
O início da vida escolar, para muitas crianças, é um marco em sua infância. Alguns desses estreantes mal veem a hora de começar as aulas. Sequer pregam o olho na noite anterior ao "grande dia" e até esquecem de se despedir de quem os levou à escola, ansiosos por descobrir um mundo novo. Outros "aluninhos", porém, ficam com receio. Relutam em entrar na escola e, não raro, há quem caia no choro. O Correio acompanhou, ontem, vários desses novos estudantes e conversou com pais e profissionais ligados à Educação. Esses sentimentos foram confirmados, além de uma miscelânea de emoções trazidas por um momento tão importante para o futuro.
Rafael Costa, 3 anos, chegou ao Centro de Educação Infantil (CEI) Didascalho São José Operário por volta das 7h, acompanhado da mãe Ana Cleia Costa. Devidamente uniformizado, fazia questão de puxar a mochila de rodinhas. O semblante tranquilo enganava qualquer um, parecia um veterano. "Estou animada com o início da vida escolar dele. Rafael é interessado e dá para perceber isso pela alegria que está sentindo", afirmava Ana Cleia sem esconder o orgulho de ver o menino dando os primeiros passos no caminho do saber.
E os portões do CEI da Vila Estrutural se abriram. A mãe mal foi lembrada por Rafael, que entrou quase sem olhar para trás, agitado, dando um "tchauzinho" fugaz e focado no que teria pela frente das 7h30 às 12h. Ao fim das aulas, lá estava Ana Cleia à espera. Ela admitiu que ao longo daquelas intermináveis primeiras 4 horas e meia de classes ficou com saudade. O cotidiano de ambos mudava. Era o primeiro voo para fora de um ninho no qual a mãe, resignada, disse: "Nós, mães, temos muito amor pelos filhos".
Em Santa Maria e com impecável penteado "maria-chiquinha", com sua mochila de rodinhas da Gata Marie e uma lancheira coberta de lantejoulas, Laura Correia, 4, chegou alegre ao portão da escola Jardim de Infância 116, por volta das 13h. Na entrada, a menina olhava para tudo com admiração: "Mamãe, olha! Ela tem uma mochila rosa igual à minha", exclamou, empolgada, vendo outra estudante com acessório semelhante. Sentia-se entre iguais. Raíza Correia dos Santos, 28, a mãe, concordava com a filha, que segurava sua mão e esbanjava euforia, postura que, no entanto, durou até a porta da sala de aula.
Apoio
Ao se dar conta de que precisaria entrar sozinha no ambiente, Laura, que caminhava sem hesitação, travou os passinhos de repente. Percebendo o receio dela, Mirella Lis Correia, 8, sua irmã e que também a acompanhava, a ajudou a terminar o resto do trajeto, que a novata percorreu com andar inseguro. Mas, assim que chegou à carteira e se viu sem as familiares, seus olhinhos se encheram d'água e desabou em choro nos braços da professora.
Do lado de fora, Raíza observava a cena com olhos marejados. "Fiquei emocionada e com o coração apertado ao vê-la chorando, mas sei que ela vai se adaptar e gostar da escola. Estou muito feliz por este momento", afirmou. E não estava errada. Ao voltar para buscá-la, as lágrimas haviam ido embora e a radiante Laurinha havia voltado. "Ela me disse que amou, e que não queria ir embora", contou a mãe.
Não muito longe delas e na mesma região administrativa, no Centro de Educação Infantil 416, Noah Emanuel, 4, chegou pontualmente às 13h para o primeiro dia de aula, uma experiência que sua mãe, Beatriz Giovana, diz haver sido tranquila. "Viemos pela manhã para conhecer a escola e ele ficou muito ansioso para entrar e ter aula. Agora, está mais caladinho, mas preparado para o início da vida escolar", garantiu.
A "porta-voz" do tímido, calado, mas sorridente Noah acrescentou que, sobre o esse início: "Ficamos com o coração pesado, mas felizes por mais este marco na vida dele. É um passo muito importante". Não menos alegre e confirmando alguma apreensão estava Reginaldo Alves, pai do menino: "Mesmo ele sendo bem espertinho para sua idade, eu fico com o coração na mão".
Compartilhando
O sentimento da família Alves é semelhante ao dos Tavares. Flávio e Flávia, além de nomes e idades semelhantes, 43, compartilham a alegria de serem pais das gêmeas Emanuella e Gabriella, 3, e uma dualidade de emoções. Por um lado, se dizem felizes vendo as meninas indo pela primeira à escola. Mas, por outro, sentem o coração doer ao experimentarem essa nova sensação de ficar longe delas por algumas horas. Outro fator que aumenta seu desconforto é saber que as irmãs frequentarão turmas diferentes. Para eles, isso é ruim, porque as duas são muito apegadas.
Os Tavares sabiam o que diziam. Quando as garotas foram recebidas pelas professoras, indo cada uma para sua respectiva sala, o semblante de choro das gêmeas era visível. "Ficamos felizes por elas estarem começando uma nova etapa, mas sinto dó. O coração aperta demais", desabafou a mãe, que não as viu chorar. Ao menos na frente dela.
As professoras contaram aos pais que as meninas caíram em lágrimas do início ao término das aulas. Flávia contou que Emanuella estava rouca quando a buscou. "É para o bem delas. Espero que se acostumem logo", disse.
Jhully Tainara dos Santos, 26, é outra mãe que vive esse drama, situação da que Abraão dos Santos, 3 anos, seu filho, nem se dá conta, animadíssimo com a estreia na escola. "Meu coração fica apertado. A gente não queria matriculá-lo ainda. Relutamos, mas como as irmãs dele também vão começar a estudar, e ele é muito ativo, decidi fazê-lo para que ele não ficasse sozinho em casa", explicou.
E cheio de si, o garoto entrou na sala de aula com um sorriso enorme, sem olhar para trás. A atitude ajudou a mãe a se acalmar e a ficar admirada com a postura: "Mas, gente! Ele nunca foi à creche, nunca teve babá, o menino nem me deu tchau!", comentou Jhully, surpresa, com outros adultos que deixavam seus pequenos na escola.
Aprendendo a lidar
"Cada criança vive esse momento (de início na vida escolar) de forma única", disse ao Correio a psicóloga Juliana Gebrim. Também com formação em neuropsicóloga em Portugal, ela acrescentou: "O importante é que a criança se sinta acolhida, tenha espaço para expressar suas emoções e conte com o apoio dos adultos para lidar com essas novas experiências".
Poliana Gomes, diretora do CEI Didascalho São José Operário, explicou que em sua instituição esse acolhimento é prioridade. "Na primeira semana, (os alunos) ficam somente meio período. Os pais ficam por aqui um pouquinho para acalmá-los, para que não fiquem em desespero", contou, acrescentando haver recebido mais de 60 novatos no primeiro dia de aula da vida deles.
Por sua vez, Josiane Pérez, professora do CEI 416, explica que esse processo de adaptação é novo até para os educadores: "É novidade para os estudantes, e todo ano é uma nova turma para os professores, com realidades diferentes. O que eu costumo fazer é conversar muito com esses alunos, integrá-los a outros alunos (veteranos), que também nos ajudam muito".
Siga o canal do Correio no WhatsApp e receba as principais notícias do dia no seu celular
Saiba Mais