SAÚDE

Internações por doenças respiratórias aumentam 31% no período seco

O calor intenso, a baixa umidade do ar e a fumaça das queimadas nesta época do ano contribuem para o adoecimento de pessoas, principalmente crianças e idosos. Especialistas alertam para cuidados, como hidratação constante

Baixa umidade e poluição do ar na capital do país fazem aumentar casos de doenças respiratórias e impactam as redes de saúde pública e particular  -  (crédito:  Ed Alves CB/DA Press)
Baixa umidade e poluição do ar na capital do país fazem aumentar casos de doenças respiratórias e impactam as redes de saúde pública e particular - (crédito: Ed Alves CB/DA Press)

O sol escaldante, a baixa umidade e a poluição do ar provocam uma situação preocupante para os brasilienses. Segundo os números mais recentes da Secretaria de Saúde (Ses-DF), até 7 de setembro, 6.377 pessoas foram internadas por Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) em 2025, um aumento de 31% em relação ao mesmo período de 2024, quando foram registradas 4.842 internações. O crescimento também supera 2023, que contabilizou 5.621 casos, e coloca a taxa em 196,8 casos por 100 mil habitantes, a mais alta dos últimos três anos.

O aumento das internações coincide com a rotina de temperaturas que ultrapassam facilmente os 30°C, acompanhadas de umidade relativa do ar entre 15% e 20%, muito abaixo dos 60% recomendados pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

A combinação de calor, ar seco, poeira e fumaça das queimadas cria um ambiente propício para a circulação de vírus respiratórios e aumenta a vulnerabilidade da população, como no caso de Shirleny Araújo, de 39 anos, que relata dificuldades para tratar uma gripe que persiste há cerca de três meses, desde que chegou a Brasília, vinda da Bahia. "Fui ao posto de saúde do Paranoá e ao hospital, mas não me atenderam. Eu estava tossindo muito, com dor no peito e nas costas, e a medicação que tomava em casa não resolvia. Então estou fazendo gargarejo com água morna e sal e tentando me cuidar com remédios caseiros", conta. Ela ressalta que sente um forte desconforto com o clima seco da capital. "O nariz arde o tempo todo e a garganta fica muito seca, mesmo quando tento beber água. É bem complicado".

Entre crianças e idosos, os números são ainda mais preocupantes. As crianças de até 1 ano seguem como as mais afetadas: em 2025, somam 3.051 internações, contra 2.426 no mesmo período de 2024. Logo em seguida, aparecem as crianças de 2 a 10 anos, com 1.679 registros neste ano, também acima dos 1.171 do ano passado. Entre os idosos com mais de 80 anos, outro grupo historicamente vulnerável, foram contabilizados 393 casos em 2025, frente a 359 no ano anterior.

  • Giovani Mesquita sente desconforto com a baixa umidade
    Giovani Mesquita sente desconforto com a baixa umidade Davi Cruz/CB
  • Shirleny Araújo: dificuldades para tratar uma gripe que persiste
    Shirleny Araújo: dificuldades para tratar uma gripe que persiste Davi Cruz/CB

A infectologista Marina Salgado explica que a combinação de seca e calor impacta diretamente a saúde respiratória da população. "Os fatores ambientais afetam a qualidade do ar e reduzem a capacidade do corpo de se defender contra agentes agressores. A baixa umidade, a fuligem, a poeira, o aumento das queimadas e as altas temperaturas deixam as vias respiratórias mais vulneráveis", afirma. Segundo ela, é justamente neste período do ano que as internações por doenças respiratórias tendem a aumentar, especialmente nos meses mais secos do Centro-Oeste.

Siga o canal do Correio no WhatsApp e receba as principais notícias do dia no seu celular

Quadros graves

A especialista alerta que os efeitos não se limitam ao desconforto: podem evoluir rapidamente para quadros graves. "Nas doenças respiratórias, é preciso ficar atento a sintomas como dificuldade para respirar, chiado no peito, dor ao inspirar, tosse persistente, febre alta que não melhora, lábios ou extremidades arroxeadas e sonolência excessiva", orienta.

Casos como o de Heldo Lima Soares, 36, mostram como essas condições se manifestam na prática. Marinês Soares, 32, conta que o esposo, asmático, teve o quadro agravado pelo período de seca em Brasília. "Piorou muito. Ele estava com tosse seca, falta de ar e nem conseguiu dormir à noite. Teve febre e dificuldades para respirar. No ano passado, ele passou muito mal e chegou a ser internado na sala vermelha no mesmo período", relata. Marinês explica que as condições do clima seco, o calor intenso e a fumaça das queimadas tornam os sintomas da asma ainda mais severos. "Essa seca e fumaça pioram muito a situação", acrescenta.

