Entrevista

Christian Laval: "A literatura é uma forma de inventar novos mundos e sair da prisão do presente"

Em entrevista exclusiva ao Correio, o sociólogo francês Christian Laval, professor emérito da Universidade Paris Nanterre, fala sobre neoliberalismo, lutas sociais e sua nova fase como escritor

Visita de Laval reforça parceria internacional de pesquisadores -  (crédito: Ana Luiza Dutra/CB/D.A Press)
Visita de Laval reforça parceria internacional de pesquisadores - (crédito: Ana Luiza Dutra/CB/D.A Press)

O sociólogo francês Christian Laval, professor emérito da Universidade Paris Nanterre e um dos mais influentes pensadores contemporâneos sobre o neoliberalismo, avalia que há duas grandes urgências globais na atualidade: o clima e a verdade. "Precisamos defender ambos ao mesmo tempo. A verdade sobre o clima e o clima da verdade", observa.

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O pesquisador esteve em Brasília para participar do seminário Educação Insurgente, promovido pela Escola da Árvore, e também ministrou a palestra "Neoliberalismo, neofacismo e democracia", promovida pela Faculdade de Comunicação e pelo Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB). Em entrevista exclusiva ao Correio, ele falou sobre sua trajetória, as parcerias intelectuais com o filósofo Pierre Dardot, o conceito do "comum" e a virada recente para a literatura. 

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Autor de obras de grande repercussão no Brasil, como A nova razão do mundo: ensaio sobre a sociedade neoliberal (Boitempo, 2016) e Comum: ensaio sobre a revolução no século XXI (Boitempo, 2017), Laval é reconhecido por suas análises sobre a racionalidade neoliberal e suas implicações na educação, nas relações de trabalho e nas subjetividades humanas. "O neoliberalismo não é apenas uma política econômica. Ele molda a maneira como pensamos, sentimos e vivemos. É uma prisão mental que nos faz acreditar que não há alternativas possíveis", explicou.

Seu percurso intelectual começou na filosofia. "Nos anos 1980, trabalhei sobre o utilitarismo, especialmente Jeremy Bentham, e me tornei uma espécie de especialista nesse autor", conta Laval. A partir dessa pesquisa sobre a modernidade e as origens ideológicas do capitalismo, aprofundou sua crítica à racionalidade neoliberal.

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A virada para a crítica social mais ampla ocorreu ao reencontrar o filósofo Pierre Dardot, amigo de juventude. Juntos, desenvolveram um pensamento voltado a compreender e resistir à lógica neoliberal, resultando em obras de impacto, como A nova razão do mundo. Posteriormente, passaram a investigar alternativas que propõem o "comum" como princípio político e institucional capaz de superar a divisão entre Estado e mercado.

"O comum não é uma utopia abstrata. Ele nasce de práticas concretas de cooperação, comunicação e autogoverno. São experiências que existem em muitos campos, na educação, na vida urbana, na cultura digital, e que buscam formas democráticas de organização para o bem de todos."

Ao ser perguntado sobre do que traria essa ideia do comum, ele respondeu que um exemplo seria a Escola da Árvore. "Uma instituição democrática, com a participação da família nas escolas e aberta pedagogiamente. Cujo princípio é que a educação seja para todos, e não somente para alguns privilegiados."

Em Brasília, Laval alertou para o caráter autoritário do neoliberalismo e defendeu a articulação de lutas ecológicas, feministas, sociais e antirracistas. "Essas lutas precisam se transversalizar. Não há mais separação entre elas. Todas se unem em torno de uma mesma aspiração à igualdade."

*Entrevista traduzida com colaboração de Tiago Quiroga (FAC/UnB) e David Hamou (Ipol/Casa Comum)

 

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postado em 20/10/2025 06:00 / atualizado em 20/10/2025 18:33
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