Segurança pública

PL Antifacção vira briga institucional

PF se opõe frontalmente a trechos da proposta — incluída na pauta de votações de hoje na Câmara — que tem como relator o secretário de Segurança de Tarcísio de Freitas

Polícia Federal -  (crédito: Polícia Federal )
Polícia Federal - (crédito: Polícia Federal )

Incluído na pauta do Congresso de hoje, o Projeto de Lei Antifacção provocou um forte atrito entre governo e oposição. O texto, relatado pelo deputado Guilherme Derrite (PL-SP), sofreu modificações que limitaram o papel da Polícia Federal em investigações de facções criminosas. Em nota, a corporação alertou para o risco de enfraquecimento do combate ao crime organizado.

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Em comunicado divulgado na noite desta segunda-feira, a PF afirmou "acompanhar com preocupação" as alterações feitas no relatório de Derrite e reforçou que não aceitará qualquer tentativa de reduzir sua autonomia constitucional. "Não há e não haverá acordo que implique em supressão das atribuições e autonomia da Polícia Federal. Encaramos com preocupação qualquer manobra para modificar o papel da Instituição no combate ao crime organizado", declarou o diretor-geral Andrei Rodrigues.

O embate levou o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), a intervir na tentativa de evitar uma ruptura entre a corporação e o Parlamento. Motta informou ter intermediado uma conversa direta entre Derrite e Andrei Rodrigues "com a finalidade de garantir que a PF manterá suas atribuições nas investigações contra o crime organizado". A reunião ocorreu logo após um encontro de Motta no Supremo Tribunal Federal (STF) com o ministro Alexandre de Moraes; o procurador-geral da República, Paulo Gonet; e os 27 procuradores-gerais de Justiça dos estados, para discutir medidas de enfrentamento às facções.

Segundo o presidente da Câmara, o momento exige "união institucional". "Acabo de sair do Supremo Tribunal Federal, onde participei de uma reunião para discutir a pauta da segurança pública. O momento é de união das instituições contra o crime organizado", afirmou Motta nas redes sociais. O encontro foi convocado por Moraes após as recentes operações no Rio de Janeiro que resultaram em mais de cem mortes e reacenderam o debate sobre a atuação das forças policiais.

"Enfraquecimento"

O centro da controvérsia é um dispositivo incluído por Derrite no relatório que condiciona a atuação da PF no combate a facções, milícias e grupos paramilitares classificados como terroristas à solicitação prévia dos governadores. Na prática, a corporação só poderia agir se fosse formalmente demandada pelos estados. Para a Polícia Federal e para o governo, a mudança representa um "risco real de enfraquecimento" das investigações de âmbito nacional. O texto também propõe transferir às polícias civis estaduais a competência para apurar crimes de terrorismo ligados a organizações criminosas, o que ampliou o impasse político.

A PF argumenta que as alterações promovem uma "supressão de competências constitucionais" e impactam não apenas o combate às facções, mas também investigações sobre corrupção, tráfico de drogas, desvio de recursos públicos e tráfico de pessoas. A PF cita, como exemplo, a Operação Carbono Oculto, deflagrada em outubro, classificada como "a maior operação contra o crime organizado da história do país", e alerta que ações desse porte poderiam ser inviabilizadas caso o texto seja aprovado como está.

No governo, o tom é de forte reação. A ministra da Secretaria de Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, afirmou que o relatório de Derrite representa "um salvo-conduto a organizações criminosas" e chamou a proposta de "lei da blindagem, da bandidagem". O líder do PT na Câmara, Lindbergh Farias (PT-RJ), também criticou o projeto, dizendo que "é o mesmo grupo político que tentou aprovar a PEC da blindagem no ano passado". Segundo o parlamentar, o objetivo seria restringir o alcance da PF e "criar uma rede de proteção para membros do Parlamento e seus aliados".

Apesar das críticas, a oposição articula para manter o texto. Derrite, aliado do ex-presidente Jair Bolsonaro, sustenta que o objetivo do projeto é "integrar esforços entre estados e União no combate às facções", mas aliados do governo afirmam que, na prática, as mudanças podem esvaziar o poder da PF e transferir decisões estratégicas a governos estaduais, inclusive de perfil político adversário.

Aumento de penas

O Projeto de Lei Antifacção, proposto pelo Executivo, faz parte do pacote legislativo de segurança pública e prevê o aumento de penas para integrantes de organizações criminosas, além da criação do chamado Marco do Crime Organizado. O texto original foi elaborado para reforçar instrumentos de investigação financeira, ampliar a cooperação entre agências e melhorar o controle sobre o sistema prisional, principais demandas após o avanço das facções em fronteiras e presídios.

A polêmica surge em um momento de alta tensão institucional. A relação entre governo, Congresso e Judiciário está marcada por disputas em torno do protagonismo no enfrentamento ao crime organizado. Moraes, agora relator da ADPF 635 (ADPF das Favelas), tem defendido o fortalecimento da coordenação entre os poderes, enquanto o Executivo tenta impedir que o Legislativo altere pontos considerados sensíveis no combate às facções.

Com a votação do projeto prevista para hoje, cresce a pressão para que o relator ceda e restabeleça o texto original. Nos bastidores, aliados de Hugo Motta dizem que o presidente da Câmara busca um acordo que evite o constrangimento de um embate direto com a PF, que tem forte respaldo popular e institucional. O Planalto, por sua vez, trabalha para adiar a votação até que as divergências sejam sanadas.

Enquanto isso, o país observa a disputa entre forças políticas e policiais que deveria, em tese, estar do mesmo lado. A depender do resultado da votação, o Projeto Antifacção poderá se tornar um marco de cooperação nacional, ou um símbolo de fragmentação no combate ao crime organizado.

 

 

 

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postado em 11/11/2025 03:55 / atualizado em 11/11/2025 12:15
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