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Resgate aéreo garante suporte para gestantes em situações de risco

Estado e Forças de Segurança atuam em resgate aeromédico para auxiliar mulheres em trabalho de parto que vivem em isolamento ou enfrentam acontecimentos adversos

O transporte aéreo é considerado um dos meios mais seguros do mundo, mas o trajeto e a viagem exigem logística específica e sofisticada, que não permite erros. Lidar com imprevistos a bordo pode ser desafiador, a depender das circunstâncias. No entanto, o transporte aeromédico funciona como meio de saída em situações adversas onde as rotas são complexas ou estão impedidas de serem transpassadas.

FAB - Grávida que estava ilhada na cidade de Agudo (RS) após as cheias no Sul do País é resgatada pela Força Aérea Brasileira durante operação Taquari

Durante as cheias no Rio Grande do Sul, a Força Aérea Brasileira (FAB) realizou o transporte aeromédico de uma gestante que estava ilhada em casa após o transbordamento dos rios da região. A moradora de Agudo (RS) apresentou sangramentos e tinha sinais de desidratação, mas foi socorrida em uma missão da Operação Taquari, que tinha o objetivo de resgatar as pessoas atingidas pelo maior desastre natural do Sul do país.

Em Fernando de Noronha, o transporte aéreo é a única alternativa para as gestantes. A ilha não tem estrutura para realização de partos e, a partir do sétimo mês de gestação, as grávidas são orientadas — e, às vezes, obrigadas — a sair da ilha para ter o bebê no Recife, localizado a 500km de distância. O trajeto tem aproximadamente uma hora de duração.

Essa realidade gera estresse e levanta questionamentos sobre a ausência da garantia dos direitos reprodutivos das mulheres daquela localidade. Bernadete Perez Coelho, professora do departamento de medicina da Universidade Federal de Pernambuco, destaca a necessidade de que a atenção primária alcance todas as mulheres, especialmente nos casos em que a gravidez evolua para alto risco. "Estamos lidando com uma problemática crônica. A crise na obstetrícia persiste, ainda que tenhamos observado avanços. Consideramos extremamente problemático o fato de a ilha não dispor sequer de um centro de parto normal. Toda a rede deveria ser estruturada para garantir o acesso", afirma a professora.

https://www.correiobraziliense.com.br/webstories/2025/08/7219876-a-ilha-onde-e-proibido-nascer.html

 

Na Amazônia Brasileira, onde as distâncias são extremas e os acessos apresentam alto nível de dificuldade, o transporte aeromédico é uma estratégia para socorrer pacientes que precisam de atendimento com rapidez. As gestantes estão entre os que precisam desse tipo de resgate.

No Acre, o atendimento pré-natal em comunidades isoladas e ribeirinhas é realizado pelas equipes da Atenção Primária à Saúde (APS), que atuam de forma territorializada por meio de equipes de saúde da família, equipes ribeirinhas e equipes de saúde fluvial. O objetivo é garantir que as gestantes tenham acompanhamento adequado, mesmo em regiões de difícil acesso, com consultas, exames e orientações necessárias ao pré-natal. No entanto, em casos de risco, quando chega o momento do parto, o SAMU é acionado e, por meio da cooperação entre as Forças de Segurança e de resgate do estado, as gestantes são levadas de helicóptero para os hospitais que têm infraestrutura para realização do procedimento.

Governo do Acre - Gestante de 27 anos, moradora de seringal Almario, em Sena Madureira (AC) é socorrida pelo transporte aeromédico durante trabalho parto em julho de 2025

O médico Manoel Neto, intensivista do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) do Acre, explica que o trabalho realizado demanda integração das Forças de Segurança, coordenação tática e comunicação via internet. O médico afirma ainda que os helicópteros utilizados para resgates têm suporte avançado e podem realizar o mesmo tipo de atendimento que os veículos terrestres.

"Nós recebemos os pedidos de comunidades por meio das equipes de saúde itinerantes, ou a Sesai (Secretaria de Especial de Saúde Indígena), e eles fazem o pedido de acordo com o quadro clínico do paciente. Eles passam as coordenadas e explicam como é o local pra gente saber quais são as circunstâncias que vamos encontrar no local. Nessas localidades levamos equipamentos de suporte avançado e são feitos diversos atendimentos. Todos os suportes que temos em terra levamos no suporte aéreo para que a gente atenda esses pacientes em locais isolados da melhor maneira possível”, afirma Neto.

Outros estados adotam planos similares e integram as Forças de Segurança e de Resgate para auxiliar a transportar gestantes para locais que tenham plena infraestrutura. No interior de Rondônia, na fronteira com a Bolívia, na cidade de Guajará-Mirim, uma jovem mãe precisou de transporte aeromédico para ganhar sua filha. Ela entrou em trabalho de parto no sétimo mês de gestação e não havia UTI neonatal na cidade.

