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Pacote fiscal aprovado no Senado pode pressionar preços, avaliam especialistas

Especialistas avaliam que medidas aprovadas no Senado elevam arrecadação no curto prazo, mas reduzem previsibilidade tributária e podem gerar repasses indiretos ao consumidor a partir de 2026

Especialistas em direito tributário e representantes de setores afetados avaliam que o pacote fiscal aprovado pelo Senado na noite de quarta-feira (17/12), que prevê a redução linear de cerca de 10% dos benefícios fiscais federais e o aumento da tributação sobre Juros sobre Capital Próprio (JCP), apostas on-line (bets) e determinadas instituições financeiras, como fintechs, pode pressionar preços e serviços no país, já a partir de 2026.

A proposta foi aprovada como parte do esforço do governo para ampliar a arrecadação e equilibrar as contas públicas. No entanto, segundo especialistas ouvidos pela Correio, os efeitos práticos da medida vão além do impacto fiscal imediato e atingem diretamente o ambiente regulatório, a previsibilidade tributária e o custo final suportado por consumidores e empresas.

No mercado farmacêutico, por exemplo, o efeito pode chegar mais rapidamente ao consumidor. A redução da isenção de PIS/Cofins atinge cerca de 66% dos medicamentos vendidos no Brasil, em um setor no qual os preços são regulados por lei, pela Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED, criada pela Lei nº 10.742), o que tende a transferir alterações tributárias ao valor final pago por governos e cidadãos.

O presidente do Grupo FarmaBrasil, Reginaldo Braga Arcuri, afirmou que o setor ainda aguarda a versão definitiva do texto aprovado, mas já demonstra preocupação, caso as modificações sejam confirmadas. “Nós estamos aguardando o texto final, porque parece que ainda estão sendo feitos alguns ajustes do que foi definido na votação do Senado”, disse. Arcuri avalia que a mudança pode afetar os preços dos medicamentos. “Isso vai significar que, possivelmente, você vai ter um impacto no preço dos medicamentos”, afirmou.

Ele explicou que o impacto médio poderia chegar a cerca de 1,2%, considerando a incidência do PIS/Cofins, ressalvando que o efeito final dependerá “primeiro, de como vai ser a redação final; segundo, se vai ter veto; e terceiro, de como seria feito esse mecanismo de ajuste que a lei prevê”.

Para o dirigente, a medida atinge um bem essencial. “Nós achamos que foi uma medida negativa porque afeta esse tipo de bem que é essencial para todos, tanto para o sistema público quanto para o consumo privado”, afirmou, ponderando que a análise definitiva só será possível após a consolidação do texto e eventuais vetos presidenciais.

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Atividades digitais

Além do setor farmacêutico, o pacote fiscal aprovado pelo Senado altera de forma ampla o ambiente regulatório de atividades digitais. Para o advogado tributarista Kiko Omena, do escritório Veloso de Melo, a mudança vai além do aumento de arrecadação e traz riscos estruturais. “A medida busca ampliar a arrecadação no curto prazo, mas impõe desafios importantes de adaptação e segurança jurídica”, avaliou.

No caso das apostas on-line, Omena afirma que o impacto tende a ser sentido pelo usuário final. Segundo ele, “a tendência é de repasse indireto ao consumidor, por meio da redução de prêmios e odds”, além de haver “o risco de migração para plataformas irregulares ou sediadas no exterior”, o que pode comprometer a eficácia da arrecadação no médio prazo.

Para as fintechs, o alerta é ainda mais direto. O advogado afirma que o aumento da tributação tende a pressionar custos e resultar em encarecimento de serviços financeiros, afetando diretamente o consumidor final, em um setor caracterizado por margens reduzidas e alta concorrência.

“Embora as medidas possam gerar incremento de receita no curto prazo, elas não enfrentam o desequilíbrio estrutural das contas públicas”, disse, alertando para o risco de “desestimular inovação, reduzir competitividade e enfraquecer setores estratégicos da economia digital”.

Previsibilidade tributária

Para as empresas em geral, a principal consequência imediata, segundo especialistas, é a mudança na previsibilidade tributária. A advogada tributarista Sueny Almeida, avalia que o pacote representa uma inflexão relevante e que exigem mais atenção. Segundo ela, a redução dos benefícios fiscais não deve ser vista como um ajuste pontual. “Trata-se de uma mudança de postura do Estado brasileiro em relação às renúncias fiscais”, disse, ao destacar que incentivos passam a ser tratados como exceções sujeitas a controle, monitoramento e possível redução.

Sueny ressalta que os impactos não serão automáticos nem homogêneos, mas podem corroer estratégias já consolidadas. “O risco não está apenas no aumento da carga tributária, mas na erosão silenciosa da eficiência dos planejamentos tributários existentes”, afirmou.

Ela disse ainda que as empresas que estruturaram preços e investimentos com base em incentivos podem enfrentar desequilíbrios. “O maior erro, neste momento, é tratar a redução dos benefícios fiscais como um tema exclusivamente governamental ou distante da realidade empresarial”, disse.

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