
A Justiça do DF revogou a prisão preventiva de Victor Gabriel Fagotti, acusado de cometer maus-tratos que levaram à morte de vários cães em um suposto "hotel" ou "lar temporário" para animais em Planaltina. A decisão, dessa quarta-feira (15/10), solta o réu da cadeia, mas o submete a um conjunto de restrições severas, centradas na suspensão de qualquer atividade relacionada à guarda de animais. A defesa do acusado teve outros dois pedidos – o de absolvição sumária e o de avaliação psiquiátrica – rejeitados pela magistrada.
O raciocínio central da decisão foi o de reavaliar o perigo representado pela liberdade do acusado. A magistrada reconheceu a gravidade abstrata dos fatos, mas argumentou que o risco concreto estava circunscrito à atividade específica que Fagotti exercia. "Os supostos maus-tratos ocorreram no ambiente em que o réu exercia atividade de guarda/hospedagem de animais sob sua tutela, não havendo qualquer elemento indicando propensão difusa a maltratar animais aleatoriamente", ponderou.
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A decisão destacou que o réu é primário, sem antecedentes criminais, o que reforça a presunção de que medidas alternativas seriam suficientes. A juíza também fez referência ao Laudo de Perícia Criminal de Exame de Local, cuja conclusão – transcrita pela defesa – apontou que "não foi possível determinar as circunstâncias de morte dos animais, restando, portanto, prejudicada a análise conclusiva quanto à causa e modo de ocorrência". Embora isso não absolva o acusado, foi um elemento considerado no contexto da cautelar.
A magistrada entendeu que a prisão cumpriu seu papel inicial de conter a situação emergencial e garantir a investigação. A partir de então, a "ordem pública" poderia ser protegida por um "arranjo cautelar proporcional e verificável", focado em impedir a reincidência no mesmo tipo de conduta.
Cerco judicial
A liberdade de Victor Gabriel Fagotti não será plena. A prisão preventiva foi substituída por um leque de medidas cautelares, desenhadas para neutralizar qualquer risco de repetição dos crimes e assegurar a presença do réu no processo. As principais são:
- Suspensão de Atividade: Ficou proibido de exercer qualquer atividade, remunerada ou não, que envolva guarda, hospedagem, adestramento, resgate, lar temporário, comércio ou intermediação de adoção de animais domésticos ou silvestres
- Proibição de Posse: Não poderá adquirir, manter sob guarda ou ter a posse de qualquer animal
- Restrição de Acesso: Está proibido de frequentar ou ingressar em abrigos, canis, hotéis para pets, clínicas veterinárias e estabelecimentos similares
- Inspeções Aleatórias: Deverá permitir que a DRCA/PCDF realize vistorias aleatórias em sua residência para verificar o cumprimento da proibição de posse de animais
Além dessas, ele terá de comparecer a todos os atos do processo, não mudar de endereço sem autorização e manter seus dados atualizados junto ao juízo. A decisão alerta que o descumprimento de qualquer uma dessas condições poderá levar à decretação de nova prisão preventiva.
Trâmite processual
Victor Fagotti foi preso em flagrante em 3 de setembro e, em audiência de custódia no dia seguinte, a prisão foi convertida em preventiva. A justificativa inicial foi a "gravidade concreta" do fato e o "extenso número de mortes", que, segundo o juízo da custódia, representavam um risco à ordem pública e tornavam inviáveis medidas cautelares alternativas. Tentativas posteriores da defesa para reverter a prisão foram indeferidas, inclusive um pedido de Habeas Corpus.
Com o recebimento da denúncia em 18 de setembro, a defesa apresentou sua resposta, na qual pleiteou três coisas: a absolvição sumária do cliente, a revogação da prisão preventiva (ou sua substituição por medidas mais brandas) e uma autorização para que Fagotti fosse avaliado por um médico psiquiatra.
Além da revogação de prisão preventiva, a juíza analisou o pedido de absolvição sumária. Em sua decisão, a magistrada foi categórico ao afirmar que as alegações da defesa intervêm no assunto principal. Ele fundamentou que questões sobre a existência do crime ou a culpabilidade do acusado demandam a instrução processual completa, com a oitiva de testemunhas e a produção de todas as provas.
Da mesma forma, o pedido de avaliação psiquiátrica não foi concedido. A juíza explicou que tal exame depende da instauração de um incidente de insanidade mental, um procedimento formal e autônomo que requer elementos concretos que levantem dúvidas sobre a saúde mental do réu. Como a defesa não apresentou nenhum laudo, relatório médico ou sequer apontou comportamentos anômalos do acusado durante o processo, o pedido foi considerado "genérico e destituído de suporte probatório mínimo".
Barbaridade
O caso, que chocou a opinião pública e mobilizou a Delegacia de Repressão a Crimes Ambientais (DRCA), remonta a operação realizada no início de setembro de 2025. Ao adentrar um imóvel localizado na Quadra 60 da Avenida Floriano Peixoto, em Planaltina, policiais e peritos do CEPEMA depararam-se com uma cena descrita como "insalubre": 10 cães mortos e outros dois vivos, mas em estado de caquexia (extrema desnutrição e fraqueza), convivendo com fezes ressequidas e sem acesso a água ou alimento.
A investigação apurou que Fagotti operava no local um negócio de hospedagem remunerada de cães, sem a devida licença. Vizinhos relataram à polícia que já percebiam maus odores emanando do local desde julho daquele ano. O Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) ofereceu denúncia contra ele, tipificando os crimes sob a Lei de Crimes Ambientais (Lei 9.605/98). A acusação detalha que os animais estavam sob a guarda remunerada do acusado, inclusive três que haviam sido resgatados por uma tutora identificada.
O caso agora segue para a fase de produção de provas, onde as teses de acusação e defesa serão, finalmente, colocadas à prova. Enquanto isso, Victor Fagotti responderá ao processo em liberdade, mas sob a sombra de um rígido controle judicial que busca, acima de tudo, evitar que uma tragédia animal como a ocorrida em Planaltina se repita.
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