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'Não volto com alegria, volto por dever', diz Heloísa Helena

No retorno ao Congresso após 18 anos, como substituta temporária de Glauber Braga, na Câmara, ex-senadora critica punição ao deputado e condena moralismo seletivo

Dezoito anos após deixar o Congresso Nacional, a ex-senadora Heloísa Helena (Rede-RJ) está de volta ao Parlamento. Ela assumiu a vaga do deputado Glauber Braga (PSol-RJ), suspenso por seis meses pelo plenário da Câmara, em uma decisão que, segundo ela, simboliza um grave retrocesso institucional. "Não consigo ter alegria por estar aqui. Volto com um sentimento de indignação profunda", afirmou, em entrevista ao Correio.

Heloísa comparou o episódio envolvendo Glauber a situações que viveu no passado, quando ainda exercia mandato no Senado. Ela relembrou ter sido expulsa do prédio do INSS sob gás lacrimogêneo durante o primeiro governo Lula. "Essas cenas me obrigam a não chafurdar no moralismo farisaico, que condena nos adversários aquilo que acoberta nos aliados", criticou. Para a deputada, o tratamento desigual dentro das instituições corrói a democracia.

Apesar do contexto político adverso, Heloísa afirmou que exercerá o mandato com o mesmo perfil combativo que marcou sua trajetória. Ela elencou como prioridades o fortalecimento das políticas sociais, a fiscalização da execução orçamentária e o aprimoramento da legislação em áreas como saúde, educação, assistência social e segurança pública. "O SUS é a legislação mais avançada do mundo, mas ainda existe um abismo entre a lei e o acesso real da população pobre", observou.

Questionada sobre a relação com o governo federal, a deputada foi direta. Disse que manterá uma postura institucional respeitosa com o Palácio do Planalto, mas sem conciliações políticas. "Respeito não é covardia nem bajulação. Nunca negociei princípios em troca de cargos, prestígio ou poder", frisou. Ela também demonstrou preocupação com o comando da Câmara e com pautas que, segundo destacou, não refletem as prioridades da população.

A parlamentar criticou duramente propostas legislativas formuladas para atender interesses específicos, como o projeto da dosimetria das penas aos condenados pelos ataques de 8 de Janeiro, proposta que deve beneficiar o ex-presidente Jair Bolsonaro, sentenciado a 27 anos de prisão por tentativa de golpe de Estado e outros crimes. Na avaliação dela, discutir o sistema penal é legítimo, sobretudo diante das condições degradantes dos presídios, mas não quando a mudança serve para beneficiar "uma pessoa ou um grupelho político". "Isso é absolutamente inaceitável", disse.

Conservadorismo

A deputada também comentou o fortalecimento do conservadorismo no Congresso e o avanço de setores religiosos na formulação de políticas públicas. Defensora da liberdade religiosa, condenou o uso da fé como instrumento de poder político. "O absurdo é achar que uma religião é maior que todas as outras e transformá-la em um império para crescer politicamente e economicamente", declarou.

Ao falar sobre sua trajetória, da fundação do PSol à criação da Rede, Heloísa ressaltou que partidos são ferramentas, não fins em si mesmos. "O que move a política são as causas. As estruturas partidárias devem servir à transformação social, não o contrário", afirmou. Conhecida pelo perfil duro, disse que não pretende mudar seu estilo. "Estou mais madura e mais dura", resumiu.

Por fim, ao analisar o cenário político atual em comparação à campanha presidencial de 2006, Heloísa criticou a polarização e a superficialidade do debate impulsionado pelas redes sociais. "Eu me interesso pelo Brasil real, não pela idolatria política", frisou. Para ela, enfrentar a violência e a desigualdade exige investimento em políticas sociais profundas. "No fim, é pobre matando pobre. Sem justiça social, não haverá segurança pública", argumentou.

 

 

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