A recomendação médica era realizar uma transferência para Porto Velho, capital do estado, a 330 quilômetros. O trajeto poderia demorar até 7 horas para ser percorrido em função das condições das estradas na época. Após esperar por algumas horas por uma ambulância, houve a ausência de um médico para acompanhá-la. Quando chegou o médico, a avaliação foi de que havia um risco muito grande em realizar o transporte por via terrestre. Deste modo, o avião do Corpo de Bombeiros de Rondônia foi acionado.

O parto foi realizado 20 minutos após a decolagem a 7 mil pés de altura. Quando o avião fazia o deslocamento, o médico que acompanhava a passageira informou que o parto teria que ser naquele momento. Sem alternativa de pouso, o bebê nasceu nas alturas. O caso foi registrado em abril de 2015 e foi registrado pelo Tenente-Coronel do CBMRO Luiz Cordeiro Junior. “É a ocorrência da vida. Essa foi a ocorrência mais marcante que eu já fiz nesses 21 anos de bombeiro de resgate”, afirmou ao Correio.

 

Gestantes em voos comerciais

Em viagens comerciais, há regras de segurança que impedem grávidas de viajarem com idade gestacional avançada, por isso, relatos de partos nos ares não são comuns, mas existem. Em 2021, um bebê nasceu no voo de Boa Vista para Porto Velho. A passageira era uma mulher estrangeira que estava indo para a Bolívia. Horas após a decolagem, a gestante começou sentir dores e a tripulação questionou se havia um médico entre os presentes. Uma pediatra estava a bordo e se voluntariou para socorrê-la. Ao fazer o parto, ela afirmou que o bebê tinha mais de sete meses e já estava na fase final de formação. A passageira que saiu da Venezuela desembarcou em Manaus para receber atendimento médico após o parto.

As principais companhias aéreas do Brasil, Gol, Latam e Azul têm regras similares sobre o limite da idade gestacional para embarque de mulheres grávidas. Até 29 semanas, não há restrições e a viagem é liberada, salvo em casos de gravidez de risco. A partir da semana 30, é necessário apresentar um atestado médico para o embarque e, na reta final da gravidez, as regras podem variar.

Na 38ª semana de gestação, a Gol autoriza o embarque apenas em situações de extrema necessidade, desde que a gestantes esteja acompanhada do médico responsável; A Latam não permite o embarque a partir da 39ª semana; e a Azul “mesmo com atestado médico, não recomenda viagem aérea para gestantes durante os sete dias que antecedem a data prevista para o parto”.

A Latam explicou ainda que, em território nacional, a exceção é aplicada para viagens que tenham como origem ou destino a ilha de Fernando de Noronha (PE). “Pois não é permitido entrar na ilha a partir da 28ª semana, devido às limitações na infraestrutura hospitalar”, afirmou a companhia. 


As três empresas foram questionadas sobre treinamentos para a equipe de bordo em casos de ocorrência de parto durante as viagens e apenas a Latam respondeu. “A tripulação da Latam recebe amplo treinamento para lidar com diferentes situações a bordo. Dentre elas, fazem uma capacitação de primeiros socorros para treinamento de atendimento a situações relacionadas a possíveis emergências médicas a bordo, e situações de parto são abordadas para o atendimento até que a gestante receba os serviços médicos necessários”, informou.

No atendimento às gestantes, as companhias aéreas devem seguir a Resolução Anac nº 280/2013, que estabelece as regras sobre acessibilidade no transporte aéreo. “Gestantes e lactantes se enquadram nas definições de passageiros com necessidade de assistência especial (PNAEs), tendo direito aos mesmos serviços que são prestados aos usuários em geral, porém em condições de atendimento prioritário, em todas as fases de sua viagem e durante a vigência do contrato de transporte aéreo, inclusive com prioridade em relação aos passageiros frequentes”, informou a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac).

A Anac esclarece que a empresa aérea pode exigir atestado médico para verificar a autonomia da passageira e se a viagem poderá comprometer ou não sua saúde da mãe e da criança. “Pode haver restrições aos serviços prestados quando não houver condições para garantir a saúde e segurança do passageiro que precise de atendimento especial ou dos demais passageiros. Caso isso aconteça, a recusa de transporte pela empresa aérea deve ser justificada por escrito no prazo de 10 dias. As condições gerais e restrições ao transporte desse e de suas ajudas técnicas e equipamentos médicos devem ser divulgadas pelas empresas aéreas em seus pontos de venda", detalhou a Anac.

Por fim, a Anac destaca que as empresas não podem proibir gestantes, ou outros pacientes especiais, de embarcarem por eventuais desconfortos ou inconvenientes causados a outros passageiros ou tripulantes. Apenas as medidas de saúde e segurança devem balizar o relacionamento entre passageiros e companhias.

https://www.correiobraziliense.com.br/webstories/2025/08/7222969-bebe-nasce-no-buraco-do-tatu-proximo-do-marco-zero-de-brasilia.html

 

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