COP30

Brasil falha na pesquisa oceânica ao ignorar povos tradicionais

Em painel promovido pela Fapesp durante a COP30, pesquisadores e lideranças indígenas afirmam que compreender o oceano exige integrar ciência, saberes ancestrais e abordagem transdisciplinar

Em painel promovido pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), durante a COP30, pesquisadores e lideranças indígenas afirmam que compreender o oceano exige integrar ciência, saberes ancestrais e abordagem transdisciplinar   -  (crédito: Freepik/Reprodução)
Em painel promovido pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), durante a COP30, pesquisadores e lideranças indígenas afirmam que compreender o oceano exige integrar ciência, saberes ancestrais e abordagem transdisciplinar - (crédito: Freepik/Reprodução)

A pesquisa oceânica no Brasil não vai avançar sem a participação direta de povos indígenas, ribeirinhos e comunidades tradicionais que vivem a relação entre floresta, rios e mar. O alerta foi feito por pesquisadores e representantes de instituições internacionais em painel promovido pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) durante a COP30, ao defenderem que ciência e conhecimento ancestral precisam caminhar juntos para enfrentar a crise climática.

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A líder indígena Patrícia Suárez, da Fundação Gaia Amazonas, que atua junto a 64 comunidades na Colômbia, lembrou que oscilações do oceano influenciam diretamente a Amazônia e que o ciclo da água, ao percorrer floresta, rios e litoral, conecta territórios que historicamente são tratados como áreas separadas. 

Gaia afirmou que a fragmentação desse debate, comum em negociações internacionais, impede respostas efetivas, já que “a chuva que cai na Amazônia começa no oceano” e o retorno desses rios ao mar depende da preservação promovida pelas comunidades tradicionais.

O professor Alexander Turra, do Instituto Oceanográfico da USP e coordenador do Programa FAPESP para o Oceano Atlântico Sul e Antártica (PROASA), reforçou que a ciência ainda se comunica de forma limitada com esses grupos. Para ele, as barreiras persistem porque pesquisadores insistem em modelos que não consideram conhecimentos locais e histórias ambientais construídas ao longo de gerações. Turra defendeu que integrar sistemas de conhecimento é essencial para que o país compreenda a complexidade dos ambientes marinhos e avance na conservação e no uso sustentável de recursos oceânicos.

 

Da esquerda para a direita. Lorna Inniss (chefe da subcomissão reaional da Comissão Oceanoaráfica Intergovernamental da Unesco), Megha Sud (ISC), Patrícia Suárez (Fundacão Gaia Amazonas e Instituto Interamericano de Pesquisa sobre Mudanças Globais) Paulo Gadelha (Fiocruz) e Alexander Turra (PROASA-FAPESP/IO-USP).
Da esquerda para a direita. Lorna Inniss (chefe da subcomissão reaional da Comissão Oceanoaráfica Intergovernamental da Unesco), Megha Sud (ISC), Patrícia Suárez (Fundacão Gaia Amazonas e Instituto Interamericano de Pesquisa sobre Mudanças Globais) Paulo Gadelha (Fiocruz) e Alexander Turra (PROASA-FAPESP/IO-USP). (foto: Elton Alisson/ Agência FAPESP)

O debate também destacou a necessidade de abordagens transdisciplinares na pesquisa oceânica. A diretora científica do International Science Council (ISC), Megha Sud, lembrou que o oceano regula fenômenos climáticos em escala global e tem impacto direto sobre a vida humana. Segundo ela, estudos sobre biodiversidade marinha, mudanças climáticas e dinâmica das populações costeiras precisam ser articulados e pensados em longo prazo, sem depender exclusivamente de recortes acadêmicos tradicionais.

Outra proposta discutida no painel foi a ampliação de redes de monitoramento oceânico com participação comunitária. Lorna Inniss, da Comissão Oceanográfica Intergovernamental da Unesco (COI-Unesco), defendeu modelos de baixo custo que integrem pescadores ao processo de coleta de dados. 

A estratégia inclui instalar sensores em embarcações artesanais, permitindo acompanhar padrões oceânicos, intensificar o alerta para eventos extremos e fortalecer políticas públicas relacionadas à pesca e à conservação marinha.

A discussão ganhou ainda um eixo voltado à saúde humana. O pesquisador Paulo Gadelha, da Fiocruz, alertou que desequilíbrios climáticos e degradação oceânica podem acentuar crises sanitárias, ampliar doenças transmitidas pela água e comprometer cadeias alimentares. Ele reforçou que, ao aproximar oceano e saúde pública, o debate passa a ter maior adesão social e pode influenciar decisões políticas.

O painel encerrou com consenso entre os participantes: compreender o oceano brasileiro, que se estende por mais de 8 mil quilômetros de costa e influencia diretamente o clima, a economia e a segurança alimentar, exige reconhecer que ciência e saber tradicional não são mundos distintos, mas complementares. Para pesquisadores e lideranças indígenas, somente essa integração pode sustentar políticas ambientais capazes de enfrentar a crise climática em curso.

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JA
postado em 13/11/2025 11:37
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