
Já se passaram seis anos do início das obras de restauro na Igreja Sagrado Coração de Jesus, datada de 1901, o segundo templo católico mais antigo de Belo Horizonte – o primeiro é a Capela Nossa Senhora do Rosário (1897), no Centro –, e a cada dia aumentam as preocupações do padre George Raleb Massis, titular desde 2003 da paróquia de mesmo nome. A atenção dele se volta novamente para a parte interna da construção, na qual identificou duas fissuras no arco-cruzeiro, que separa a capela-mor da nave.
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Outro problema grave, desta vez no forro, mostrado pelo Estado de Minas em fevereiro deste ano, reside no desprendimento da pintura, perto da asa de um anjo, “o que só vem aumentando”, segundo o religioso. A Arquidiocese de BH anunciou investimento de R$ 4 milhões em projetos, mas ainda não é suficiente, ressalta o titular da paróquia instituída há um século, em 25 de outubro de 1925.
À frente do templo de rito siríaco católico, padre George dá o sinal de alerta sobre a situação da igreja e pede atenção das autoridades por se tratar de um bem tombado pelo Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (Iepha-MG) e pelo Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural do Município de Belo Horizonte, (CDPCM-BH). “Tombamento significa história, memória viva, cuidado, então é necessário que todos os órgãos de defesa do patrimônio assumam o compromisso de preservar uma edificação tão importante para a cidade”, afirma o pároco.
Saiba Mais
Diante do temor de que o teto desabasse, foi feito o isolamento da nave, há quase três anos, com anuência do Iepha-MG e prefeitura da capital (PBH) juntamente com o Memorial da Arquidiocese da capital. Hoje, quem entra no templo localizado entre as avenidas Alfredo Balena e Carandaí e a Rua Paraíba (Região Hospitalar), no Bairro Funcionários, na Região Centro-Sul, vê o tapume que deixa disponíveis aos fiéis apenas 30 assentos dos 300 existentes.
Com isso, casamentos e batizados saíram de cena, embora moradores e visitantes possam participar todo domingo, às 11h, da missa celebrada em aramaico, a língua que Jesus falava. Sem dúvida, a igreja abriga parte significativa da história de BH, que completou 128 anos no último dia 12 de dezembro, sendo fundamental, portanto, o envolvimento de toda a comunidade para impedir a perda de edificação tão preciosa.
CUSTOS E RECURSOS
Em novembro, ao lado da historiadora do Memorial da Arquidiocese de BH, Flávia Costa Reis, padre George fez as contas e explicou que, em 2017, o restauro completo estava orçado em R$ 2 milhões, valor multiplicado por cinco desde então. “Hoje, são necessários R$ 10 milhões para fazermos tudo. Temos projetos aprovados, ‘reaprovados’, mas sem recursos é impossível (executá-los)”. Ele acrescenta que, com tantos encargos, mal está conseguindo custear as despesas mensais da igreja, que giram em torno de R$ 18 mil.
Ainda na parte interna do templo, mostra uma escada de madeira “que está podre, necessitando urgentemente de troca”, mas, por se tratar de um bem tombado, não consegue o sinal verde das autoridades para fazer o serviço. Entre tantos problemas, o pároco levou a equipe do EM ao adro da igreja para apontar alguns elementos causadores de trepidação e estragos. “O trânsito aqui é intenso...veja os ônibus nas avenidas e na Rua Paraíba! Do outro lado da Alfredo Balena há um heliponto. Enfim, tudo interfere na conservação de uma construção centenária.”
Há mais reclamações. Na fachada, vândalos riscaram a pintura com objetos pontiagudos deixando nomes de homens e mulheres, de times de futebol e outras palavras que se misturam e ferem a tinta. Diante do templo, perto dos gradis instalados em 2017, há mangueiras carregadas de frutos ainda verdes. “Quando as mangas estão maduras, as pessoas atiram pedras nas árvores e as frutas caem sobre a cobertura da igreja. Aí, vem outro dano: com as telhas quebradas, ocorre infiltração de chuva.”
Ao observar manchas amareladas sobre as pinturas parietais (estêncil, técnica decorativa em moda no início do século passado), Flávia diz que será necessário investigar se as manchas são decorrentes da água que, nos últimos tempos, entrou na sacristia.
