os demais foram condenados pelos crimes de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, participação em organização criminosa armada, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado. Como tem mandato parlamentar, Ramagem, que recebeu pena de 16 anos de prisão, não foi julgado por dano qualificado nem deterioração de patrimônio tombado por ser deputado federal em 8 de janeiro.
De acordo com a assessoria do STF, “não há prazo para análise dos embargos” de declaração. Após essa etapa, o processo seguirá para eventual trânsito em julgado e execução da pena.
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