
O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), confirmou, nesta quarta-feira, que a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 3/2021, também chamada de PEC da Blindagem, está definitivamente encerrada, após a rejeição unânime pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). A proposta, que alterava as prerrogativas parlamentares e ampliava a proteção contra processos judiciais, foi considerada inconstitucional e injurídica.
Segundo Alcolumbre, o encaminhamento do texto à CCJ seguiu os trâmites normais da Casa, sem qualquer manobra. "Nós apenas cumprimos o que manda o regimento do Senado. Sem atropelos, sem inversões. Encaminhamos a proposta imediatamente à comissão respectiva para sua deliberação, como ocorre com todas as matérias que chegam ao Senado", afirmou.
O texto havia sido aprovado pela Câmara na semana passada, mas encontrou forte resistência dentro do Senado e nas ruas, com protestos no último domingo, em várias capitais. Em São Paulo, levantamento da Universidade de São Paulo (USP) e da ONG More in Common estimou em 42,4 mil os participantes na Avenida Paulista.
Alcolumbre destacou o papel do colegiado, sob a condução do senador Otto Alencar (PSD-BA) e com relatoria do senador Alessandro Vieira (MDB-SE). Ele elogiou a postura dos integrantes da comissão. "Com coragem e serenidade, cada senador e cada senadora concluiu a votação na comissão. A sociedade brasileira pode ter clareza de que a análise foi feita de maneira transparente e responsável", disse.
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Alcolumbre citou o artigo 101 do regimento interno, lembrando que a decisão da CCJ pela inconstitucionalidade torna desnecessária qualquer análise em plenário. "Quando a Comissão de Constituição e Justiça emite parecer aprovado pela inconstitucionalidade e injuridicidade de qualquer proposição, esta é considerada rejeitada e arquivada definitivamente. Portanto, não há o que se esclarecer em relação à tramitação desta proposta", explicou.
Em seu parecer, o relator Alessandro Vieira classificou a PEC como um "grave retrocesso" e um "golpe fatal" à credibilidade do Congresso. Para ele, o texto "abre as portas para transformar o Legislativo em abrigo seguro para criminosos de todos os tipos". O parlamentar destacou ainda que a proposta feria princípios constitucionais e caminhava na contramão da decisão do próprio Congresso em 2001, quando aprovou a Emenda Constitucional 35, que restringiu os privilégios parlamentares.
Pressão
Para o cientista político Leonardo Paz Neves, analista de inteligência qualitativa no Núcleo de Prospecção e Inteligência Internacional (NPII) da Fundação Getulio Vargas (FGV), a rejeição da PEC da Blindagem na CCJ do Senado foi resultado direto da pressão popular e da forte repercussão negativa nas redes sociais.
Segundo ele, havia inicialmente um acordo tácito entre setores bolsonaristas para dividir esforços entre a defesa da anistia e o avanço da PEC, com chances reais de aprovação. "O que ocorre, no final das contas, é que o PL, especialmente a ala bolsonarista, fez uma troca: um lado apoiava a anistia enquanto o outro lado apoiava a PEC da Blindagem. Nessa composição, eles poderiam ter a maioria necessária para atingir seus objetivos", explicou.
O que não estava no cálculo, apontou o especialista, foi a reação das ruas. "Eles não contavam com uma manifestação popular tão grande. Especialmente nas mídias, segundo a Quaest, quase 85% das menções eram muito negativas. Isso criou um custo político muito grande", afirmou.
Paz Neves destacou ainda a diferença entre os sistemas eleitorais da Câmara e do Senado para explicar a postura de cada Casa. "Deputado tem um custo político muito mais baixo para votar uma medida impopular, porque a eleição é proporcional. Dos 513 deputados, só 28 tiveram votos suficientes para se eleger sem puxadores. A maioria depende do coeficiente eleitoral, então, não tem muito custo direto com o eleitorado", disse.
Já no Senado, acrescenta, a lógica é distinta. "Senador é eleito no majoritário, com exposição estadual muito maior. Quando figuras como Ratinho Júnior e (Ronaldo) Caiado se colocaram contra a PEC da Bandidagem, ficou claro que vincular a imagem a uma medida tão impopular teria um custo altíssimo. Por isso, me parecia, desde o início, que o Senado teria muito mais resistência", observou.
O cientista político Rudá Ricci, mestre em ciências políticas pela PUC-SP, também destacou a força política da decisão. "A CCJ do Senado acabou, por unanimidade, que é muito surpreendente, vetando completamente o avanço da PEC da Blindagem. Para essa PEC prosperar, ela teria que voltar a ser apresentada com outra redação na Câmara. Mas a notícia é muito clara que vem do Senado: lá não passa", frisou.
Na avaliação do especialista, o Casa tem funcionado como barreira a iniciativas mais radicais vindas da Câmara. "De alguma maneira, o Senado, já há algum tempo vem, travando as votações mais extremistas. Isso ocorre porque o voto majoritário dá mais autonomia ao senador, enquanto a Câmara está muito mais presa a uma lógica localista e de baixo clero", concluiu.
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