O arquiteto do Memorial da Arquidiocese de BH, Hebert Gerson Soares Júnior, comenta as fissuras na região do forro e no arco-cruzeiro: “Não podemos afirmar que se trata de problema estrutural sem avaliação de engenheiros”.
Para tanto, o Memorial está em busca de profissionais para elaboração de um laudo sobre as condições estruturais da cobertura. O objetivo é garantir segurança quanto ao forro de estuque e o telhado.
SINAL DE ESPERANÇA
Conforme a Arquidiocese de BH, a Igreja Sagrado Coração de Jesus teve suas obras de restauro estrutural e dos elementos artísticos e paisagísticos iniciadas em 2019, tendo sido essa primeira etapa concluída dois anos depois. Já estão prontos, conforme a instituição, o restauro do transepto, que divide o coro da nave principal, e do altar-mor, da pintura do forro da capela-mor e das paredes laterais, e a reforma dos gradis.
Em fase de projetos, estão o forro da nave, a escada para o coro e o piso do adro, os quais serão restaurados e renovados. Em nota, a Arquidiocese de BH informa que se encontram em fase adiantada os projetos de acessibilidade, paisagismo, iluminação, irrigação e do piso interno. “A segunda fase dos trabalhos envolve maior volume de recursos e começará a ser executada este mês, com previsão para ser finalizada em abril de 2027.”
O custo estimado para o total da obra é de R$ 4 milhões, sendo recursos próprios da Mitra Arquidiocesana de Belo Horizonte, com uso de Unidade de Transferência do Direito de Construir (UTDC’s) e recursos da Paróquia Sagrado Coração de Jesus. A Igreja reúne a comunidade dos Católicos Siríacos e está intimamente ligada ao coração da capital.
PROTEÇÃO
Em nota, a PBH esclarece que gestão e intervenções são de responsabilidade da igreja. “Ainda assim, em 2024, o local passou por intervenções financiadas com recursos provenientes de Medida Compensatória do Município de Belo Horizonte (disponibilizados em 5 de agosto de 2024), em projeto realizado com acompanhamento da Diretoria de Patrimônio Cultural (DIPC). Na ocasião, os recursos foram usados para a recuperação dos altares laterais da Igreja. A PBH continua prestando apoio técnico especializado.” O programa de aplicação de Medidas Compensatórias é destinado ao restauro de bens protegidos, conforme critérios técnicos de risco, necessidade e relevância histórica.
A nota diz ainda que o município tem conhecimento das atuais demandas de manutenção do imóvel e já notificou oficialmente a Igreja para a adoção das providências cabíveis. Conforme previsto na legislação, é responsabilidade do proprietário do imóvel zelar pela conservação e manutenção do bem tombado.
Sobre a população em situação de rua, as equipes do Serviço Especializado em Abordagem Social (SEAS) fazem abordagens em todas as regionais da cidade, “oferecendo acompanhamento técnico, com atendimento humanizado e construção de vínculo, articulação intersetorial com as redes de proteção social e diretrizes baseadas na proteção integral”. Já quanto à circulação de ônibus, a Superintendência de Mobilidade (Sumob) informa que a igreja fica “em região de ampla circulação e atratividade na cidade, o que demanda alto volume de ônibus em circulação”.
Na esfera estadual, a presidência do Iepha-MG informa que mantém diálogo com a Mitra Arquidiocesana de Belo Horizonte e se reuniu, recentemente, com a instituição para orientar sobre alterações que devem ser realizadas na infraestrutura da Igreja, conforme o projeto já aprovado pelo instituto. Lembrando que a execução das intervenções é de responsabilidade da proprietária do imóvel, a Cúria Metropolitana da Arquidiocese de Belo Horizonte, o Iepha-MG informou, em nota, que orientou a responsável sobre os procedimentos necessários para acesso a recursos previstos por leis de fomento.
“A captação deve ser feita diretamente pela proprietária do imóvel, nos termos da legislação, para garantir a conservação da Igreja, que é um bem cultural protegido nas esferas municipal e estadual e reconhecido por sua relevância cultural, arquitetônica e artística.”

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