Rodrigo Cerqueira, conhecido artisticamente como MC Marechal, representa o hip-hop no Festival Literário Internacional da Paraíba (FliParaíba 2025) e remove qualquer romanização possível sobre sua trajetória: “Eu sou uma exceção. Eu sou extraordinário. É muito difícil estar no lugar que eu estava, conseguir suportar os sacrifícios que eu suportei. Eu nem sempre dou o discurso de ‘vai lá é possível’. Eu falo: irmão, se liga na realidade, porque sonhar está caro.” Com 32 anos de carreira, iniciada aos 13, ele reforça que não vende ilusões, mas sim a realidade.
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Reconhecido por sua trajetória que une poesia, oralidade e consciência social, o rapper é referência na cena nacional desde os anos 2000 e fundador do movimento Batalha do Conhecimento, projeto que transformou batalhas de rima em espaço de formação crítica, diálogo e cidadania.
Integrando o debate do festival literário, Marechal evidencia como o Brasil lê — ou se recusa a ler — produções periféricas: “Eu faço rap, e não sei falar outra linguagem que não a da rua.” Segundo o artista, devido à força que carrega, a linguagem periférica pode assustar.
A acusação recorrente de que o rap faz “apologia ao crime” foi contraposta por Marechal, que destaca o rap como descritivo, e não um incentivo. “Tem muitos cotidianos violentos. A gente traz a realidade. Falar não significa que você está incitando. Você está jogando luz sobre esse assunto e até questionando o estado”, argumenta. A literalidade, segundo ele, é outra armadilha: “Se a gente está denunciando a injustiça, quer dizer que a injustiça já foi feita.”
Questionado sobre as recentes operações policiais ocorridas no Rio de Janeiro, Marechal, natural de Niterói, declara que a chacina sempre aconteceu: “Vemos um reflexo de 2025, mas sempre foram assassinados jovens negros da periferia. Eu não queria estar toda hora sabendo disso. Porque é natural, infelizmente, eu já sei disso.”
A resposta dele é seguir trabalhando. Na noite anterior, Marechal conta ter cantado para 300 pessoas na Praia Grande, quando passou o pós-show inteiro conversando com crianças: “Isso me deixa feliz, arrepiado de fazer. Mas muitas vezes a parte que eu faço não é reconhecida”. Mesmo dialogando na língua dos jovens periféricos, o rapper não deseja ser visto como uma inspiração motivacional, já que, para ele, o discurso de meritocracia não cabe no contexto.
É na violência que o Estado aparece na periferia, e não na educação, diz o MC. “A força policial e a lei precisam ser mais bem educadas. E nós também. A educação é menor, a violência maior”, reflete. Sobre festivais literários e políticas culturais, adotou cautela: reconhece avanços, mas diz que falta difusão e aproximação concreta. “A cultura da música é difundida. A do futebol também. A da literatura está menos difundida. Então provavelmente vai ter mais gente assistindo futebol do que lendo um livro.” Para ele, não basta anunciar um festival, é preciso construir a cultura antes.
*A jornalista viajou a convite da Secretaria de Estado da Cultura da Paraíba
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