ARTIGO

O mundo em 78 rotações e o Brasil em slow motion

É evidente o descolamento dos tempos e movimentos de governo e Congresso em relação à conjuntura. A verdade é que o mundo não vai esperar pelo Brasil

 Zona Franca de Manaus: Indústria do Amazonas estima crescimento de 6% e receita de R$ 216 bi em 2025. Os setores de duas rodas, eletroeletrônicos, ar-condicionado e plásticos devem puxar essa expansão,
 -  (crédito:  Reprodução/SUFRAMA)
Zona Franca de Manaus: Indústria do Amazonas estima crescimento de 6% e receita de R$ 216 bi em 2025. Os setores de duas rodas, eletroeletrônicos, ar-condicionado e plásticos devem puxar essa expansão, - (crédito: Reprodução/SUFRAMA)

LUIZ CÉSIO CAETANO, presidente da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro

Meses atrás, já se vislumbrava que tínhamos pela frente um cenário externo extremamente desafiador a partir de 2024. Entre as questões que impactavam o mercado internacional e, por extensão, os negócios, havia tensão crescente no Oriente Médio, o conflito entre Rússia e Ucrânia e a guerra comercial entre Estados Unidos e China. Também havia a proximidade das eleições norte-americanas e as incertezas sobre as políticas econômicas que seriam adotadas. 

Infelizmente, a única certeza que temos hoje é de que a incerteza é o novo normal. Do ponto de vista econômico, a incerteza tem efeito negativo sobre os negócios, gerando custos, travando investimentos e afetando a competitividade.

Por falar em competitividade, no fim do ano passado, foi divulgado um estudo inédito, o Índice Firjan de Competitividade Global, que mostrou que o Brasil está em quadragésimo-sexto lugar em um ranking de 66 países. Como se não bastasse essa vergonhosa colocação, ainda perdemos seis posições em apenas 10 anos.

Estamos hoje abaixo de países latino-americanos como Uruguai e Chile. E, quando olhamos os países dos Brics, aparecemos na última posição, abaixo de Índia, China e África do Sul.

O índice foi elaborado a partir de quatro pilares: Ambiente de Negócios, Eficiência do Estado, Infraestrutura e Capital Humano. Infelizmente, pioramos em todos eles.

Diante da fragilidade da competitividade do Brasil e da complexidade crescente da conjuntura internacional, nos cabe indagar a Brasília o que pensa e como reage a esse quadro. 

Seria injusto e até leviano atribuir ao governo e ao Congresso Nacional desinteresse e descompromisso com o Brasil, com o desenvolvimento econômico e, em particular, com a manutenção do parque industrial amplo e diversificado que ainda temos. 

Por outro lado, é evidente o descolamento dos tempos e movimentos de Brasília em relação à conjuntura em que vivemos.  É como se o mundo girasse em 78 rotações por minuto, mas o governo e o Congresso reagissem em slow motion. 

A título de exemplo, nos primeiros dias do atual governo, estive em Brasília para a entrega da Agenda de Propostas Firjan para um Brasil 4.0. O documento destacava, entre vários pontos, a necessidade de uma ação imediata para destravar diversos acordos de comércio que estavam pendentes de formalização final.

Hoje, por meio do Mercosul, temos 10 acordos comerciais em vigor, quatro deles com países da América do Sul. Mas outros 11 estão pendentes, inclusive com importantes mercados, como União Europeia, Canadá, Japão, Emirados Árabes Unidos, Coreia do Sul e Singapura. Também está nesta lista a EFTA, European Free Trade Association (Associação Europeia de Livre Comércio), que reúne Islândia, Liechtenstein, Noruega e Suíça, este último no ranking dos 20 maiores importadores do planeta.

Atualmente, a tramitação dos acordos comerciais assinados pelos poderes Executivo e Legislativo do Brasil demora, em média, 1.590 dias. Ou seja, mais de quatro anos. Enquanto isso, nossa balança comercial de produtos industrializados segue deficitária. Em 2024 o saldo negativo foi de US$ 95 bilhões. 

 

Como o Brasil é um dos poucos países de expressivo mercado interno, sempre está no alvo dos excedentes de produção de todos os grandes produtores industriais. Portanto, a queda de braço das grandes disputas comerciais — como a dos Estados Unidos de Donald Trump contra China, União Europeia, Canadá e México, por exemplo — resultará automaticamente no despejo, no mercado brasileiro, dos excedentes não comercializados no mercado norte-americano. 

E esses produtos, muitas vezes, chegarão aqui a um preço menor que o custo das matérias-primas.

Logo, precisamos ser mais ágeis na realização e na aprovação interna de acordos de comércio. E tendo, como fazem todas as principais economias de todos os continentes, a indústria nacional na centralidade desses acordos.

A verdade é que o mundo não vai esperar pelo Brasil. E nossa paralisia terá custos políticos: a sociedade vai cobrar a conta dessa inércia mais cedo ou mais tarde. 

Só nos resta dizer: acorda, Brasília!

 


Por Opinião
postado em 19/06/2025 06:01
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