Artigo

Alvos da covardia

Agredir e torturar crianças não é educar nem disciplinar. São agressões convardes, atentados bbrutais contra alguém incapaz de se defender

Na semana passada, o Correio noticiou o caso de uma criança, de 8 anos, vítima de tortura em casa, no Sol Nascente -  (crédito: Amaro Junior/CB/D.A Press)
Na semana passada, o Correio noticiou o caso de uma criança, de 8 anos, vítima de tortura em casa, no Sol Nascente - (crédito: Amaro Junior/CB/D.A Press)

Educar crianças e adolescentes é uma missão das mais complicadas. Não existe uma fórmula infalível nesse processo, mas o empenho para que se desenvolvam plenamente, que sejam felizes e autoconfiantes, que se tornem cidadãos cientes de seus direitos e deveres passa pelo diálogo, por bons exemplos e, principalmente, por amor e respeito. No Brasil, porém, estamos a anos-luz de tratar meninos e meninas com a dignidade que merecem. Neste país — que ignora sistematicamente a determinação da Constituição de dar "absoluta prioridade" ao bem-estar deles — persiste a hedionda cultura de machucar para "educar", para "disciplinar".

Na semana passada, o Correio noticiou o caso de uma criança, de 8 anos, vítima de tortura em casa, no Sol Nascente. O abuso foi descoberto na escola. O menino não conseguia se sentar para assistir à aula. Os educadores constataram uma série de queimaduras nas nádegas do garotinho, feitas com garfo quente. Havia hematomas em outras partes do corpo e no rosto. As informações são de que ele também chegava sempre com fome à unidade de ensino. Segundo as investigações, a madrasta estava torturando a criança.

Pais biológicos também fazem isso. Lembro-me da conversa que tive com uma delegada, em que ela me relatava o caso de dois irmãos, de 4 e 5 anos, que estavam com as mãos inchadas e em carne viva, porque a mãe os fazia segurar colher quente. Era o castigo por serem "danados" e fazerem muita bagunça.

Isso não é educar, não é disciplinar, é uma agressão covarde, um atentado brutal contra alguém incapaz de se defender. E, na imensa maioria das vezes, os abusos — de todos os tipos — ocorrem dentro de casa, praticada por pais, mães, pais, avós, padrastos, madrastas. São justamente as pessoas que deveriam protegê-los, o que torna a violência ainda mais sórdida.

Crianças e adolescentes não são inferiores aos adultos, não são propriedades das famílias. São cidadãos com plenos direitos, especialmente à integridade física. A violência fere a dignidade e pode impactar a saúde mental deles pelo resto da vida.

É urgente acabar com a invisibilidade das agressões, combater a "educação" violenta. Na legislação, o país avançou nessa proteção. Além da Constituição, em seu artigo 227, temos a Lei Menino Bernardo, cujo texto determina que "a criança e o adolescente têm o direito de serem educados e cuidados sem o uso de castigo físico ou de tratamento cruel ou degradante". Mas existe um abismo entre a teoria e a prática, e não conseguimos vencê-lo. Faltam políticas públicas efetivas, uma mobilização de Estado, sociedade e família para esse enfrentamento. Crianças e adolescentes sendo machucados é problema público, não privado. Garantir o bem-estar deles diz respeito a todos nós.   

 

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postado em 21/08/2025 06:02
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