O cenário descrito por Marinês se reflete no próprio ar que se respira em Brasília. Durante a seca, a capacidade de dispersão de poluentes diminui consideravelmente e, ao fim do dia, a inversão térmica aprisiona essas partículas próximas à superfície. O resultado é um ar mais pesado, que intensifica os sintomas respiratórios.

De acordo com o Instituto Brasília Ambiental (Ibram), regiões como a Fercal vêm registrando índices de qualidade do ar entre moderado e ruim. As queimadas, que se intensificam nesta época, agravam a situação: a fumaça se mistura à poeira e ao pólen, formando uma névoa esbranquiçada sobre o horizonte da capital, prejudicando a visibilidade e provocando irritação nos olhos, na garganta e nos pulmões.

Quem também sente cada vez mais o desconforto por conta da baixa umidade é Giovani Mesquita, 21, que procurou atendimento médico, no Hospital da Asa Norte (Hran), após perceber que os sintomas na garganta não melhoraram com doses rápidas de antibiótico. "A secura do tempo agrava muito a dor, porque a garganta vai ficando ressecada e irritada. Por isso retornei ao atendimento médico para tentar um tratamento contínuo e mais eficaz", explica.

Cuidados necessários

Para reduzir os riscos e evitar que as doenças respiratórias evoluam para quadros mais graves, a Secretaria de Saúde do DF recomenda uma série de medidas preventivas. Entre as mais importantes, estão a vacinação anual contra a influenza, considerada a intervenção mais eficaz para prevenir casos graves e mortes, e a intensificação da vacinação contra a covid-19. 

Pediatra e diretor médico do Hospital Anchieta Taguatinga, Deivson Mundim reforça que cuidados simples do dia a dia também ajudam a proteger a saúde durante o período de seca. "Beber bastante água ao longo do dia, usar soro fisiológico no nariz para manter as vias respiratórias úmidas e evitar aglomerações em locais fechados ajudam bastante. Manter os ambientes limpos e ventilados, reduzir poeira e mofo, e usar umidificadores ou até bacias de água nos cômodos contribuem para aliviar os efeitos do ar seco. E, claro, a higienização das mãos continua sendo uma das medidas mais eficazes para evitar infecções", orienta o médico.

Momentos de pânico no Lago Oeste

Um incêndio em vegetação no Lago Oeste mobilizou o Corpo de Bombeiros Militar do Distrito Federal (CBMDF) e provocou momentos de pânico entre moradores da região, neste fim de semana. As chamas destruíram cerca de 28 hectares de Cerrado e chegaram a menos de dois metros de algumas residências.

"Eu ia ficar sem casa, a verdade é essa", contou a aposentada Eliane Aparecida dos Santos Vieira, 59 anos, com olhar assustado. Ela mora há um ano e meio da Rua 11, do Lago Oeste, e relembrou que passou a madrugada de domingo em alerta. "Eu nem consegui dormir, quando vi a fumaça, liguei para os bombeiros. Quando percebi, o fogo vinha em direção à minha casa. Estava quase colocando os bichos que tenho no carro para fugir", relatou ao Correio.

Segundo ela, a solidariedade dos vizinhos também foi importante para evitar que as chamas consumissem a residência. "Quando gritei, os vizinhos vieram correndo de todo lado. Foi uma união muito grande, senão eu teria perdido tudo", desabafou.

 15/09/2025 Ed Alves CB/DA Press. Cidades. Incendios - Lago Oeste. na foto, Yuri - fogo atingiu 70% de sua propriedade quase pegou fogo na sua casa.
15/09/2025 Ed Alves CB/DA Press. Cidades. Incendios - Lago Oeste. na foto, Yuri - fogo atingiu 70% de sua propriedade quase pegou fogo na sua casa. (foto: Ed Alves CB/DA Press)

Desespero

"O fogo chegou a um metro e meio da minha casa", contou Yuri Menezes, 62, autônomo, que viveu momentos de tensão quando viu as labaredas avançarem rapidamente. "Estava desde sábado ajudando no combate nos lotes vizinhos, mas no domingo cedo, quando fui usar a bomba d'água que tenho, vi que não tinha condições de conter as chamas. O fogo tinha três metros de altura e, se não fosse o vento mudar de direção, eu teria perdido tudo", disse. 

Morador da Rua 10 há 23 anos, Yuri calcula que mais de 70% da sua chácara foi destruída, incluindo a perda de parte do seu galinheiro. "Quando as chamas avançaram, corri e abri a porteira para as galinhas saírem. Foi um misto de muita tristeza e adrenalina. O cenário era catastrófico e assustador. É uma pena ver uma área de cerrado tão bonita e bem conservada virar cinzas", lamentou.  Segundo dados do Corpo de Bombeiros, foram registradas 62 ocorrências de incêndios em vegetação, que totalizaram 1.826 hectares queimados em todo território do DF, no fim de semana.

 


  • Google Discover Icon
DC
postado em 16/09/2025 06:05
x